Ligações químicas: investigação da construção do conhecimento no ensino médio
Resumo
As ligações químicas constituem a base para a compreensão da formação e do comportamento das substâncias presentes no cotidiano. O foco de investigação desta pesquisa foi o ensino e a aprendizagem das ligações químicas no ensino médio e os objetivos principais foram realizar um diagnóstico de como o conteúdo está sendo desenvolvido neste nível, bem como investigar o processo de construção do conhecimento pelos estudantes da 1ª série do ensino médio, por meio de uma Sequência de Ensino e Aprendizagem (SEA) e do ensino tradicional. Para alcançar tais objetivos, esta pesquisa foi desenvolvida em duas partes. Na primeira parte, foram realizadas três investigações que forneceram indícios do tratamento dado às ligações químicas no ensino médio. Seguindo princípios da pesquisa qualitativa, os dados foram coletados por meio de instrumentos elaborados a partir de orientações descritas pela literatura ou para os fins específicos de cada investigação. Nesta parte da pesquisa, investigou-se: - as concepções sobre ligações químicas de 124 estudantes da 1ª série do ensino médio de duas escolas públicas e uma privada da região de Santa Maria, RS, que já tinham estudado o tópico formalmente em sala de aula; - a abordagem das ligações químicas nos livros didáticos (PNLD 2015-2017), por intermédio da análise dos capítulos referentes ao tópico de cada obra; - a percepção de quatro professores do nível médio e dois professores universitários sobre o ensino de ligações químicas. Os resultados obtidos forneceram o seguinte panorama: os tópicos estabilidade química e natureza das interações entre átomos e íons estão sendo desenvolvidos de forma inadequada, por meio de modelos que provocam distorções conceituais. Além disso, a metodologia tradicional predomina nas aulas e o ensino está pautado na transmissão de conteúdos com auxílio do livro didático. Baseado nisso, foram planejadas e desenvolvidas intervenções com enfoque no estudo da estabilidade química fundamentado em aspectos energéticos e no modelo eletrostático para cada tipo de ligação interatômica. Na segunda parte da pesquisa, a investigação da construção do conhecimento em ligações químicas ocorreu mediante o acompanhamento de quatro turmas da 1ª série do ensino médio, totalizando 50 sujeitos. O conteúdo foi desenvolvido pelos professores regentes em duas turmas por meio da SEA e nas outras duas pelo método tradicional. Para a análise dos dados, considerou-se a teoria de Bachelard e quatro dimensões, que são: estabilidade química, ligação iônica, ligação covalente e ligação metálica. Inicialmente, as concepções dos estudantes em cada dimensão foram avaliadas em zonas filosóficas e posteriormente, em níveis hierárquicos. Ao final da pesquisa, foi traçado um perfil epistemológico para cada estudante a partir da avaliação das dimensões consideradas. O acompanhamento das ideias dos estudantes, dos dois contextos, ao longo do estudo das ligações químicas revelou que a construção do conhecimento se deu pela superação de obstáculos epistemológicos atrelados às zonas filosóficas realista e empirista. Detectou-se que a maior parte dos estudantes do contexto da SEA (55,2%) e tradicional (66,6%) apresentou um perfil majoritariamente racionalista ao final da pesquisa. Os resultados sugerem que existe relação entre a zona do perfil epistemológico e a capacidade de transição entre os níveis de representação da matéria, visto que as explicações que relacionaram, simultaneamente, os níveis macroscópico, submicroscópico e simbólico foram emitidas por estudantes que apresentaram perfis racionalistas. Além disso, observou-se uma vantagem da SEA, em relação ao contexto tradicional, quanto à aptidão dos estudantes em empregar concomitantemente os três níveis de representação. Por fim, este estudo evidenciou que é importante clareza teórica em relação aos modelos curriculares e planejamento didático para que se obtenham resultados satisfatórios no ensino de ligações químicas.