Mecanismos bioquímicos e moleculares envolvidos em efeitos comportamentais induzidos por reserpina em ratos e C. elegans com ênfase em parâmetros oxidativos e dopaminérgicos
Resumo
Modelos animais como o da reserpina auxiliam no entendimento da fisiopatologia de diversas doenças que se manifestam por movimentos involuntários, como a doença de Parkinson (DP), e na busca por formas de tratamento. O presente trabalho avaliou mecanismos envolvidos na indução de alterações comportamentais induzidas por reserpina em ratos e vermes com ênfase em parâmetros oxidativos e dopaminérgicos, e a ação do antioxidante ácido gálico (AG) em ratos tratados com reserpina. Como resultado, a reserpina (1mg/Kg, sc, por 3 dias consecutivos) aumentou a frequência de movimentos de mascar no vazio (MMVs) em ratos em relação ao controle, e manteve esse aumento por pelo menos 3 dias após o término das administrações da reserpina. O tratamento com AG (4,5 ou 13,5 ou 40,5 mg/kg/day, vo) por 3 dias reverteu esse aumento dos MMVs, mostrando efeito protetor. Nem reserpina nem o AG alteraram os parâmetros avaliados de dano oxidativo (TBARS e oxidação da DCFH-DA), de antioxidantes (tiol protéico e não protéico) e a atividade da Na+,K+-ATPase (total e α-subunidade) no estriado e córtex cerebral. Estudos posteriores foram realizados em Caenorhanditis elegans devido as diversas vantagens oferecidas por esse modelo animal em estudos de neurodegeneração e de investigação do mecanismo de ação de drogas. C. elegans em estágio larval L1 foram expostos a reserpina (30 ou 60 μM) por diferentes tempos. A reserpina reduziu a sobrevivência, o desenvolvimento, a ingestão de alimento, a atividade locomotora na comida e as concentrações de dopamina (DA) nos vermes, e afetou a postura de ovos e tempo entre defecações. Análise da morfologia dos neurônios dopaminérgicos cefálicos (CEP) de vermes BY200 (com GFP acoplado ao gene dat-1) indicam neurodegeneração por: 1) redução da intensidade da fluorescência, 2) redução do número de neurônios intactos e 3) aumento do número de somas atrofiados por verme em relação ao controle. Esses efeitos não estão relacionados a efeitos da reserpina na expressão do gene dat-1. Interessantemente, os efeitos da reserpina na atividade locomotora, na morfologia dos neurônios CEP e na expressão do gene dat-1 foram revertidos após a retirada dos vermes da exposição a reserpina. Em adição, a reserpina reduziu a sobrevivência de vermes deficientes do transportador vesicular de monoaminas (TVMs, cat-1) e do transportador de DA (DAT, dat-1), mas não alterou a sobrevivência de deficientes da tirosina hidroxilase (TH, cat-2) e dos receptores dopaminérgicos (dop-1, dop-2, dop-3 e dop-4) em relação aos vermes selvagens N2. A reserpina também reduziu a sobrevivência de vermes N2 pré-expostos a DA, e ativou a via de detoxificação SKN-1 dos vermes. Alterações na imunoreatividade ao DAT e a TH no estriado de ratos tratados com reserpina e/ou AG não foram encontradas. O efeito protetor do AG nos MMVs induzidos por reserpina em ratos parece não envolver sua atividade antioxidante, antiapoptótica ou na monoaminoxidase (MAO). Como conclusão, a reserpina age no TVMs causando depleção de DA, e causa neurotoxicidade/neurodegeneração dopaminérgica devido provavelmente a um acúmulo de DA no espaço sináptico resultande de uma interferência no funcionamento do DAT. Mais estudos avaliando a ação da reserpina no DAT e o mecanismo de proteção do AG são necessários.