Discurso político de Lula: o papel do marcador não na construção da persona textual
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2015-02-25Metadatos
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Ao produzirmos significados, nos vários contextos nos quais nos encontramos, estamos sempre avaliando o mundo ao nosso redor, seja de forma positiva ou negativa. Porém, não avaliamos apenas através de elementos típicos como atributos e advérbios, mas também através do engajamento que construímos com os textos de outros indivíduos. Recursos linguísticos como o marcado negativo "não", indicador de polaridade negativa (HALLIDAY; MATTHIESSEN, 2004, 2014), constitui, para Martin e White (2005), um item léxico-gramatical com potencial semântico altamente avaliativo. Partindo do sistema de modalidade, o "não" provoca contração dialógica, cujo efeito retórico é o fechamento do espaço dialógico em relação à proposição que acompanha: serve para que o locutor desvalorize, tome como não verdade ou invalide proposições produzidas anteriormente ao seu texto. No presente estudo, coletamos 107 discursos que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva proferiu no primeiro semestre de seu primeiro mandato e, através de critérios estabelecidos, selecionamos o discurso do então Presidente da República, comumente chamado de Lula, em visita ao Retiro de Itaici CNBB, proferido em 1º de maio de 2003. Processado pela ferramenta computacional WordSmith Tools 6.0, o "não" apresentou a ocorrência de 175 vezes, sendo o elemento léxico-gramatical mais recorrente no texto. A partir desses dados e através dos estudos sobre o fenômeno de negação, em Halliday e Matthiessen (2004, 2014), Martin e White (2005), Tottie (1987) e Pagano (1994), foi possível delinear quatro tipos de negação por meio do uso funcional do marcador negativo "não": quando o locus de negação é a oração projetante, Lula recorre à negação direta/proposicional ou à transferida/modal; quando o locus de negação é a oração projetada, Lula recorre ou à direta/proposicional, transferida/modal ou à gradual. Desta análise, delineamos a persona textual que o presidente constrói, através desses discursos significativamente permeados da negação, e identificamos as estratégias políticas, referentes ao seu ethos, que o ajudaram a atingir um índice de popularidade e satisfação de 87%, ao longo dos seus dois mandatos, segundo dados do CNT/SENSUS. Os resultados indicam que o uso intenso da negação é a tentativa de invalidação que o então novo presidente faz dos atos dos governos anteriores ao seu. Ao negar, Lula reforça a tese de que seu governo, uma vez petista, é diferenciado dos outros, alimentando, no público, a esperança de um país melhor; a partir de sua gestão, o Brasil poderá ser uma nação mais democrática, na qual os erros do passado não serão repetidos, e que as camadas menos favorecidas da sociedade receberão mais atenção do Poder Público. A persona textual e o ethos também são apresentados enquanto conhecedores dos problemas e das condições das áreas sociais e econômicas da sociedade: o constante uso da negação reveleva que Lula almeja corrigir o conhecimento de seu público putativo em relação ao Brasil, trazer à tona problemas que antes não eram discutidos por sujeitos políticos.