O etos satânico: a oratória entrecortada de um rebelde renegado
Resumo
John Milton (1608-1674) viveu em um período marcado pela discussão religiosa. A
guerra civil inglesa (1640) tivera um de seus suportes envolvendo a religião, textos
literários foram compostos com alegorias bíblicas, e Milton, seguindo os hábitos de
seu tempo, criou obras com influência sacra. O Paradise Lost, por causa disso, foi,
durante muito tempo, observado à luz do mito bíblico que serviu de matéria base
para a composição do épico. Antes dos românticos, poucos críticos ousaram sair da
zona de conforto e ensaiaram uma análise que cuidava de outros aspectos além da
contribuição de autores e obras clássicas ou do mito bíblico. Com os românticos,
abriu-se definitivamente uma linha crítica atenta às personagens do Paradise Lost,
em especial de Satã. Eles ouviram as vozes que dão vida à narrativa épica e
descobriram um modelo para o seu próprio tempo. O Satã heróico e nobre dos
românticos, no entanto, não responde à complexidade da personagem. Longe de ser
uma mera materialização do mal, um elemento que possa ser culpado por todo o
infortúnio, o Satã de Milton abriga em si vestígios do bem anterior. Vitimado pela
compreensão de seu presente e abatido com as memórias do passado, a
personagem coloca-se entre a imagem de grande líder exteriorizada aos outros
anjos e as dúvidas que dominam os seus pensamentos. Esta dissertação tem por
objetivo contrapor essas duas partes da personagem.