UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA CENTRO DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS–GRADUAÇAO EM EDUCAÇÃO A RELAÇÃO PEDAGÓGICA E O ENFRENTAMENTO DOS CONFLITOS E DAS VIOLÊNCIAS NA ESCOLA DISSERTAÇÃO DE MESTRADO Márcia Simone da Silva Bordin Santa Maria, RS, Brasil 2012 A RELAÇÃO PEDAGÓGICA E O ENFRENTAMENTO DOS CONFLITOS E DAS VIOLÊNCIAS NA ESCOLA Márcia Simone da Silva Bordin Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado do Programa de Pós- Graduação em Educação, Linha de Pesquisa Práticas Escolares e Políticas Públicas, do Centro de Educação da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM, RS), como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Educação. Orientadora: Profª. Drª. Lúcia Salete Celich Dani Santa Maria, RS, Brasil 2012 Universidade Federal de Santa Maria Centro de Educação Programa de Pós-Graduação em Educação A Comissão Examinadora, abaixo-assinada, aprova a Dissertação de Mestrado A RELAÇÃO PEDAGÓGICA E O ENFRENTAMENTO DOS CONFLITOS E DAS VIOLÊNCIAS NA ESCOLA elaborada por Márcia Simone da Silva Bordin corno requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Educação COMISSÃO EXAMINADORA: Santa Maria, 19 de março de 2012. AGRADECIMENTOS Agradeço, inicialmente, a Deus, pois, sem Ele nada seria possível. Agradeço pela minha vida, pela minha família, pela resiliência, pelos momentos bons e pelos momentos difíceis. Sou grata por todas as oportunidades que Ele tem me dado e pelas pessoas especiais que tem colocado em minha vida. Ao meu esposo, filhas, pais, irmãos, tios, primos, afilhados, sogros, cunhados e sobrinhos, motivos de felicidade em minha vida. Aos irmãos em Cristo, em especial ao Alessandro e à Luciana, pela amizade, carinho, motivação, orientação e ensinamentos bíblicos. À minha orientadora, Professora Doutora Lúcia Salete Celich Dani, pela paciência, pela competência profissional, pelas sugestões, pelos conhecimentos partilhados, pela compreensão. Pela confiança em mim depositada desde o início da graduação, acompanhando assim, toda a minha formação acadêmica. Muito obrigada pelos ensinamentos e oportunidades. Aos membros da banca examinadora, pelas contribuições e sugestões, pela disponibilidade e solicitude, pela dedicada leitura e apreciação do trabalho. Muito obrigada pelas aprendizagens e ensinamentos. Aos professores, colegas e demais integrantes do curso de Pós-Graduação, Mestrado em Educação, que de alguma forma contribuíram para a realização deste trabalho. À colega Juliana, pelo companheirismo e incentivo nas horas difíceis, pelo convívio e aprendizado. Aos participantes da pesquisa, professora e alunos, pela possibilidade de realizar a pesquisa de campo e pela colaboração na coleta de dados. À Universidade Federal de Santa Maria e ao Programa de Pós-Graduação em Educação, Mestrado em Educação, pelo incentivo e apoio à pesquisa, ensino e extensão, pela oportunidade de realização pessoal e profissional. Aos professores Márcia Heinz e Diomar Konrad, pelas contribuições na formatação do trabalho. DEDICATÓRIA À minha família amada, minha maior motivação na busca deste sonho: ao meu esposo José Luiz e às minhas filhas Priscila e Gabriele. Por todo o amor, carinho e compreensão; pelo incentivo nos momentos de angústia e preocupação. Que este trabalho sirva de inspiração a vocês, Priscila e Gabriele, para que nunca deixem de acreditar em seus ideais, nem permitam que ninguém diga que não são capazes, ou então, que é tarde demais para realizar um sonho. Peço desculpas pela minha ausência, durante a realização deste trabalho e sou grata pelo companheirismo de vocês. Dedico-lhes esta conquista, que também é de vocês, com muito amor e carinho. Sem vocês, nada teria sentido. À minha mãe Eni e ao Jarbas, ao meu pai Gilberto e à Elonia, aos meus irmãos: Charles, Carine e Celso , pelo carinho, pelo convívio, pelas aprendizagens e motivações, por fazerem parte da minha vida e completarem a minha felicidade. Aos meus sogros Calisto e Helena e a todos os cunhados, pela amizade e pelo carinho a mim dedicados. "Do rio que tudo arrasta se diz que é violento. Mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem". BERTOLT BRECHT RESUMO Dissertação de Mestrado Programa de Pós-Graduação em Educação Universidade Federal de Santa Maria A RELAÇÃO PEDAGÓGICA E O ENFRENTAMENTO DOS CONFLITOS E DAS VIOLÊNCIAS NA ESCOLA AUTORA: Márcia Simone da Silva Bordin ORIENTADORA: Profª. Drª. Lúcia Salete Celich Dani Data e Local da defesa: Santa Maria, 19 de março de 2012. O presente trabalho está vinculado à Linha de Pesquisa: Práticas Escolares e Políticas Públicas do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) da Universidade Federal de Santa Maria. Esta investigação, cujo tema é a relação pedagógica, os conflitos e as violências na escola, está integrada ao grupo de pesquisas Afetos Morais e ao seu projeto principal “Os conflitos e os sentimentos presentes na relação pedagógica e seus entrelaçamentos na construção da personalidade moral”. O objetivo desta pesquisa foi investigar se a forma como são trabalhados os condicionantes da relação pedagógica, em sala de aula, favorece ou não o enfrentamento das violências. Para tanto, observei as aulas de uma professora de Educação Física e três turmas de quinto ano (participantes da pesquisa), com as quais ela trabalha em uma Escola Municipal de Ensino Fundamental, localizada na cidade de Santa Maria–RS. O tipo de pesquisa utilizado foi o Estudo de Caso, com abordagem qualitativa. Os instrumentos de investigação foram: a observação direta, a entrevista semiestruturada e o questionário. A análise de dados foi sob o aporte teórico dos seguintes autores: relação pedagógica e seus condicionantes: o saber (ESTRELA, 1994), atividades (ESTRELA, 1994; ASSIS, 2003); as regras (DE VRIES, ZAN, 2003; VINHA, 2003); violências (MORAIS, 1995); conflitos (VINYAMATA, 2005). Com base na análise dos dados, observou-se que a prática pedagógica da professora contribuiu, de alguma forma, para o enfrentamento dos conflitos e das violências. Porém, poderiam ser intensificados os trabalhos na valorização dos sentimentos dos alunos e na sua participação na elaboração e na modificação das regras. Palavras-chave: Relação Pedagógica. Conflitos. Violências. ABSTRACT Mastership Dissertation Post-graduation Program on Education Federal University of Santa Maria THE PEDAGOGICAL RELATION AND HOW TO FACE THE CONFLICTS AND VIOLENCE IN SCHOOL AUTHOR: Márcia Simone da Silva Bordin SUPERVISOR: Prof. Dr. Lúcia Salete Celich Dani Date and local of defense: Santa Maria, March 19th 2012. The current paper is linked to the research line: School Practices and Public Policies of the Post-graduation Program on Education (PPGE) at the Federal University of Santa Maria. This investigation, which theme is the pedagogical relation, the conflicts and violence in schools, is part of the research group ‘Moral Affection’, and its main project: “The conflicts and the sentiments present in the pedagogical relation and the interrelations in the building of moral personality.” The objective of this research was to investigate whether the way the pedagogical relations are worked in the classroom benefits or not the act of facing the violence in schools. To do so, some classes of Physical Education of the fifth grade (research participants), in Fundamental school in Santa Maria, Rio Grande do Sul state, were observed. The sort of research used was the Case Study with a qualitative approach. The investigation instruments were: direct observation, semi-structured interview and a questionnaire. The data analysis happened under the theoretical support of the following authors: pedagogical relation and its conditions: the knowledge (ESTRELA, 1994), activities (ESTRELA, 1994; ASSIS, 2003); the rules (DE VRIES, ZAN, 2003; VINHA, 2003); violence acts (MORAIS, 1995); conflicts (VINYAMATA, 2005). Based on the data analysis, it was observed that the teacher’s pedagogical practice helped somehow to face the conflicts and violence. However, it could intensified the idea of making the students participate and know their value in making and modifying the rules. Key words: Pedagogical Relation. Conflicts. Violence. LISTA DE APÊNDICES APÊNDICE A CARTA DE APRESENTAÇÃO DO PESQUISADOR À ESCOLA ................... 123 APÊNDICE B AUTORIZAÇÃO DA ESCOLA PARA A REALIZAÇÃO DA PESQUISA ......... 125 APÊNDICE C TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO À PROFESSORA PARTICIPANTE ............................................................................ 127 APÊNDICE D CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO AOS PAIS ................................ 129 APÊNDICE E ROTEIRO DA ENTREVISTA SEMIESTRUTURADA (PARA A PROFESSORA) .......................................................................................................... 131 APÊNDICE F ROTEIRO DO QUESTIONÁRIO (PARA A PROFESSORA) .............................. 133 APÊNDICE G ROTEIRO DO QUESTIONÁRIO (PARA OS ALUNOS) ....................................... 135 SUMÁRIO INTRODUÇÃO .................................................................................................. 19 1 PONTO DE PARTIDA: DESENHO DA PESQUISA ............................... 23 1.1 Área temática ................................................................................................ 23 1.2 Questões de pesquisa .................................................................................... 23 1.2.1 Questão geradora ......................................................................................... 23 1.2.2 Questões consequentes ................................................................................ 23 1.3 Objetivos ...................................................................................................... 24 1.3.1 Objetivo geral .............................................................................................. 24 1.3.2 Objetivos específicos .................................................................................. 24 1.4 Explicação de termos, delimitação e explicação das questões de pesquisa 24 1.4.1 Relação pedagógica ...................................................................................... 24 1.4.2 Conflitos ........... ........................................................................................... 26 1.4.3 Violências .................................................................................................... 27 1.5 Abordagem metodológica ............................................................................. 28 1.6 O contexto da pesquisa .................................................................................. 31 1.7 Participantes da pesquisa .............................................................................. 32 1.8 Instrumentos de investigação ........................................................................ 34 1.8.1 Observação direta .......................................................................................... 34 1.8.2 Entrevista semiestruturada ............................................................................ 35 1.8.3 Questionário ................................................................................................ 36 1.9 Técnica de análise de dados .......................................................................... 36 2 A RELAÇÃO PEDAGÓGICA E AS VIOLÊNCIAS NA ESCOLA ............ 39 2.1 A relação pedagógica ..................................................................................... 39 2.1.1 O saber .......................................................................................................... 43 2.1.2 As atividades ................................................................................................. 44 2.1.3 As regras ........................................................................................................ 46 2.2 Os conflitos e as violências na escola ............................................................. 51 2.2.1 Os conflitos ................................................................................................... 51 2.2.2 As violências .................................................................................................. 57 2.2.3 Desafios para a escola .................................................................................... 64 2.2.4 Quem deve resolver os conflitos e as violências? .......................................... 70 2.2.5 Pesquisas relacionadas ................................................................................. 73 3 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS ........................................................ 83 3.1 Os condicionantes da relação pedagógica e as respostas dos interlocutores da pesquisa .................................................................................... 86 3.2 Os conflitos e as violências .............................................................................. 100 CONSIDERAÇÕES PARA NÃO FINALIZAR ................................................ 111 REFERÊNCIAS ................................................................................................... 115 APÊNDICES .......................................................................................................... 121 INTRODUÇÃO O presente trabalho está vinculado à Linha de Pesquisa: Práticas Escolares e Políticas Públicas do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) da Universidade Federal de Santa Maria e o seu tema é a relação pedagógica e as violências na escola. Neste estudo, proponho uma reflexão acerca desse tema comumente manifesto nas escolas. Ele gera sentimentos de insegurança e impotência em grande parte dos educadores, por estes não saberem lidar com situações que promovem violências na relação professor- aluno e aluno-aluno. Diante disso, busquei investigar se a forma como são trabalhados os condicionantes da relação pedagógica, em sala de aula, favorece ou não o enfrentamento das violências e também averiguar qual o entendimento que a professora de Educação Física possui sobre as violências e os conflitos escolares. Além disso, procurei compreender de que forma a relação pedagógica auxilia no enfrentamento das violências na escola. A motivação para pesquisar essa temática surgiu durante minha formação acadêmica. Foi no primeiro semestre da graduação do Curso de Pedagogia da Universidade Federal de Santa Maria. Na disciplina Psicologia da Educação I, fui “apresentada” ao tema pela professora que falava com entusiasmo sobre o projeto de pesquisa do qual era coordenadora e sobre as ações realizadas pelo seu grupo de trabalho composto por acadêmicos da graduação, da especialização e do mestrado. Em agosto de 2005 (data do meu ingresso na UFSM) entrei como participante no projeto de pesquisa: “A violência na escola e a gestão democrática: o papel do diretor”. Do segundo ao sétimo semestre, fui bolsista PROLICEN/ UFSM, no projeto de pesquisa: “Os conflitos e os sentimentos presentes na relação pedagógica e seus entrelaçamentos na construção da personalidade moral”. No oitavo semestre da graduação, participei como bolsista do projeto de extensão “Conflitos, sentimentos e violências na escola”. Esses projetos estavam sob a coordenação da Professora Doutora Lúcia Salete Celich Dani. Atualmente, sou bolsista CNPq no curso de Mestrado, especializanda em Educação Física Escolar (PPG/CEFD/UFSM) e participante do grupo de estudos e pesquisas sobre afetividade e moralidade “Afetos Morais” (PPGE/CE/UFSM). Este grupo está ligado ao Programa de Pós-Graduação em Educação da UFSM e suas pesquisas são vinculadas ao 20 projeto principal: “Os conflitos e os sentimentos presentes na relação pedagógica e seus entrelaçamentos com a personalidade moral”. Registrado no GAP/CE, sob nº 015520, está composto atualmente, por cinco mestrandas, quatro graduandas, uma bolsista e a coordenadora, Professora Doutora Lúcia Salete Celich Dani. Considero relevante fazer um breve retrospecto sobre as produções realizadas pelo grupo de pesquisa, começando pelas pesquisas da coordenadora. Em 1996, a Professora Doutora Lúcia Salete Celich Dani apresentou a dissertação do mestrado denominada “A relação pedagógica e o fracasso escolar na 1ª série do 1º grau: a repercussão das recompensas e dos castigos”. Este estudo investigou “A temática recompensas e castigos a partir do conceito de fracasso escolar, denominado o aluno exitoso” (DANI, 1996, p. vi). Em 2003, defendeu a tese de doutorado intitulada “A relação pedagógica e suas imbricações da personalidade moral”. Esta pesquisa discorre sobre a relação professor- aluno bem como acerca da construção da personalidade moral e a resolução dos conflitos sociomorais na escola. No ano de 2008, Eleodora dos Santos Leonardi defendeu a dissertação intitulada “A resolução dos conflitos sociomorais e suas implicações na construção da autonomia moral dos alunos”. Em 2009, Clarissa Faverzani Magnago pesquisou “A prática pedagógica no enfrentamento da violência psíquica”. No mesmo ano, Douglas Casarotto de Oliveira, dissertou sobre “Uma genealogia do jovem usuário de crack: mídia, justiça, saúde, educação”. Em 2010, Cristina Helena Bento Farias pesquisou sobre “Os conflitos no ambiente sociomoral escolar: implicações e possibilidades” e Viviane Martins Vital Ferraz defendeu sua dissertação sobre: “A relação pedagógica em sala de aula: um estudo sobre o fracasso escolar e a construção da autonomia”. Atualmente quatro projetos de trabalho de conclusão de curso estão em andamento. Violências na escola: relação entre alunos, desenvolvida por Cristiane de Campos Alves; Os conflitos e as violências escolares e o movimento de ingresso no Ensino de Jovens e Adultos, de Anelise Heidi Rempel; A relação pedagógica e a indisciplina na sala de aula, pesquisado por Vivian Jamile Beling e As violências do ciberbullying e as relações interpessoais na escola, desenvolvida por Francieli Fracari. As mestrandas Leisa Caetano Bürger e Marcelle Louzada estão pesquisando, respectivamente, sobre: As relações professor-aluno na prática escolar da Educação Física e suas implicações no desenvolvimento da autonomia moral dos discentes e A violência escolar decorrente das práticas de bullying no ensino fundamental. Além disso, Juliana Mezzomo Cantarelli está pesquisando sobre A linguagem como forma de violência na relação professor- 21 aluno em sala de aula, e eu estou pesquisando sobre A relação pedagógica e o enfrentamento das violências na escola, tema que está relacionado aos demais estudos realizados no grupo de estudos e pesquisas sobre Afetividade e Moralidade - Afetos Morais. A participação neste grupo, através dos projetos de pesquisa, possibilitou-me maior contato com a realidade escolar e tornou-me inquieta e atenta diante das violências, dos conflitos escolares e das tentativas frustradas de resolução destes. No primeiro trabalho de campo, entrevistei a equipe diretiva de escolas públicas e privadas. Após, entrevistei professores de Anos Iniciais e finais de Escolas Municipais e Estaduais. Por último, não menos importante, escutei trezentos e sessenta e seis alunos do 1º ao 9º ano de uma Escola Municipal de Ensino Fundamental, localizada nesta cidade. No projeto de extensão, junto à coordenadora, mestrandas e acadêmicas do curso de Pedagogia da Universidade Federal de Santa Maria, escutamos um grupo de professoras preocupadas com as situações violentas que ocorriam em suas salas de aula e na escola. Estavam desmotivadas, desesperançosas com a dura realidade enfrentada na escola. Equivocadas quanto à melhor estratégia utilizada na resolução de conflitos, esperavam que “viesse de fora”, do nosso grupo, a solução para todos os problemas emergentes na relação pedagógica. O contato com as escolas revelou aspectos comuns à grande parte dessas instituições, apontando, principalmente, para a dificuldade em lidar com situações de violências em seu cotidiano. Por outro lado, mostraram que também devem ser levados em conta aspectos referentes à realidade sociocultural na qual a escola e sua comunidade estão inseridas. Foi considerado ainda o modelo de gestão que mantém o estabelecimento de ensino e a efetividade da participação da comunidade. Além da minha participação nos projetos de pesquisa e extensão, outros fatores foram também desencadeadores de interesse pelos estudos das violências nas salas de aula, no decorrer de minha formação. Por exemplo, a pesquisa que desenvolvi como Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), em 2009, intitulada “A relevância do lúdico na aprendizagem”, sob orientação da Professora Doutora Lúcia Salete Celich Dani. Esta pesquisa revelou importantes conexões entre a disciplina de Educação Física e a ludicidade. Quando os professores foram indagados sobre as suas experiências lúdicas enquanto alunos dos Anos Iniciais, alguns afirmaram ser a Educação Física a única disciplina que trabalhava a ludicidade. Além disso, a pesquisa revelou, através dos resultados das entrevistas e das bibliografias consultadas, que o lúdico é importante minimizador das violências e dos 22 conflitos escolares. Isso possibilita maior aproximação entre colegas e interação entre os pares, gerando um clima de amizade e de confiança, diminuindo, assim, a presença dos conflitos negativos na sala de aula e reforçando as relações interpessoais cooperativas. Assim, consideramos relevante pesquisar e buscar novas alternativas para lidar com as violências na escola, de modo que elas não se tornem um obstáculo na relação pedagógica. Tendo em vista os resultados das pesquisas realizadas anteriormente, percebemos que é pertinente aprofundar a investigação sobre a temática. Continuando os estudos sobre as violências, observei as aulas de uma professora de Educação Física, assim como, três turmas de quinto ano (participantes da pesquisa) para averiguar se a forma como são trabalhados os condicionantes da relação pedagógica, em sala de aula, favorece ou não o enfrentamento das violências. O tempo de observação foi de um semestre, sendo que as aulas destas turmas aconteceram uma vez por semana, com cinquenta minutos de duração cada aula, e as turmas tinham horários distintos. O tipo de pesquisa que utilizei foi o Estudo de Caso, com base em uma abordagem qualitativa. Os instrumentos de investigação utilizados para a coleta de dados foram: a observação direta, a entrevista semiestruturada e questionário (com a professora) e questionário (com os alunos). A análise dos dados contemplou os seguintes passos: foi realizada a leitura de todos os dados coletados na entrevista, no questionário e nas observações in loco. Após, foram feitas as relações entre os dados coletados e as questões propostas neste estudo. O presente trabalho está estruturado em três capítulos. No primeiro capítulo, denominado “Ponto de Partida”, apresento o desenho da pesquisa, destacando a área temática, as questões de pesquisa, os objetivos e a metodologia prevista para a investigação. “A relação pedagógica e as violências na escola” é o título do segundo capítulo. Apresento nele uma reflexão sobre relação pedagógica e os seus condicionantes, sobre as violências e os conflitos na escola e algumas pesquisas relacionadas. No terceiro capítulo, é apresentada a análise e discussão dos dados obtidos através da entrevista semiestruturada (Apêndice E) e do questionário com a professora (Apêndice F), dos questionários (Apêndice G) com os alunos e das observações in loco. Além disso, apresento as considerações finais. 1 PONTO DE PARTIDA: DESENHO DA PESQUISA Neste capítulo, são delimitadas e explicitadas a área temática, as questões da pesquisa, os objetivos, o método, o contexto e os participantes da pesquisa, bem como os instrumentos da investigação e a técnica de análise dos dados. 1.1 Área temática A pesquisa aqui desenvolvida possui como tema a relação pedagógica, os conflitos e as violências na escola. Neste sentido, observei as aulas de uma professora de Educação Física, que atua em três turmas de quinto ano, frente às violências na sala de aula. Portanto, a presente pesquisa tem como área temática: A relação pedagógica e o enfrentamento dos conflitos e das violências na escola. 1.2 Questões de pesquisa A partir da temática proposta, foram definidas as seguintes questões de pesquisa: 1.2.1 Questão geradora - A forma como são trabalhados os condicionantes da relação pedagógica, em sala de aula, favorece ou não o enfrentamento dos conflitos e das violências? 1.2.2 Questões consequentes - Como são tratadas pela professora de Educação Física as situações de violências e conflitos entre alunos durante as aulas? - Qual o entendimento que a professora de Educação Física possui sobre as violências e os conflitos escolares? 24 1.3 Objetivos 1.3.1 Objetivo geral - Investigar se a forma como são trabalhados os condicionantes da relação pedagógica, em sala de aula, favorece ou não o enfrentamento dos conflitos e das violências. 1.3.2 Objetivos específicos - Investigar como são tratadas, pela professora de Educação Física, as situações de violências e de conflitos entre alunos durante as aulas. - Compreender qual o entendimento que a professora de Educação Física possui sobre as violências e os conflitos escolares. 1.4 Explicação de termos, delimitação e explicação das questões de pesquisa A partir das questões propostas na área temática, fez-se necessário, definir, delimitar e explicitar os conceitos utilizados nesta pesquisa. Isso evitará possíveis ambiguidades e possibilitará maior esclarecimento dos termos. 1.4.1 Relação pedagógica O conceito de relação pedagógica utilizado nesta pesquisa está alicerçado nos estudos desenvolvidos por Maria Tereza Estrela (1994), em sua obra Relação Pedagógica, disciplina e indisciplina na aula. Este conceito também foi utilizado por Dani (1996), em sua dissertação de Mestrado intitulada A relação pedagógica e o fracasso escolar na 1ª série do 1º grau: a repercussão das recompensas e dos castigos. Para Estrela (1994), “a relação pedagógica é o contato interpessoal entre os intervenientes de uma situação pedagógica e o resultado desses contatos” (p. 32). Estrela (1994) compreende a relação pedagógica no sentido amplo e no sentido restrito. O primeiro compreende todos os agentes que estão inseridos no processo pedagógico direta ou indiretamente. São as relações entre professor-aluno, professor-professor, aluno-aluno, aluno- funcionário, professores-pais, etc. Já o segundo compreende as relações estabelecidas 25 exclusivamente em sala de aula, entre aluno-aluno e professor-aluno, abarcando situações pedagógicas. Esta pesquisa empregará a relação pedagógica em seu sentido restrito já que tem como objetivo investigar as relações estabelecidas em sala de aula, especificamente entre professores-alunos e entre alunos-alunos. Também serão analisados: o saber, as atividades e as regras, como condicionantes da relação pedagógica. - O saber: este conceito será utilizado nesta pesquisa, fundamentado na obra Relação Pedagógica, disciplina e indisciplina na aula, de Maria Tereza Estrela (1994). A autora afirma que O saber é objeto de transmissão, a sua natureza e extensão e as condições da sua distribuição social determinam em cada sociedade e em cada tempo histórico as formas e condições da sua apropriação e, ao determinar estas condições, determina as funções e a hierarquia das funções que a escola desempenha (ESTRELA, 1994, p. 33). Portanto, os aspectos formativos e sociais do desenvolvimento do aluno se articulam ao saber, mediatizados pela ação do professor. Sendo assim, o saber determina a relação pedagógica dentro da escola, pois “não há relação pedagógica que não seja mediatizada pelo saber e regulada pelo poder que esse saber origina” (ESTRELA, 1994, p. 33). - As atividades: neste estudo o conceito de atividades provém das pesquisas de Assis (2003) e Estrela (1994). Para Estrela (1994, p. 40), “as atividades de aprendizagem pressupõem a existência se uma organização que cria tarefas, distribui tarefas aos alunos e ao professor, estipula regras e instruções, abre ou fecha canais e redes de comunicação, institui formas de controle”. As atividades, que compreendem todas as ações realizadas em sala de aula, são carregadas de intencionalidade. Nelas, estão traduzidas as pretensões do professor enquanto formador de seres autônomos (independentes moral e intelectualmente) ou heterônomos (obedientes às regras externas e incapazes de questioná-las). Na concepção de Assis (2003) a atividade é o instrumento de conhecimento da criança. Desse modo, [...] É grande a responsabilidade que recai sobre o educador, pois a ele compete elaborar os métodos e técnicas que emprega no processo educativo, baseando-se nos conhecimentos da psicologia da criança, se quiser, de fato, favorecer o seu desenvolvimento [...] Cabe ao educador promover o desenvolvimento das crianças criando as condições adequadas para que ele se realize espontaneamente. Para que isso ocorra o ambiente físico com o qual ela tem contato deverá oferecer-lhe uma 26 grande diversidade de materiais concretos, que lhe estimulem a curiosidade e a atividade, que é o seu instrumento de conhecimento (ASSIS, 2003, p. 165). Assis (2003) afirma que “não é possível propiciar a atividade intelectual, baseada na atividade individual espontânea, sem o intercâmbio das crianças entre si e com a professora” (p. 200). Portanto, as atividades são imprescindíveis componentes da relação pedagógica. - As regras: o conceito de regras aplicado nesta investigação está ancorado nos estudos de De Vries e Zan (2003) e ao conceito de regras desenvolvido por Vinha (2003). De Vries e Zan (2003) entendem as regras como uma parte presente e necessária na experiência de cada criança na escola. No entanto, as autoras enfatizam que é preciso ter cuidado ao trabalhar com as regras, já que estas contribuem para o desenvolvimento moral e social das crianças. As regras têm que preservar e propiciar ao sujeito o respeito por si próprio e pelo outro. A autora afirma que “para estabelecer os limites em sala de aula (ou na escola), o educador vale-se das regras, que visam contribuir para a organização do ambiente de trabalho, promover a justiça, fomentar a responsabilidade por aquilo que ocorre na classe e o comprometimento de todos com os procedimentos e decisões referentes à sala de aula” (VINHA, 2003, p. 252). 1.4.2 Conflitos Os conflitos são inerentes à condição humana, em si não são bons nem maus. Surgem quando duas partes manifestam interesses contrários, intenções incompatíveis, opiniões adversas diante de determinadas situações. Para Belmar (2005, p. 102), “o conflito se apresenta quando se encontram dois atores em oposição consciente, em uma situação em que se perseguem objetivos incompatíveis, o que leva a um confronto ou a uma luta”. O conflito é uma situação de oposição consciente entre duas partes e é um processo natural da sociedade, podendo ser um fator positivo de mudança e desenvolvimento pessoal e social. Entretanto, se não é regulado no sentido de sua resolução adequada, pode engendrar ações de violência em seus diferentes tipos. Os conflitos são resolvidos conhecendo-se suas causas e compreendendo sua formação e seu desenvolvimento (BELMAR, 2005, p. 111). O conflito pode ser positivo se contribuir para melhorar as relações, favorecer partilhas, promover a transformação, favorecer o desenvolvimento pessoal e social. Ou, poderá ser negativo se prejudicar as relações, inibir a expressão dos sentimentos, tolher emoções. O conflito é um processo natural da sociedade e um fenômeno necessário para a vida humana, podendo ser um fator positivo para a mudança e o crescimento pessoal e interpessoal ou um fator negativo de destruição, dependendo da forma de regulá-lo. 27 O conflito não é bom nem mau, simplesmente existe. É como uma força natural que, controlada e em sua justa e equilibrada medida, pode desenvolver a natureza, produzir energia e estimular a vida e, por outro lado, quando se apresenta de forma descontrolada, pode alterar os ciclos naturais, destruir e impedir o crescimento da vida (BELMAR, 2005, p. 101). Dependendo da estratégia utilizada na sua resolução, o conflito poderá transformar-se em violência. Por isso, o método de intervenção será fundamental para não agravá-los e para prevenir o surgimento de violências. Para Vinyamata (2005, p. 15), As intervenções durante os conflitos consistirão, basicamente, no desenvolvimento de processos pedagógicos, de negociação, mediação, arbitragem ou tratamento, utilizando os recursos adequados, trata-se de casos de conflitos interpessoais, sociais, políticos ou internacionais. 1.4.3 Violências Para tratar de violências, tomaremos os conceitos utilizados por Régis de Morais em sua obra Violência e Educação (1995). Segundo o autor, “a violência é própria do humano, pois implica intencionalidade, o que exige inteligência; razão pela qual os irracionais não são violentos, mas ferozes” (MORAIS, 1995, p. 20). Partindo deste pressuposto, de que a violência necessariamente necessita de uma intencionalidade, uma “consciência”, um planejamento para a ação pretendida, avançamos também no sentido de destacar que existem múltiplas formas de violência. Portanto, tratamos de violências neste estudo para contemplar suas diferentes formas de manifestação. Quais sejam: violência física, violência simbólica, violência psicológica, violência moral e violência por omissão. Esforçamo-nos por esclarecer que violências não são apenas agressões físicas ou ao patrimônio dos cidadãos. As violências sutis têm logrado passar indiscutidas, exatamente por faltar-lhes o impacto da brutalidade sangrenta. Continuaremos com o nosso objetivo de discutir a relação entre violência e educação, focalizando seja a violência branca (sutil) seja a vermelha (brutal); muitas vezes nos preocuparemos mais com a primeira propriamente por ela se esconder nas próprias estruturas da “ordem social e política” (MORAIS, 1995, p. 55). Nesse sentido, procurei compreender como a professora, participante desta pesquisa, resolve as questões de violências na sua disciplina: se resolve por meio de encaminhamentos a terceiros, se resolve eticamente pelo diálogo com os envolvidos, se resolve por meio de castigos e punições ou se resolve de outra maneira. Ou então, se não resolve, mantendo-se imparcial frente às violências. 28 Se essa última forma de violência prevalecer, reforça-se outro tipo de violência: a omissiva. Quem assiste a um aluno que constrange e humilha o colega e fica indiferente, insensível à causa do outro, demonstra-lhe, no mínimo, estranhamento, não reconhecimento do outro enquanto alguém que está fragilizado precisando de auxílio. O professor, pago pela sociedade para exercer sua profissão com excelência não pode ser negligente com as questões de violências, pelo contrário, deveria investir na educação de valores a fim de preveni-las. 1.5 Abordagem metodológica Esta pesquisa foi desenvolvida com base em uma abordagem qualitativa. Entendo que esta abordagem valoriza a investigação pelo seu caráter dinâmico, descritivo, facilitador da compreensão e interpretação dos dados coletados e dos fenômenos observados. Segundo Chizzotti (2006), A abordagem qualitativa parte do fundamento de que há uma relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito, uma interdependência viva entre o sujeito e o objeto, um vínculo indissociável entre o mundo objetivo e a subjetividade do sujeito. O conhecimento não se reduz a um rol de dados isolados, conectados por uma teoria explicativa; o sujeito observador é parte integrante do processo de conhecimento e interpreta os fenômenos, atribuindo-lhes um significado. O objeto não é um dado inerte e neutro; está possuído de significados e relações que sujeitos concretos criam em suas ações (CHIZZOTTI, 2006, p. 79). Denzin e Lincoln (2006) ressaltam que “a pesquisa qualitativa envolve o estudo do uso e a coleta de uma variedade de materiais empíricos [...] que descrevem momentos e significados rotineiros e problemáticos na vida dos indivíduos” (p. 17). Outro aspecto relevante da pesquisa qualitativa diz respeito à tarefa do pesquisador. Para Lüdke e André (1986, p. 11), “a pesquisa qualitativa supõe o contato direto e prolongado do pesquisador com o ambiente e a situação que está sendo investigada, via de regra, através do trabalho intensivo de campo”. Para tanto, o pesquisador deve procurar presenciar o maior número possível de situações no cotidiano escolar, observando atentamente as sutilezas, os gestos e as expressões manifestas neste contexto. Além disso, “a pesquisa qualitativa ou naturalística, envolve a obtenção de dados descritivos, obtidos no contato direto do pesquisador com a situação estudada, enfatiza mais o processo do que o produto e se preocupa em retratar a perspectiva dos participantes” (LÜDKE; ANDRÉ, 1986, p. 12). Neste sentido, considero que a abordagem qualitativa seja a mais apropriada para esta pesquisa. 29 A escolha se justifica visto que a referida abordagem considera relevante o contexto da pesquisa com tudo o que nele está envolvido: regras, valores, atribuições morais e também os sujeitos da pesquisa com suas subjetividades, motivações, crenças, palavras e manifestações. [...] A pesquisa qualitativa é uma atividade situada que localiza o observador no mundo. Consiste em um conjunto de práticas materiais e interpretativas que dão visibilidade ao mundo. Essas práticas transformam o mundo em uma série de representações, incluindo as notas de campo, as entrevistas, as conversas, as fotografias, as gravações e os lembretes. Nesse nível, a pesquisa qualitativa envolve uma abordagem naturalista, interpretativa, para mundo, o que significa que seus pesquisadores estudam as coisas em seus cenários naturais, tentando entender, ou interpretar, os fenômenos em termos dos significados que as pessoas a eles conferem (DENZIN; LINCOLN, 2006, p. 17). Considera relevante também a pesquisa bibliográfica e os pressupostos teóricos e epistemológicos, priorizando a qualidade em vez da quantidade de dados coletados. Todos estes elementos são considerados importantes, assim como são levados em conta as suas especificidades e a sua contribuição para o todo, o que dá um caráter holístico para a investigação. A abordagem qualitativa possui relação com o Estudo de Caso, posto que enfatiza a criação, a descoberta e permite a interpretação das subjetividades do investigador e do investigado. Para Lüdke e André (1986), A justificativa para que o pesquisador mantenha um contato estreito e direto com a situação onde os fenômenos ocorrem naturalmente é a de que estes são muito influenciados pelo seu contexto. Sendo assim, as circunstâncias particulares em que um determinado objeto se insere são essenciais para que possa entendê-lo. Da mesma maneira as pessoas, os gestos, as palavras estudadas devem ser sempre referenciadas ao contexto onde aparecem (LÜDKE; ANDRÉ, 1986, p. 12). Diante disso, pode-se afirmar que o tipo de pesquisa utilizado foi o Estudo de Caso para o desenvolvimento desta investigação qualitativa. Ela tem como objetivo investigar se a forma como são trabalhados os condicionantes da relação pedagógica, em sala de aula, favorece ou não o enfrentamento das violências. Para tanto, foi necessária a observação das aulas de uma professora de Educação Física em três turmas de quinto ano de uma Escola Municipal de Ensino Fundamental. O estudo de caso qualitativo constitui uma investigação de uma unidade específica, situada em seu contexto, selecionada segundo critérios predeterminados e, utilizando múltiplas fontes de dados, que se propõe a oferecer uma visão holística do fenômeno estudado. Os critérios para identificação e seleção de caso, porém, bem como as formas de generalização propostas, variam segundo a vinculação paradigmática do pesquisador, a qual é de sua livre escolha e deve ser respeitada. O importante é que haja critérios explícitos para a seleção do caso e que este seja realmente um “caso”, 30 isto é, uma situação complexa e/ou intrigante, cuja relevância justifique o esforço de compreensão (MAZZOTTI, 2006, p. 7). O Estudo de Caso possibilita um maior detalhamento das relações dentro das instituições, neste caso, a escola. Dedica-se ao aprofundamento e a análise do que há de mais essencial e característico no fenômeno investigado e no contexto no qual ele está inserido. Busca-se, criativamente, apreender a totalidade de uma situação – identificar e analisar a multiplicidade de dimensões que envolvem o caso – e, de maneira engenhosa, descrever, discutir e analisar a complexidade de um caso concreto, construindo uma teoria que possa explicá-lo e prevê-lo. Mediante um mergulho profundo e exaustivo em um objeto delimitado, o Estudo de Caso possibilita a penetração em uma realidade social, não conseguida plenamente por um levantamento amostral e avaliação exclusivamente quantitativa (MARTINS, 2006, p. 9). Independente de qualquer tipologia, o Estudo de Caso orienta uma busca de explicações e interpretações convincentes para situações que envolvam fenômenos sociais complexos. Implica, também, a construção de uma teoria explicativa do caso que possibilite condições para se fazerem interferências analíticas sobre posições constatadas no estudo e outros conhecimentos encontrados (MARTINS, 2006). Logo, a partir dos resultados de um Estudo de Caso, Buscam-se generalizações de um conjunto particular de resultados, ou seja, generalizações da teoria preliminar, proposições e eventuais teses apresentadas, discutidas e mostradas no estudo. A validade externa será evidenciada na medida em que os achados de um caso possam ajudar a explicação de outro caso semelhante (MARTINS, 2006, p. 96). Sendo assim, Chizzotti (2006) ressalta que “o caso é tomado como unidade significativa do todo e, por isso, suficiente tanto para fundamentar um julgamento fidedigno quanto propor uma intervenção” (p. 102). Portanto, pode representar apenas uma realidade ou retratar diversos aspectos globais, presentes em uma dada situação. Este procedimento tem cunho descritivo e analítico. Ele enfatiza as especificidades do fenômeno estudado e, tem no investigador, seu principal instrumento de coleta de dados. Além disso, possui a capacidade de, a partir de seus achados, criar novas hipóteses, gerar novas teorias que poderão instigar outros pesquisadores à formulação de novas questões de futuras pesquisas. 31 1.6 O contexto da pesquisa A pesquisa foi realizada em uma escola pública de Ensino Fundamental que integra o sistema municipal de ensino da cidade de Santa Maria - RS. A escolha por realizar a pesquisa neste estabelecimento de ensino se deu pelo fato de eu já conhecer a escola por ter sido aluna da pré-escola e depois das séries finais. Também justifico a escolha, por essa escola ter um educador físico para ministrar a disciplina de Educação Física. Isso não ocorre em algumas escolas da cidade, onde, nos anos iniciais, esta disciplina é ministrada por pedagogas. Além disso, essa escola sempre foi muito receptiva quando realizei observações e intervenções enquanto acadêmica do curso de Pedagogia. Enquanto pesquisadora e participante de grupo de estudos, obtive a colaboração de professores, alunos e equipe diretiva. Essa escola está localizada em um bairro de periferia. Seu funcionamento se dá nos turnos: manhã, tarde e noite. Há em torno de novecentos alunos com idade que varia entre os seis anos até a fase adulta. A escola oferece o Ensino Fundamental (do primeiro ao nono ano). Anos iniciais – do primeiro ao quinto ano, no turno da manhã, anos finais – do sexto ao nono ano, no turno da tarde e a modalidade de Educação de Jovens e Adultos do Ensino Fundamental, no turno da noite. Possui 80 profissionais entre professores e funcionários. O nível sócio-econômico é predominantemente baixo e a grande maioria dos pais de alunos têm escolaridade correspondente ao antigo primeiro grau incompleto. Segundo o PPP (2009, p. 25), Observa-se em um grande número de alunos um potencial criativo muito rico e, quando solicitados, desenvolvem trabalhos surpreendentes. Também é preciso mencionar que a interação no convívio de sala de aula e ambientes da escola é geralmente muito positiva. Por outro lado, há alunos com problemas diversos, desmotivados, talvez pela desvalorização da escola pública, ou devido ao meio no qual está inserida – comunidade carente, de baixa renda -, são elevados os índices de desistência, transferência e repetência. A média anual de reprovação na escola é de 20,21% nos últimos três anos. Os percentuais maiores encontram-se nos anos finais, em turmas de sexto, sétimo e oitavo ano, caracterizadas por alunos na fase da adolescência, oriundos de famílias que não dispõem de uma estrutura sólida e, muitas vezes, nem mesmo de um familiar que os acompanhe e exija uma postura responsável quanto aos estudos, frequência e o necessário empenho para obter 32 aprovação. Também ocorrem situações em que são feitos encaminhamentos a especialistas, mas os pais não têm como arcar com os custos nem mesmo das passagens de ônibus para buscar o atendimento (PPP, 2009, p. 25). Ficou estabelecido, a partir de instrumentos coletados com professores, alunos, funcionários e pais, que o objetivo geral da escola é “conhecer a realidade da escola e, a partir dela, buscar a construção coletiva do conhecimento e a transformação do meio através da participação comprometida, crítica e criativa” (PPP, 2009, p. 12). A escolha de diretores dá-se por eleições diretas, de acordo com a Lei Municipal, quando toda a comunidade participa da votação, assim como em todo o processo decisório busca-se o consenso democrático entre todos os segmentos envolvidos da comunidade escolar. A gestão é por um período de três anos e a escola apresenta mecanismos diversos de participação da comunidade escolar na tomada de decisões, a fim de que a gestão seja o mais democrática e transparente possível (PPP, 2009, p. 26). A infraestrutura física da escola constitui-se por uma parte antiga e uma recente. A parte antiga possui: uma sala de vídeo, de informática, uma para a coordenação e orientação educacional, uma cozinha, um saguão, uma sala para os professores, salas da secretaria, da direção, uma biblioteca, três salas de aula, uma salinha usada para depósito de material, outra onde se localiza o bar, dependências do zelador, um banheiro comum para os professores e banheiros masculinos e femininos para os alunos [...] Duas salas são destinadas à cozinha e ao refeitório, outra para guardar os materiais de judô e educação física, além de uma sala para atendimento de Educação Especial (PPP, 2009, p. 11). A parte recente comporta dois pisos. Neles existem 4 salas amplas em cada andar, uma sala com banheiro para o primeiro ano, banheiros masculino e feminino para os alunos e mais dois para os professores. Apesar das melhorias recentes, maior número de salas, sala de informática e uma quadra poliesportiva, a escola necessita ainda de outros espaços, como, por exemplo: um local apropriado para reuniões, um ginásio coberto, com quadras para as aulas práticas e outras atividades esportivas. 1.7 Participantes da pesquisa Os participantes desta pesquisa são uma professora de Educação Física e os alunos de três turmas de quinto ano, com as quais ela trabalha, em uma Escola Municipal de Ensino Fundamental, localizada na cidade de Santa Maria – RS. 33 O motivo de eu ter escolhido essa professora como participante do estudo se deu principalmente pelo fato da sua formação acadêmica. Em algumas escolas, a disciplina de educação física é ministrada por pedagogas. Gostaria de conhecer o trabalho deste profissional, de área diferente da minha, com conhecimentos e experiências também diferenciadas. Justifico a escolha também devido aos resultados obtidos em meu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), no ano de 2009, onde surgiu, nas memórias (enquanto alunas de anos iniciais) das professoras entrevistadas, a educação física como única disciplina a trabalhar a ludicidade, e esta, como uma das ferramentas para inibir ou minimizar os conflitos e as violências escolares. Outros motivos que me mobilizaram à opção pela educadora física, assim como pela sua disciplina, foi o fato de a Educação Física acontecer em um espaço diferente da sala de aula, no pátio ou quadra e por apresentar uma proposta de trabalho diferenciada. Esta, possibilita maior contato entre os alunos, o trabalho em equipe e as relações interpessoais. A colaboradora da pesquisa, a quem chamarei pelo nome fictício de Bela, tem dez anos de magistério e atua em duas escolas: uma municipal e outra estadual. Possui graduação no curso de Educação Física e especialização em Educação Física Escolar. Atualmente, está trabalhando com alunos do quarto ao sexto ano do Ensino Fundamental. A escolha das turmas de alunos ocorreu devido a dois critérios: série e faixa etária. A preferência por alunos de anos iniciais com idades variadas (entre oito e doze anos) considero que seja representativa da realidade de grande parte dos alunos da escola pública. A diferença de idade, que reflete a diferença em gostos e opções, muitas vezes são desencadeadores de conflitos e de violências entre alunos e se caracterizam como um desafio para os docentes. Acredito ser relevante conhecer as concepções de crianças com idades diferentes (uns na infância, outros na passagem para a pré-adolescência, outros com atitudes e pensamentos de adolescentes) e investigar como a professora lida com tudo isso. Esclareço também que a opção por essas turmas teve a intenção de selecionar alunos que já soubessem escrever, expor seus sentimentos e pontos de vista com clareza. Assim sendo, foram vinte e seis alunos participantes da pesquisa. Responderam ao questionário quatorze meninos entre nove e doze anos de idade e doze meninas entre oito e onze anos de idade. O número de colaboradores aconteceu pela livre escolha dos alunos em participar da pesquisa, trata-se de alunos cujos pais autorizaram a participação após esclarecidos sobre a temática e os objetivos da pesquisa à priori. Foi respeitada a decisão daqueles que optaram 34 em não participar, não havendo qualquer questionamento sobre as razões que os levaram a tal decisão. 1.8 Instrumentos de investigação Os instrumentos de investigação utilizados para a coleta de dados foram: a observação direta, a entrevista semi-estruturada (Apêndice E) e questionário (Apêndice F) para a professora e o questionário para os alunos (Apêndice G). Eles possibilitaram uma interpretação significativa da realidade escolar e uma melhor compreensão das questões da investigação. 1.8.1 Observação direta A opção pela observação direta se deu pela possibilidade que este instrumento oferece: contato direto do pesquisador com o fenômeno observado. Esta aproximação oportuniza maior atenção, por parte do pesquisador, às ações dos sujeitos da pesquisa, professor e alunos, em seu contexto cotidiano, a escola. Nesse sentido, A observação direta pode visar a uma descrição “fina” dos componentes de uma situação: os sujeitos em seus aspectos pessoais e particulares, o local e suas circunstâncias, o tempo e suas variações, as ações e suas significações, os conflitos e a sintonia de relações interpessoais e sociais, e as atitudes e os comportamentos diante da realidade (CHIZZOTTI, 2006, p. 90). Assim, a observação não pode ser tratada como algo superficial. Ela requer sensibilidade, objetividade, olhar atento e cuidadoso do investigador a fim de obter todas as informações necessárias à investigação. “Diferente das percepções cotidianas, não intencionais (espontâneas) e passivas, compreende uma busca deliberada, levada a efeito com cautela e predeterminação” (GRESSLER, 2004, p. 169). Sendo assim, é necessário, por parte do investigador, manter o foco da pesquisa, atentando para os objetivos e as questões, a fim de as observações constituírem importante instrumento na coleta precisa dos dados. Tendo em vista essa perspectiva, observei tanto as aulas da professora de Educação Física nas três turmas de quinto ano em que ela trabalha, quanto o envolvimento e participação dos alunos nos conteúdos trabalhados, na construção das regras e, principalmente, como são tratados os conflitos e violências na sala de aula e/ou quadra ou pátio da escola. 35 O registro dos dados obtidos através das observações foram feitos através de anotações no diário de campo, descrevendo os detalhes observados, as falas, as reações, os gestos, as impressões. 1.8.2 Entrevista semiestruturada A partir da realidade observada e com a finalidade de obter mais informações que viabilizassem a compreensão do todo indagado, foi necessária a utilização da entrevista semi- estruturada (com a professora). Lüdke e André (1986, p. 34) afirmam que a entrevista semi- estruturada “se desenrola a partir de um esquema básico, porém não aplicado rigidamente”. Além disso, [...] Na entrevista a relação que se cria é de interação, havendo uma atmosfera de influência recíproca entre quem pergunta e quem responde. Especialmente nas entrevistas não totalmente estruturadas, onde não há a imposição de uma ordem rígida de questões, o entrevistado discorre sobre o tema proposto com base nas informações que ele detém e que no fundo são a verdadeira razão da entrevista. Na medida em que houver um clima de estímulo e de aceitação mútua, as informações fluirão de maneira notável e autêntica (LÜDKE; ANDRÉ, 1986, p. 33-34). A escolha pelo uso da entrevista semi-estruturada se deu pela capacidade que este tipo de entrevista tem de estabelecer uma relação dinâmica entre o interlocutor, a temática e o investigador. O caráter flexível da entrevista semi-estruturada possibilita que o informante expresse-se de forma descontraída e esclareça suas dúvidas quanto à formulação das questões, permite também que o investigador acrescente, retire ou modifique a ordem destas em prol da agregação de novos elementos que surgirem se considerados pertinentes. A entrevista incluiu sete questões acerca dos dados de identificação da professora. Elas contemplaram ideias relacionadas à sua formação e às suas memórias das aulas de Educação Física enquanto aluna dos anos iniciais. Quanto à temática, foram dez questões dissertativas que orientaram a investigação. Estas incluíram as problematizações acerca do enfrentamento às violências e aos conflitos durante as atividades desta disciplina na escola e sobre a relação pedagógica estabelecida entre a professora e as turmas. 36 1.8.3 Questionário Foram realizadas treze questões objetivas para possibilitar maior detalhamento sobre a temática no questionário com a professora. Essas questões complementam e esclarecem ainda mais as questões da entrevista semiestruturada. Com os alunos utilizei o questionário, por ser grande o número de participantes (três turmas) e também pela possibilidade deste instrumento ser constituído não só de questões fechadas, mas também de questões abertas. Isso facilita a expressão dos informantes nas respostas, podendo ampliar o foco e, quiçá, contemplar algum elemento não pensado pelo pesquisador e que virá a contribuir na investigação. Alguns alunos tiveram um pouco de dificuldade ao responder o questionário. Como tínhamos bastante tempo e era o meu último dia de observação, pude esclarecer todas as dúvidas e atendê-los individualmente. O questionário foi composto de quatorze questões dissertativas e três questões objetivas e contemplou questões acerca das relações interpessoais, dos encaminhamentos feitos às situações de violências e de conflitos, dos sentimentos emergentes na relação pedagógica, do estabelecimento das regras e sobre as aprendizagens na disciplina de Educação Física. Desse modo, oportunizou-se a todos os estudantes falar sobre como e por quem as violências e os conflitos são “resolvidos”. Eles puderam sugerir, segundo seu entendimento, como poderiam ser problematizadas estas questões. As questões apontadas pelos alunos permitiram refletir sobre como e por quem são gerados os conflitos e as violências. 1.9 Técnica de análise de dados Inicialmente, foi realizada a leitura de todos os dados coletados na entrevista, no questionário e nas observações in loco. Em seguida, foram feitas as relações entre os dados coletados e as questões propostas neste estudo. Lüdke e André (1986) enfatizam que “analisar os dados qualitativos significa “trabalhar” todo o material obtido durante a pesquisa” (p. 45). Dessa forma, devem ser considerados as anotações do diário de campo obtidas na observação, a entrevista, as análises dos questionários, os relatos e as demais informações disponíveis. Nesse sentido, 37 [...] O entrevistador precisa estar atento não apenas (e não rigidamente, sobretudo) ao roteiro pré-estabelecido e às respostas verbais que vai obtendo ao longo da interação. Há toda uma gama de gestos, expressões, entonações, sinais não - verbais, hesitações, alterações de ritmo, enfim, toda uma comunicação não verbal cuja captação é muito importante para a compreensão e a validação do que foi efetivamente dito. Não é possível aceitar plena e simplesmente o discurso verbalizado como expressão da verdade ou mesmo do que pensa ou sente o entrevistado. É preciso analisar e interpretar esse discurso à luz de toda aquela linguagem mais geral e depois confrontá-la com outras informações da pesquisa e dados sobre o informante (LÜDKE; ANDRÉ, 1986, p. 36). Segundo Lüdke e André (1986, p. 34), “é preciso que a análise não se restrinja ao que está explícito no material, mas procure ir mais a fundo, desvelando mensagens implícitas, dimensões contraditórias e temas sistematicamente ´silenciados´”. A partir dessas reflexões, dialoguei com as categorias elencadas na pesquisa (condicionantes da relação pedagógica), a fim de descobrir como a docente resolve as questões de conflitos e de violências na sua disciplina e quais as resoluções frente às mesmas: resoluções por terceiros? Resoluções pela ética e pelo diálogo? Resoluções por castigos e punições? 2 A RELAÇÃO PEDAGÓGICA E AS VIOLÊNCIAS NA ESCOLA No que se refere à relação pedagógica, o capítulo está fundamentado nos escritos de Estrela (1994), que problematiza a relação pedagógica e seus condicionantes, na obra Relação Pedagógica, disciplina e indisciplina na aula. Para discutir as violências na escola, dialogamos principalmente com o coletivo de autores da obra Escola, conflitos e violências (2008), organizada pelos professores doutores Jorge Luiz da Cunha e Lúcia Salete Celich Dani, ambos da Universidade Federal de Santa Maria. Neste capítulo, será reservado um espaço ao debate sobre os encaminhamentos dados, geralmente, pelos professores, às situações de conflitos e de violências. Além disso, serão apresentadas algumas pesquisas relacionadas. 2.1 A relação pedagógica A expressão relação pedagógica advém do encontro das palavras relação e pedagogia. A palavra relação tem origem no latim (relatio onis) e foi acumulando diversas significações: “narração, relato de inventos, conexão, ligação; contacto; comércio; trato, frequentação; conhecimento” (ESTRELA, 1994, p. 29). A palavra pedagogia tem origem na Grécia antiga, paidós (criança) e agogé (condução). Estrela (1994) ressalta que “o pedagogo era [...] o escravo que acompanhava a criança à escola, tendo-se tornado, com a evolução dos costumes, o repetidor das lições e o mestre de boas maneiras” (p. 31). Para Estrela (1994), embora o termo relação pedagógica venha comportando diversas significações, “é, portanto, o adjetivo pedagógico que constitui a diferença específica que permite distinguir a relação pedagógica de qualquer outro tipo de relação humana em geral e da relação educativa em especial” (p. 29-30). A relação pedagógica é o contato interpessoal que se gera entre os intervenientes de uma situação pedagógica e o resultado desses contatos. Num sentido lato, a relação pedagógica abrange todos os intervenientes diretos e indiretos do processo pedagógico: aluno-professor, professor-professor, professor-“staff”, aluno- funcionários, professores-pais... Num sentido restrito, abrange a relação professor- aluno e aluno-aluno dentro de situações pedagógicas (ESTRELA, 1994, p. 32). 40 Partindo deste conceito de relação pedagógica, constatamos que o professor, ao ministrar aulas aos seus alunos, interage com eles e, nessa interação, estabelece uma relação social com os mesmos. Essa relação é de fundamental importância em todos os níveis educacionais, pois A sala de aula implica fundamentalmente a relação professor-aluno, relação essa sobredeterminante em relação às demais no interior da escola. Dentro dela (sala de aula), só o professor e seus alunos vivenciam, em tempo parcial e determinado, a complexa trama da existência humana, encaminhados que são por um tipo de fenômeno educativo, o escolar. E assim sucede em cada professor e seus alunos, sem que uns e outros deem conta de suas respectivas vivências, a não ser de um modo abstrato. Quando isso ocorre, ensaiam-se teorizações para a sala de aula, o que sempre apresenta limites e, portanto, desafios, tendo em vista o caráter vivencial da relação professor-aluno (ARAÚJO, 1986, p. 41). Trigo (1986, p. 80) ressalta que a escola pode construir relacionamentos humanos profundos, integrais e duradouros. Relacionamentos que envolvam a pessoa humana em toda a sua potencialidade, em sua riqueza de experiências, que propiciem o enriquecimento mútuo e o crescimento dentro de suas paredes, entre professores e alunos ou entre os colegas A problematização dos conflitos possibilita a construção de relações interpessoais positivas, promotoras de amizade e de confiança, sentimentos necessários entre professores e alunos. É através da comunicação que se estabelece a relação pedagógica, sendo os dois aspectos indissociáveis. No entanto, por um artifício de análise e por razões didáticas, distinguimos a comunicação da relação, reservando à relação aspectos afetivos da comunicação. Assim, se pensarmos nos vários atos de ensino, verificamos que atos, como elogiar, encorajar, admoestar, criticar, ameaçar transmitem fortes cargas afetivas para além da informação objetiva que eles veiculam. São esses atos que contribuem de um modo especial para a criação de um certo ambiente na turma que terá incidência nos planos da aprendizagem e do comportamento dos alunos, permitindo simultaneamente caracterizar os estilos de comunicação do professor (ESTRELA, 1994, p. 57). Segundo Estrela (1994), a afetividade (ou a falta dela) na comunicação do professor com os alunos tem fortes influências na aprendizagem e no comportamento destes. Portanto, a afetividade na relação pedagógica é de grande relevância também para a resolução dos conflitos e das violências que emergem na sala de aula. “Se o vínculo afetivo não está minimamente garantido em sala de aula, é muito difícil que o trabalho flua” (VASCONCELLOS, 1995, p. 91). Estrela (1994, p. 41) afirma ainda que “a relação pedagógica tem de se basear no respeito pela pessoa, pois só esse respeito evita a chantagem afetiva e defende a pessoa. É 41 mais fácil amar o aluno do que respeitá-lo”. Nesse sentido, Tognetta e Vinha (2008) chamam a atenção sobre o tipo de afetividade que o educador precisa ter para com os alunos. Para elas, a verdadeira afetividade precisa ser demonstrada através de uma competência profissional e da capacidade do professor em elaborar atividades nas quais oportunizem a comunicação e a expressão dos alunos sobre si mesmos. Temos insistentemente proposto que a escola possa se abrir ao tema da afetividade, não com cuidados e carinhos, ações equivocadas por parte de quem educa muitas vezes permissivamente, mas com atividades e propostas que permitam que meninos e meninas possam construir o valor de si, falando sobre si mesmos (TOGNETTA; VINHA, 2008, p. 233). Desse modo, ao se construírem, na escola, espaços para atividades que incluam os sentimentos dos meninos e das meninas proporcionar-se-ão vivências baseadas no respeito mútuo. Nesse sentido, quando o educador possui a clareza da necessidade de sensibilizar e sensibilizar-se quanto aos sentimentos dos educandos, sua prática é diferenciada. Além disso, é importante que ele tenha domínio do conteúdo, aproprie-se do conhecimento e de estratégias eficazes para a sua transmissão, pois a sua intervenção influenciará em diversos aspectos que contribuem para o desenvolvimento moral do aluno. Construir uma relação pedagógica baseada na confiança, no respeito mútuo, na reciprocidade, auxiliará as crianças a desenvolverem uma imagem positiva de si e de seus parceiros. Esta auto-estima desenvolvida na classe reduzirá grandemente a presença de conflitos negativos e em extensão, minimizará comportamentos violentos e impróprios entre colegas, pois tudo isso contribuirá para um clima de moralidade na classe. Sastre e Moreno (2005) ressaltam que “as emoções e os sentimentos raramente constituem um objeto de reflexão no âmbito escolar, como se seu conhecimento fosse ou inato ou desnecessário” (p. 69). Muitas pesquisas apontam para o fato de os professores não se sentirem preparados para lidar com questões que fujam ao domínio da “sua área”, que estejam além do domínio dos conhecimentos técnicos e científicos, considerados por alguns deles, necessários para “dar uma boa aula”. A formação de bons profissionais depende unicamente de sua formação intelectual? É evidente que nisso desempenham um papel muito importante – talvez determinante – as atitudes pessoais, os sentimentos como autoconfiança, a capacidade de relação interpessoal e a capacidade de administrar as emoções e de resolver os conflitos que se apresentam, com freqüência, nos grupos humanos (SASTRE; MORENO, 2005, p. 68). 42 Partindo da importante colocação das autoras de que as emoções e os sentimentos não são satisfatoriamente trabalhados nas escolas, percebemos de onde vem a pouca ou falta de sensibilidade para com os sentimentos do outro e, ao mesmo tempo, a espontaneidade para o surgimento das tensões entre os alunos. A formação focada apenas para o intelecto e o cognitivo acaba por reforçar uma relação pedagógica deficitária naquilo que é próprio do humano: os sentimentos. [...] É importante que as crianças aprendam que seus sentimentos são importantes e que elas precisam transformá-los em palavras para que o outro saiba e possam também tomar consciência do que não podem fazer. Por isso dizemos às crianças: “diga-lhe com palavras como está se sentindo. Diga-lhe se gostou do que aconteceu”. Quando ajudamos as crianças a manifestar o que sentem, elas tendem a tornar-se autoconfiantes (TOGNETTA; VINHA, 2008, p. 237). Desse modo, é imprescindível uma educação com vistas ao acolhimento dos sentimentos. Para tanto, será necessária uma relação pedagógica pautada em atividades que possibilitem o conhecimento do outro e também de si próprio. Por isso, as atividades que temos proposto são aquelas em que as crianças e adolescentes são convidadas a falar sobre si, sobre suas angústias, seus medos, suas raivas, ou seja, falar daquilo que é mais seu (o que é mais ‘nosso’ do que o que pensamos ou sentimos?). Por certo, parte-se do princípio de que é controlar, dominar, entender aquilo que se conhece. Por isso, o autoconhecimento é tão necessário (TOGNETTA; VINHA, 2008, p. 234). Atividades planejadas com a finalidade de conhecimento e autoconhecimento, ou seja, a oportunidade de a criança expressar-se oralmente, expor suas incertezas, discorrer sobre os seus sentimentos e sobre as suas emoções, é um exercício de introspecção fundamental aos estudantes. Deste exercício resultará um sentimento de segurança e de otimismo, essencial para a relação pedagógica: a confiança. Numa relação de confiança com as crianças, é preciso que perguntemos: “Como é que eu posso te ajudar?”, “Diga-me, vamos pensar juntos, o que nós podemos fazer para resolver essa situação?”. Assim, auxiliamos os envolvidos na violência a encontrar caminhos para a superação do problema e os respeitamos efetivamente (TOGNETTA; VINHA, 2008, p. 236). Sendo assim, nossas atribuições como educadores são muito grandes. No exercício da nossa função, influenciamos comportamentos, formamos opiniões, trabalhamos com vidas. 43 2.1.1 O saber O saber também é determinante nas funções e nos diferentes papéis desempenhados pela escola e por seus componentes. Muito além de trabalhar conteúdos técnicos e científicos, o saber também irá balizar comportamentos, influenciar condutas, hábitos e atitudes tanto dos alunos quanto dos professores. Então, o professor será o mediador no processo de aquisição de conhecimento e na “transmissão” de saberes. Para tanto, é necessário um novo perfil de professor. Para Estrela (1994), este deve ser dinâmico e interventor, que em nada se compadece com o perfil do professor rotineiro e acomodado a uma função de transmissão do saber cuja utilidade ele põe muitas vezes em causa (1994, p. 35). O desenvolvimento da autonomia dos alunos dependerá, entre outros fatores, da maneira como o professor seleciona e organiza os conteúdos e as atividades na aula. Por isso, É preciso enfatizar a necessidade de priorizar a capacidade de desenvolvimento da capacidade dos alunos de transferirem conhecimentos, buscarem autonomamente conhecimentos novos e de estabelecerem relações com os já construídos. Essas capacidades dependerão da seleção e da forma como forem desenvolvidos os conteúdos e as atividades escolares (XAVIER, 2008, p. 90). O professor criativo precisa, obrigatoriamente, utilizar metodologias que auxiliem na educação do pensar, ou seja, na construção/reconstrução dos conhecimentos. Através da problematização de saberes já conhecidos pelos alunos, o professor poderá possibilitar a produção de novos conhecimentos e novos sentidos. Este é um dos significados políticos da educação escolar: socializar não somente os conhecimentos já dominados pela humanidade, mas também, e principalmente, socializar os meios de produção de conhecimentos novos, que aqui são chamados de novos porque são pensados novamente. É uma educação para pensar. Se o professor conseguir instituir na sala de aula esse processo complexo de elaboração coletiva de uma nova síntese a partir das categorias simples do conhecimento sistematizado, então estará produzindo conhecimento com seus alunos (WACHOWICZ, 2009, p.80). Wachowicz (2009) ressalta que o trabalho da escola é formar a atitude de aprender, atitude esta que, uma vez consolidada, fará com que o aluno prossiga sua caminhada como um sujeito que faz história e não apenas é feito por ela. Ou melhor, será um sujeito da História, o que significa que faz enquanto se faz (p.109). 44 Do contrário, a escola estará reforçando o desenvolvimento de personalidades morais heterônomas, acríticas, dependentes, reprodutoras de conhecimentos e conformadas com a realidade posta sem manifestar o desejo de transformá-la e de transformar-se. O desafio que permanece, [...] é aquela busca de: como encaminhar atividades que satisfaçam a sede de conhecimento e, ao mesmo tempo, desenvolvam a capacidade de conhecimento crítico. Conhecimento crítico aqui entendido como postura crítica, capaz de assumir e transformar esse mundo. Postura crítica que não faça da criança apenas um ser dócil, facilmente “levado” com açúcar e afeto, completamente obediente ao adulto, ao programa pré-estabelecido pelos planejamentos escolares (COSTA, 1986, p. 103). A capacidade de criticidade, reflexão e autonomia não são construídas por qualquer conhecimento. Pelo contrário, desenvolvem-se a partir de um saber que tem uma intencionalidade, um objetivo e um planejamento. Segundo Estrela (1994), O saber que é objeto de transmissão intencional não é um saber qualquer, mas um saber que uma dada sociedade considera útil para a sua preservação e consecução dos seus fins. Trata-se, portanto, de um saber socialmente determinado quer nos seus conteúdos, quer nas formas consideradas válidas da sua transmissão, quer ainda nas condições estipuladas para o seu acesso e utilização (ESTRELA, 1994p. 33). Vasconcellos (1995, p. 61) lembra que “não podemos perder de vista que a construção do conhecimento em sala de aula necessita da construção da pessoa e esta depende da construção do coletivo, base de toda a construção” (p. 61). Nesse sentido é pertinente “criar em sala de aula um clima hegemônico de respeito e interação entre si e com objeto de conhecimento” (p. 61). 2.1.2 As atividades Para Estrela (1994, p. 40), “as atividades e os recursos que as tornam possíveis são outros condicionantes gerais da relação pedagógica, pois delas depende a dinâmica relacional criada na turma”. A frequência e o tipo de contatos estabelecidos na relação pedagógica variam, pois Em função do tipo de atividade na medida em que elas postulam sistemas de comunicação mais formais ou menos formais, partilha diferente de responsabilidades entre o professor e os alunos, forma diferentes de exercícios de autoridade, de disciplina e de controle (ESTRELA, 1994, p. 40). 45 Para Garcia e Puig (2010, p. 131-132), o conjunto de atividades e dinâmicas de trabalho, o tratamento de temas e conteúdos trabalhados em cada classe têm efeitos muito significativos na formação dos alunos, sendo um núcleo importante na definição da cultura moral da escola. Acreditamos na organização das atividades como fator importante da relação pedagógica. Se o espaço educativo for constituído de imposições e de respeito unilateral, a relação será de coação. No entanto, se a atividade favorecer a relação permeada pelo respeito mútuo, pela reciprocidade, pela tolerância e pela solidariedade, podemos dizer que é uma relação de cooperação. Na forma como são propostas as atividades, como é organizada a disciplina, como é controlado o tempo, como é distribuído e controlado o espaço onde as tarefas serão realizadas pelas crianças, está também implícita a maneira como a professora apresenta e trabalha o elemento conhecimento: uma mera informação a ser copiada ou um processo de tornar próprio o alheio, provocando assim sentimentos de cooperação, respeito mútuo, moral autônoma, ou então, coação, respeito unilateral e moral heterônoma (DANI, 1996, p. 104). Os professores organizam e dirigem o espaço onde a criança passa a maior parte do seu dia. Portanto, não podemos esquecer as atividades pensadas com a finalidade de socializar e interagir com a turma, estimulando o diálogo e a comunicação. Assis (2003, p. 200), afirma que “não é possível propiciar a atividade intelectual, baseada na atividade individual espontânea, sem o intercâmbio das crianças entre si e com a professora”. Cabe ao educador a responsabilidade de estimular, abrir as portas em direção aos campos que as crianças queiram explorar e conhecer. Cabe-lhe também a responsabilidade de criar as situações propícias para que a criança seja capaz de iniciar a atividade, perseverar nelas até concluí-las e sentir prazer em realizá-las (ASSIS, 2003, p. 167). Contudo, não são apenas as metodologias e as técnicas que garantem a eficácia da atividade. Nash (1968) sugere que “oportunidades para que a criança participe ativamente do planejamento e da execução de seu programa escolar levá-la-ão a empenhar-se ainda mais, e em decorrência, a disciplinar-se” (p. 287). Por tudo isso, a responsabilidade do professor é muito grande. Para contemplar atividades que atinjam os alunos e realmente os desafiem a avançar no processo educativo é preciso muito conhecimento e comprometimento com a prática pedagógica. É imprescindível que o educador tenha conhecimentos sobre a psicologia da criança, o que é próprio para cada 46 fase, saber que cada criança tem seu tempo e ritmo próprios. Ela necessita ter sua criatividade estimulada por atividades que exercitem sua capacidade de pensar, mas também do prazer em realizá-las. O prazer em participar das atividades propostas pelo professor virá dos desafios que as atividades lhe propõem. A atividade que estimula a aprendizagem é aquela planejada de acordo com o interesse, a necessidade e a faixa etária da criança. É aquela que surpreende com algo novo, que promove um avanço, inclusive, no entendimento das regras. Do contrário, será mera repetição mecânica que provavelmente leve ao desinteresse e às resistências. 2.1.3 As regras Além do conhecimento (saber) e das atividades, ressaltamos também que as regras são um fator importante, pois é um recurso que viabiliza as atividades. Portanto, a consideramos um condicionante da relação pedagógica. A forma como são construídas as regras, por quem são construídas e a definição de suas finalidades irão influenciar no tipo de relação pedagógica estabelecida em sala de aula. Afinal, estes acordos feitos entre professores e alunos irão balizar os comportamentos de ambos e também conduzir a relação pedagógica. As situações de conflitos muitas vezes são consequências de regras incoerentes e inadequadas, cujas finalidades são desconhecidas pelos estudantes, ou, tampouco, foram construídas com eles, mas para eles. Portanto, os conflitos presentes na relação pedagógica passam também pela construção das regras e dos limites. Nesse sentido, os alunos precisam entender claramente os motivos da criação das regras e suas finalidades para que sejam efetivamente vivenciadas. Para Estrela (1994, p. 44), “uma vez que professores e alunos têm interpretações diferentes das normas que regulam as suas relações, a definição dos papéis acaba por ser eminentemente pessoal, o que pode explicar os conflitos que por vezes surgem. Portanto, é necessário que as regras que regem a sala de aula sejam claras o suficiente para todos as compreenderem. Além disso, precisam ser coerentes e ter uma razão para serem estabelecidas. A forma como as regras de comportamento são expostas aos alunos revelará a identidade da escola, os valores nos quais acreditam, o projeto político pedagógico, a estrutura do regimento interno, entre outras características. 47 As regras de comportamento dos alunos que o professor institui ou leva os alunos a instituírem têm, pois, como pano de fundo um referencial normativo e axiológico que traduz não só a interpretação pessoal que cada professor faz das normas e valores veiculados pelo sistema educativo, das normas e valores próprios do estabelecimento escolar e do seu projeto educativo, como a interpretação que ele faz da ética profissional (ESTRELA, 1994, p. 116). Estrela (1994, p. 118)) afirma que, apesar do discurso liberalizante sobre as regras da aula, continua-se a observar o predomínio daquelas que constituíram o pilar da pedagogia tradicional: o aluno deve estar calado, quieto, atento e ser obediente e respeitador. Neste caso, poderíamos refletir para que e para quem são feitas as regras? Seriam elaboradas para facilitar o “domínio de turma” pelo professor? Ou quem sabe para manter a “ordem” e a “disciplina” na aula? Por outro lado, aprenderia mais o aluno que permanece calado, quieto, imóvel em sua cadeira? Garcia e Puig (2010) confirmam a ideia de que “as experiências educativas que defendem a participação dos alunos na vida escolar questionam o papel que costuma ser conferido aos jovens: escutar e obedecer” (p. 88). As regras desempenham, portanto, uma função pedagógica específica que não pode confundir-se com a sua função social de ordem geral. Embora limitadas por padrões gerais de conduta social e impregnadas de um conteúdo ético de origem social, as regras pedagógicas subordinam-se aos fins do processo pedagógico e da produção que ele pretende gerar e são relativas às situações criadas em função de determinados modelos de intervenção pedagógica (ESTRELA, 1994, p. 51). Sendo assim, será importante refletir sobre o papel que as regras desempenham em relação aos conflitos e as violências na escola e também como elas intervêm na relação pedagógica. Quem determina quem? Será que a relação pedagógica vai determinar o tipo de regras que regem a sala de aula ou será que as regras determinarão as relações pedagógicas? E os conflitos e as violências seriam motivados por regras impostas, unilaterais e incoerentes? Ou, ao contrário, as regras elaboradas pelo coletivo, justificadas, adequadas e feitas “para todos” evitariam as violências, resistências e agressividades? Não podemos discordar, no entanto, de que as regras justas e bem definidas são essenciais na relação pedagógica, para a construção do respeito ao outro, para a disciplina. Quando discutidas com o grande grupo e problematizadas, são significativas para a construção de relações interpessoais positivas e de um ambiente educativo harmônico e propício a aprendizagens, principalmente para a aprendizagem de valores éticos e morais. Tognetta e Vinha (2008) salientam que nossos alunos precisam enxergar a necessidade da existência de uma regra para que vejam a incidência de um valor, para que, assim, possam 48 respeitá-la. As autoras também ressaltam que além do processo de construção e respeito às regras, elas também necessitam ser interiorizadas. La Taille (1996, p. 16), clarifica que, na teoria de Piaget, a “interiorização” das regras corresponde a uma assimilação racional destas (portanto crítica) e a uma nova exigência moral: a reciprocidade, a respeitar e ser respeitado. Para atingir o objetivo de formar simultaneamente consciências livres e indivíduos respeitadores dos direitos e liberdades de outrem, o clima em sala de aula deverá ser livre de pressões e coerções, sem ansiedade, sem gritos e regulado por princípios e regras acordados entre todos os integrantes do grupo (SCRIPTORI, 2008, p. 26). Ao permitir que a criança participe da construção das regras está sendo oportunizado a ela o desenvolvimento da autonomia moral, da criticidade e da sociabilidade. De Vries e Zan (2003) afirmam que “convidar as crianças a tomarem decisões e fazerem algumas regras é uma maneira de o professor reduzir sua autoridade de adulto e promover a autorregulação nas crianças” (p. 221). A participação das crianças nesse processo de discussão e elaboração das regras de convivência, dentro de um contexto situacional, faz com que aquelas se tornem responsáveis por estas, permitindo a emergência do exercício democrático e minimizando as soluções de violência, embora não impeçam a ocorrência de conflitos. Nas situações banais do cotidiano, ocorrem inúmeras situações de conflito entre os escolares. Mais importante que impedir a ocorrência desses eventos é administrá-los, mediante uma intervenção que tenha por objetivo ajudar os envolvidos a compreenderem as razões pelas quais aquilo está ocorrendo e quais as possíveis soluções para o caso em questão. Os estudos psicogenéticos piagetianos nos levam a inferir que, para agir dessa maneira, é preciso colocar-se na atitude mental dos envolvidos e entender seus pontos de vista, suas dificuldades e seus sentimentos para poder levar a situação a bom termo (SCRIPTORI, 2008, p. 24). Sendo assim, as regras, para serem efetivamente reguladoras da convivência social, precisam ser elaboradas de forma clara e também precisam ser interiorizadas de modo a serem veiculadoras do respeito mútuo, da reciprocidade e da cooperação. Além disso, através da construção coletiva das regras, o aluno terá visibilidade frente ao professor e demais colegas, retirando-o do anonimato e valorizando a sua participação, não apenas como mero espectador. Das coisas que mais infernizam crianças e adolescentes é terem que viver e atuar num espaço anônimo. A insuficiência de normas claras instala-lhes o caos no cotidiano. É importante termos claro, neste caso, que há duas coisas muito imprescindíveis: a) que ambos, crianças e adolescentes (sobretudo estes últimos), participem do estabelecimento das normas que devem reger suas vidas; b) que também ambos nunca vejam as normas serem cultuadas como fins, acima do pessoal, mas como meios para o crescimento humano. Coisa perfeitamente 49 constatável é o fato de que os educandos amam e admiram as pessoas firmes – o que nem de longe significa pessoas autoritárias; no entanto, nutrem claro menosprezo pelos pusilânimes e os fracos (MORAIS, 1995, p. 50-51). Crianças e adolescentes percebem facilmente quando existem fragilidades naquilo que lhes é apresentado em sala de aula. Não é diferente em relação às regras. Assis (2003, p. 199) garante que, ao se determinarem os padrões de comportamento desejável para uma situação qualquer, a professora explica às crianças as razões pelas quais tais comportamentos são desejáveis deve estar sempre disposta discuti-los com as mesmas, em lugar de exigir uma obediência cega. Portanto, é essencial que, antes de organizar ou construir conjuntamente com os alunos as regras, o educador reflita consigo mesmo sobre a sua pertinência. Ter definido se estas são justas, se poderão ser modificadas e/ ou negociadas, se são coerentes será imprescindível para a aceitação pelo grupo. Na falta dessas “certezas”, o professor mostrar-se- á inseguro e desqualificado para trabalhar as normas de convivência e os alunos, percebendo esta situação, acabarão ignorando qualquer tentativa de acordo sugerida pelo professor. Apesar de todas as vantagens que a construção coletiva das regras apresenta, é preciso ter muito cuidado ao propor a elaboração destas para que não se tornem uma armadilha para o educador e uma ameaça à sua autoridade. Digo autoridade, não autoritarismo. Existem regras que não podem ser negociáveis e o professor não pode abrir mão destas, sob o risco de estar sendo negligente enquanto condutor do processo pedagógico e conhecedor do que precisa ser feito na sua regência. É necessário fazer uma ressalva sobre a elaboração das normas na escola. É comum os educadores acreditarem que tudo deve ser combinado, discutido, negociável. Aquilo que o grupo de crianças decide deve ser aceito, porque “partiu da classe”. Entretanto, é preciso esclarecer que nem tudo se discute. Há determinadas normas que não são negociáveis [...]. Considera-se que há princípios éticos que são universais, que em determinada época, quando foram formulados, foram exaustivamente debatidos. Porém, atualmente, por serem universais, não são mais discutíveis. Esses princípios como a justiça, o respeito (a si mesmo, ao outro, ao patrimônio), a igualdade e a dignidade são explicados, mas sua validade ou pertinência não são passíveis de discussão (VINHA, 2003, p. 254). Vinha (2003) ressalta ainda que a escola deve possuir princípios gerais (não negociáveis) que servirão de parâmetro para a elaboração das regras. Assim sendo, os princípios que são básicos e norteadores, não são debatidos, mas sim, explicados; já as regras, que se fundamentam nos princípios, são discutidas (contrato) (p. 254). No entanto, Vasconcellos (1995) esclarece que se deve “jogar limpo” com os alunos. Se alguma norma não está sujeita à mudança, deixar claro, não fazer jogo de “faz de conta”. 50 Estabelecer limites não arbitrários. [...] Todo sujeito humano deve ser levado a refletir sobre a legitimidade ou não das regras que lhe são colocadas (p. 87). Dois aspectos importantes a serem refletidos são: quando as regras referem-se apenas aos deveres dos alunos e quando estes são obrigadas a obedecer a elas sem a necessária compreensão das mesmas. No caso de regras impostas, fica evidente que o tipo de relação pedagógica construída na classe é baseado no respeito unilateral e no autoritarismo. Geralmente, dessa relação de poder, resultam alunos capazes de reproduzir, copiar e obedecer a ordens. Estrela (1994, p. 41) ressalta que “a relação pedagógica não se pode subtrair à violência resultante de uma imposição unilateral que, que por mais suave e sutil que seja, se assemelha mais a um ultimato do que a um contrato”. Este tipo de relação pedagógica inibe a construção do senso crítico, da iniciativa, da participação, da autonomia nos alunos. Isso pode levá-los a tornarem-se seres passivos, conformados com as tarefas impostas a eles, submissos, privados da liberdade e da capacidade de pensar por si só. Além disso, a obediência cega e a falta de entendimento da necessidade e da importância das regras desfavorecem às perspectivas que as crianças criam acerca dos princípios e negociações das mesmas. Neste caso, não estará sendo possibilitado ao aluno o desenvolvimento de uma personalidade moral autônoma. Ao contrário, estará fomentando, sim, o desenvolvimento de uma personalidade moral heterônoma, estimulando um comportamento desfavorável ao crescimento pessoal e impedindo o necessário exercício do pensar, do respeito por si próprio e pelo outro. As regras, em qualquer situação, têm que preservar e propiciar ao sujeito o respeito por si próprio e pelo outro. Para estabelecer os limites em sala de aula (ou na escola), o educador vale-se das regras, que visam contribuir para a organização do ambiente de trabalho, promover a justiça, fomentar a responsabilidade por aquilo que ocorre na classe e o comprometimento de todos com os procedimentos e decisões referentes à sala de aula (VINHA, 2003, p. 252). Quando o educador organiza sua sala de aula considerando o processo coletivo de elaboração de regras (contrato), observando os princípios universais, possibilitará aos alunos o exercício do respeito mútuo, da reciprocidade e da cooperação em suas relações. 51 Por outro lado, se impostas arbitrariamente, sem o devido planejamento e visando à “docilidade e obediência” cega pelas crianças podem ser aguçadoras da violência e dos conflitos, gerando resistências e dificultando tanto a convivência quanto a aprendizagem. Salientamos, no entanto, que muitas vezes as manifestações de violências, agressividades, resistências, conflitos ou rebeldias não significam apenas a inexistência das regras. Outrossim, podem significar uma metodologia equivocada, um planejamento desinteressante, uma aula sem sentido para a vida do aluno se descontextualizada da sua realidade. Além disso, as regras que normatizam a convivência em uma sala de aula podem ser reveladoras de importantes aspectos referentes à relação pedagógica, podem revelar se a professora é referência de autoridade ou de autoritarismo. 2.2 Os conflitos e as violências na escola Não se deve confundir conflito com violência. Ambos estão relacionados entre si, mas não são sinônimos. O que caracteriza o primeiro é a interação de duas partes que têm propósitos incompatíveis, enquanto que a violência é o uso da força por uma das partes (ou por ambas) na resolução do conflito (BELMAR, 2005, p. 102). Salientamos que toda a violência é acompanhada por conflitos, mas o contrário não é verdadeiro. Importante destacar ainda que a violência, ao contrário do conflito, jamais terá um aspecto positivo, tampouco contribuirá na formação da personalidade moral autônoma das crianças. 2.2.1 Os conflitos Segundo Houaiss (2009), conflito significa “profunda falta de entendimento entre duas ou mais partes; choque, enfrentamento. Discussão acalorada; altercação. Ato, estado ou efeito de divergirem acentuadamente ou de se oporem duas ou mais coisas”. Além disso, conceitua conflito também como “ocorrência concomitante de exigências, impulsos ou tendências antagônicas e mutuamente excludentes, e o estado daí decorrente” (p. 520). Belmar (2005) abordou o conflito num sentido mais amplo e profundo. Para ele, O conflito é um processo natural da sociedade e um fenômeno necessário para a vida humana, podendo ser um fator positivo para a mudança e o crescimento pessoal e interpessoal ou um fator negativo de destruição, dependendo da forma de regulá-lo. O conflito não é nem bom nem mau, simplesmente existe. É como uma força natural que, controlada e em sua justa e equilibrada medida, pode desenvolver a natureza, 52 produzir energia e estimular a vida e, por outro lado, quando se apresenta de forma descontrolada, pode alterar os ciclos naturais, destruir e impedir o crescimento da vida. O conflito se apresenta quando se encontram dois atores em oposição consciente, em uma situação em que se perseguem objetivos incompatíveis, o que leva a um confronto ou a uma luta (BELMAR, 2005, p. 101-102). Burguet (2005) corrobora com a idéia do autor acima citado, no sentido de que os processos de crescimento têm sua origem em situações de conflito. Para ela, “aí está a razão de valorizar positivamente o conflito quando há violência, como ferramenta de mudança, de desafio para desenvolver respostas novas e soluções criativas, e não meramente como processo patológico que tenha que se restabelecer ( p. 42). Contudo, para que o conflito tenha aspecto positivo e favoreça o crescimento pessoal e interpessoal, é necessário ter clareza da distinção entre diferença, diversidade e desigualdade como fatores que podem desencadear conflitos destrutivos. A autora faz esta distinção com propriedade. A diferença é uma realidade, não um conflito. A diversidade é um valor. Somos diferentes. Devemos perder o medo do diferente. O medo nos faz responder de forma violenta. O conflito não é por religião ou por culturas diferentes, mas por medo de ver modificados os próprios costumes e privilégios. A desigualdade é uma realidade que gera conflito e, também, violência. O conflito não surge por diferença, mas por desigualdade. Ele surge não tanto pela existência de diversidade, mas porque uma das diversidades quer impor algo à outra. Quando da diferença se faz desigualdade, surge o conflito (BURGUET, 2005, p. 42). Outro termo bastante confundido com o termo conflitos é a indisciplina. Ela não é sinônima de conflito como pensam muitos educadores. Além disso, é de extrema importância saber diferenciá-la, inclusive, do termo violências a fim de reconhecê-lo, interpretá-lo e buscar alternativas adequadas e justas em suas resoluções. Se verificarmos os sentidos que a língua portuguesa reserva para os conceitos de indisciplina, disciplina e violência, encontraremos algumas definições, tais como: “todo ato ou dito contrário à disciplina que leva à desordem, à desobediência, à rebelião” constituir-se-ia em indisciplina. A disciplina enquanto “regime de ordem imposta ou livremente consentida que convém ao funcionamento regular de uma organização (militar, escolar, etc.)”, implicaria a observância a preceitos ou normas estabelecidas. A violência, por sua vez, seria caracterizada por qualquer “ato violento que, no sentido jurídico, provocaria, pelo uso da força, um constrangimento físico ou moral”. Será que em educação poderíamos debater sobre esses conceitos, usando os mesmos sentidos? Será que a indisciplina e a violência são sempre indesejáveis, ou teríamos que considerar a ambigüidade desses termos? (GUIMARÃES, 1996, p. 73). Houaiss (2009) apresenta indisciplina apenas como “falta de disciplina; desobediência; insubordinação, rebeldia. Etim. Lat. Indisciplina, ae ‘falta de instrução, ausência de 53 disciplina’” (p. 1074). Nisso, já percebemos a diferença entre esta e o conflito, que significa, entre outras coisas, posicionamentos diferentes diante de determinadas situações. Trazendo para o contexto educativo, Estrela (1994) afirma que “o problema central da indisciplina poderá ser consideravelmente reduzido se ajudarmos os professores a tornarem-se organizadores mais eficazes da aula” (p. 87). Confirmando este argumento, Vinha (2003) enfatiza que O professor precisa sempre refletir se os indícios de indisciplina não são decorrentes de uma didática pobre e desinteressante, de uma postura (autoritária ou permissiva) ou ainda relacionados a ausência de uma boa dinâmica na classe (crianças muito tempo sentadas, esperando, sem fazer nada) (VINHA, 2003, p. 265). Na escola, indisciplina seria, então, a desobediência àquilo que está previsto em seu regimento. Por exemplo: se o uso de boné e de celular dentro da sala de aula é proibido, segundo o regimento da escola e o aluno ignora esta norma e transgride-a, está sendo indisciplinado. “Assim, temos que a indisciplina escolar se expande num intervalo de variabilidade que bem pode ir do não querer emprestar a borracha ao colega até o extremo de falar quando não foi solicitado, passando, é claro, pela conhecida resistência sentar-se “adequadamente” na carteira” (LAJONQUIÈRE, 1996, p. 25). Guimarães (1996) questiona: “Como encontrarmos um equilíbrio entre os interesses dos alunos e as exigências da instituição? É preciso deixar de acreditar que paz signifique ausência de todo conflito” (p. 81). O que mais chama a atenção é a forma como, em geral, os conflitos são resolvidos por essas instituições, pois, pelo processo utilizado para evitar que ocorram ou para solucioná-los é que compreendemos quais são as concepções que os educadores têm sobre os mesmos [...] É preciso ressaltar que os conflitos interpessoais sempre estarão presentes na escola. Não podem jamais ser encarados como ocorrências antinaturais ou atípicas (VINHA, 2003, p. 231). Destacamos que os conflitos são inerentes à condição humana e importantes ao desenvolvimento. Porém, saber administrá-los é fundamental para estes não transformarem-se em violências a partir de estratégias equivocadas em sua resolução. Com frequência, alguns problemas subjacentes, tal como a comunicação defeituosa ou as políticas ineficientes da escola, constituem a “fonte de calor” responsável pelas tensões. O enfoque de resolução de conflitos centrado na pessoa é reducionista, pois se centra, quase com exclusividade, nos conflitos da superfície. O enfoque global é muito mais compreensivo, pois se centra em todas as três dimensões do conflito: 1. Os conflitos da superfície em ebulição; 2. As tensões de relação ferventes tanto entre 54 os adultos como entre os estudantes; 3. As “fontes de calor” subjacentes do conflito (HEREDIA, 2005, p. 54). Entre os problemas que podem caracterizar as “fontes de calor” estão a falta de respeito e da não vivência de valores. Burguet (2005) ressalta que a diversidade é um valor, portanto precisa ser respeitado. A escola é um local onde encontramos diversidades culturais, sociais, étnicas, enfim, é um lugar de heterogeneidade. Diante de toda a multiculturalidade a que os alunos estão expostos, urge um trabalho de construção de valores para que haja o respeito mútuo e a aceitação do outro e das suas diferenças. Essa construção de valores será fundamental para a resolução de conflitos que surgem nas relações interpessoais, para o (re)conhecimento do outro e para o autoconhecimento. O problema situa-se na falta de preparo dos professores para lidarem com situações conflituosas, quando, na sala de aula, não estão presentes os valores necessários à boa convivência. [...] Um professor cobra de seu aluno que tire o boné em sala de aula, validando a regra da escola, mas no mesmo dia resolve o problema de uma aluna que lhe procura dizendo que a chamaram de “piranha” com uma pergunta – “Você é peixe? Então, não ligue”. O que está em jogo é exatamente esta ausência de validar o “auto- respeito” necessário ao respeito do outro. Em outras vezes, na ânsia de resolver os conflitos interpessoais e, ainda, sem compreender que esses fazem parte do conteúdo a ser trabalhado pela escola, muitos professores não compreendem a necessidade de que os problemas sejam resolvidos com “quem é de direito” e expõem crianças e adolescentes para que a classe tome o lugar de juízes que condenam (TOGNETTA; VINHA, 2008, p. 206-207). Com este sentimento de frustração e de certa “incapacidade” no enfrentamento dos conflitos, alguns professores acabam delegando a terceiros o “julgamento” do que deve ser feito. Encaminham à equipe diretiva da escola, chamam os pais, ou, o que é ainda pior, “jogam” a responsabilidade para o grupo de alunos resolverem o que fazer com os colegas envolvidos no conflito. Para Dani (2008), Nesse trabalho de enfrentamento, a pessoa utilizará sua “sensibilidade moral” e todos os procedimentos da consciência moral (juízo moral, compreensão e auto- regulação), bem como a orientação dos guias de valor (regras, normas, costumes, sociais, leis, acordos, idéias morais, instituições sociais), como forma para mediar à ação sócio-moral frente às situações de conflito moral (DANI, 2008, p. 127). Além disso, no enfrentamento dos conflitos, conforme ressalta Scriptori (2008), torna- se necessário que o educador assuma o papel de mediador. Nesse papel, são necessárias as 55 capacidades para dialogar, para ouvir com respeito os sentimentos dos envolvidos valorizando a cooperação, o respeito mútuo e autoestima positiva. Nesse sentido, o educador não pode se isentar do seu papel de articulador e mediador dos conflitos. Vinha (2003) ressalta que “as desavenças são ocorrências cotidianas em qualquer escola, exigem uma resposta por parte do educador e, com certeza, a maneira como ele lida com os conflitos (mesmo não fazendo nada), sua postura vai transmitir mensagens” (p. 248). Também é preciso estar atento, pois, “algumas vezes, a intervenção descuidada do adulto só faz com que as crianças tentem esconder o conflito” (p. 240). Para evitar que o conflito seja ocultado pelo aluno, é necessário que o educador desenvolva uma sensibilidade e uma atenção especial para todos os acontecimentos na escola, inclusive para aqueles que parecem “normais”, ou compreendidos como simples brincadeiras entre crianças. Além de saber reconhecer os conflitos, os professores precisam também aprender a lidar com eles, mantendo uma postura ética e buscando uma solução justa para todas as partes. Esta atitude minimizará o impacto do fato e talvez evite que se tornem violências. Por isso, a imprescindibilidade da figura do professor como mediador dos conflitos. Ele é alguém que dirige o processo de resolução destes, sabedor de quando precisa intervir e do que é moralmente relevante para o grupo. Sendo assim, É preciso recordar que o conflito pertence aos envolvidos, que o importante é o processo e não somente o produto final [...] A resolução pode ser adiada se for necessário, até que decidam o que fazer ou até que o conflito seja naturalmente “abandonado” (VINHA, 2003, p. 240). O que geralmente ocorre é o adulto subestimar a capacidade da criança, tolhendo sua possibilidade de desenvolver estratégias próprias para a resolução dos conflitos que pertencem a elas próprias. O sucesso da resolução está no “processo”, nas tentativas de acordo entre os colegas, nas tomadas de decisão, nas escolhas feitas por eles. Nesse sentido, a intervenção do professor é limitada a mediar o diálogo, sugerir alternativas e observar a cena. Apenas quando os envolvidos no conflito não estiverem em condições de solucioná-lo, e o educador precisa ter bom senso para reconhecer essas ocasiões, aí sim, deverá tomar outras medidas, mas sempre instrumentalizado pelo diálogo. Por meio da linguagem, é possível elaborar uma compreensão conjunta de tudo que afeta a coletividade e cada um de seus membros. Isso acontece porque a linguagem facilita a construção de soluções para os conflitos ou de projetos comuns e também porque, dialogando, cada um se sente comprometido com aqueles com quem fala (GARCIA; PUIG, 2010, p. 68). 56 Na obra As sete competências básicas para educar em valores, Garcia e Puig (2010) chamam a atenção para o fato de que favorecer a tomada de consciência sobre o valor moral do diálogo também é objeto de intervenção educativa. Além disso, trazem a ideia de que “a capacidade do adulto de gerar contraste de opiniões sobre situações cotidianas ou iniciar debates em torno de temas sociais relevantes será decisiva para instaurar o diálogo como o eixo estrutural da convivência na sala de aula” (p. 69). Para facilitar o diálogo é preciso reconhecer o protagonismo do grupo, pois dialogar consiste em abordar coletivamente questões significativas para os alunos, questões que podem ser muito controvertidas e sobre as quais se deve discutir com vontade de encontrar, juntos, a melhor compreensão. A capacidade do adulto de gerar contraste de opiniões sobre situações cotidianas ou iniciar debates em torno de temas sociais relevantes será decisiva para instaurar o diálogo como o eixo estrutural da convivência em sala de aula (GARCIA; PUIG, 2010, p. 69). O diálogo, ao facilitar a interação entre as pessoas, constitui-se como viabilizador da harmonia no ambiente escolar, pois, auxilia na resolução pacífica dos conflitos e dinamiza as relações pedagógicas. Além disso, favorece a autonomia do grupo enquanto debatedores de temas relevantes à sua realidade, dos quais são protagonistas. Essas discussões em grupo auxiliarão no encontro de alternativas para a solução de seus conflitos através de consensos e até mesmo de ideias antagônicas. O que importa é que o conflito não se agravará por muito tempo, causando tensões e ansiedades por parte de quem sofre com eles. Conflitos ocasionais acontecem comumente na vida das pessoas que vivem com intensidade. Por si mesma a vida oferece e cria situações de conflito, onde as circunstâncias e as diferentes motivações podem colocar o homem em luta consigo próprio. Dir-se-ia que o conflito psicológico passa a prejudicar a harmonia da personalidade e a lesar o equilíbrio pessoal quando atinge uma maior duração ou intensidade muito acentuada, isto é, quando o indivíduo não encontra, ou custa a encontrar as formas de ab-reagir, para solucionar a situação conflitual, para reencontrar a paz e a unidade interior (STEIN, 1969, p. 112-113). Garcia e Puig (2010) escrevem que “as relações interpessoais são imprescindíveis para o crescimento humano e moral de qualquer um” (p. 52). Morais (1995) afirma ainda que “a dignidade da pessoa só se delineia na dinâmica das relações interpessoais” (p. 99). Considerando que a construção da personalidade moral do sujeito se dá a partir da sua interação com as pessoas e com as situações, acreditamos que será a partir das inúmeras situações de desavenças, havendo a intervenção e orientação adequada por parte do educador, que as crianças vão aprendendo a substituir a imposição, barganha ou agressão pelo diálogo como instrumento no processo de resolução de conflitos (VINHA, 2003, p. 249). 57 De Vries e Zan (2003) salientam que “a interação é encorajada ao enfatizar-se a ajuda a outras crianças, fazendo-se negociações quando houver tensões e dividindo-se experiências (p. 227). Nesse sentido, a interação social entre as crianças é um fator indispensável ao desenvolvimento pleno do educando. Cabe ao professor possibilitar atividades que oportunizem a interação entre os colegas, pois a aproximação entre eles favorecerá um clima de amizade e confiança minimizando a presença de conflitos negativos. O trabalho em grupo é uma ótima alternativa para os colegas interagirem e, assim, desenvolverem o espírito de equipe, de solidariedade, de cooperação, de respeito mútuo. É dada à criança a chance de ela própria organizar seu trabalho; todos os participantes do grupo precisam entrar em um consenso, dividir tarefas, dividir espaços, obedecer às regras, esperar sua vez de falar e escutar e aceitar a opinião dos demais. Garcia e Puig (2010) sugerem, além do diálogo e do trabalho em equipe, atividades com ênfase na educação em valores, no reconhecimento do outro, na regulação da participação, das assembleias na turma e do trabalho em rede como alternativas que podem auxiliar na resolução dos conflitos e na educação para a paz. Educar para a paz e a convivência não é educar para erradicar o conflito. È impossível erradicá-lo, pois ele é um fenômeno universal inerente ao ser humano e não deve ser visto como algo negativo. [...] O que é realmente negativo é a violência com a qual são enfrentados os conflitos. Educar para a paz e a convivência é educar para a administração alternativa de conflito, é educar para desenvolver habilidades necessárias que permitam tratar os conflitos de forma não violenta (VINYAMATA, 2005, p.72). 2.2.2 As violências Os significados da palavra “violência” são inúmeros, pois o próprio reconhecimento do ato violento é definido pelos autores em condições históricas e culturais diversas (ARAÚJO, 2002, p. 15). No entanto, na sua origem, “o termo “violência” vem do latim: = violentia = ato de violentar, constrangimento físico ou moral, ao qual se pode acrescentar a coação ou coerção psicológica” (LEVISKY, 2000, p. 27). Recorrendo a Houaiss (2009), encontrei os seguintes significados à violência: Qualidade do que é violento. Ação ou efeito de empregar força física ou intimidação moral contra; ato violento [...]. Força súbita que se faz sentir com intensidade; fúria, veemência. Constrangimento físico ou moral exercido sobre alguém, para obrigá-lo a submeter-se à vontade de outrem; coação. Cerceamento do direito e da justiça; 58 coação, opressão, tirania. Etim. Lat. Violentia, ae ‘violência impetuosidade’ (HOUAISS, 2009, p. 1948). Segundo Morais (1995), “a violência é um vocábulo polissêmico, dotado da complexidade de sentidos” (p. 44). Maya (2005) apresenta o conceito de violência, ampliando-o e trazendo alguns elementos que não foram contemplados pelos autores acima citados. Vejamos: Violência é tudo aquilo que possa representar ou significar prejuízo, produzir por efeito ou falha um mal a outro, a si mesmo ou ao meio; seja realizado consciente, seja inconscientemente [...] Para prejudicar outra pessoa já sabemos que é necessário agir, mas às vezes se conseguem resultados iguais ou superiores deixando de agir, ocultando informação, negando o auxílio ou a solidariedade, mentindo, fugindo ou adotando uma atitude passiva (MAYA 2005, p. 77). O autor trabalha o conceito agregando a omissão, no seu amplo sentido, como outra forma de violência. Barreto (1992) também afirma que, quando nos referimos à violência, é necessário distinguir diferentes graus e aspectos: ela se encontra na violência manifesta através do pensamento, passando por aquela inserida no sistema de produção das sociedades industriais e chegando à violência do crime de rua vulgarizado em sua brutalidade nas grandes concentrações urbanas do mundo contemporâneo (p. 60). Há quem acredite que as violências e suas nuances sejam fenômenos recentes. Na verdade, as violências não são um fenômeno novo. Elas sempre existiram em todos os âmbitos da nossa sociedade, inclusive na escola. Na verdade, historicamente a questão da violência na escola não é tão nova. Assim, no século XIX, houve, em certas escolas de 2 º Grau, algumas explosões violentas, sancionadas com prisão. Da mesma forma, as relações entre alunos eram frequentemente bastante grosseiras nos estabelecimentos de ensino profissional dos anos 50 ou 60. Todavia, se a violência na escola não é um fenômeno radicalmente novo, ela assume formas que, estas sim são novas” (CHARLOT, 2002, p. 432). Antigamente, as violências, de certa forma, eram praticamente naturalizadas. Basta lembrarmos os castigos físicos e as humilhações sofridas pelos alunos na maioria das escolas. Práticas, como o uso de palmatória, ajoelhar em cima de milhos, puxões de orelha, “reguada” nas mãos, eram muito comuns. Embora fossem tirânicas, essas práticas eram as tentativas utilizadas para manter a disciplina e o “domínio de turma”. Hoje, as violências continuam ocorrendo nas instituições de ensino. Porém, elas se apresentam através de novas formas, às vezes, mais sutis. Por isso, muito se tem discutido 59 sobre a necessidade de ações de enfrentamento das diferentes formas de violências ocorridas nas escolas. Infelizmente, essas novas formas de violências não estão sendo adequadamente refletidas, respeitando as devidas exceções. Grande parte dos educadores não sabe como lidar com as diversas manifestações de violências na sala de aula. Dados apresentados no relatório do projeto de pesquisa Os conflitos e os sentimentos presentes na relação pedagógica e seus entrelaçamentos na construção da personalidade moral (DANI, 2010) comprovam esta realidade. Foram preenchidos cento e cinquenta e cinco questionários por professores (as) da Educação Básica de oito municípios do estado do Rio Grande do Sul, a fim de propor uma reflexão sobre a questão das violências nas escolas. Uma das questões propostas questionava: por quem são geralmente resolvidos os conflitos envolvendo violências contra professores? Cento e sete colaboradores responderam que os conflitos são resolvidos pela direção, e setenta e quatro participantes responderam pela coordenação da escola. Olivier (2000, p. 12) afirma que “a violência frequentemente é administrada em estado bruto a uma testemunha passiva e acaba por se banalizar”. Para Araújo (2002, p. 167), a banalização da violência é preocupante, pois não se pode ver com naturalidade que um jovem acredite que um ato de violência seja somente aquele que envolva revólver e morte. Nesse sentido, apresentaremos algumas formas de violências, que não podem ser banalizadas, mas conhecidas e refletidas, quais sejam: a violência simbólica, a violência institucional (e nesta a negligência), a violência física e a violência psicológica (incluindo o bullying). Assim, pode-se definir a violência simbólica como o exercício e difusão de uma superioridade fundada em mitos, símbolos, imagens, mídia e construções sociais que discriminam, humilham, excluem. Outra possível definição é a de que se trata do estabelecimento de regras, crenças e valores que “obrigam o outro a consentir”, pela obediência, dominação ou servidão. A escola, como formadora, tem um papel fundamental na desconstrução da violência simbólica e da cultura da inferiorização de gênero, de raça, de classe social e de geração (FALEIROS, 2008, p. 33). A violência simbólica legitima e naturaliza as práticas de alguns grupos sobre outros, visto que consideram a sua “cultura” superior e inquestionável. Neste tipo de violência, o grupo dominador impõe-se ao dominado, fazendo este se sentir excluído, humilhado e inferiorizado. Existe também a violência denominada institucional, assim definida: 60 A violência institucional, que se manifesta de diferentes formas (física, psicológica e/ou sexual), se caracteriza por estar associada às condições específicas dos locais onde ocorre, como instituições de saúde, escolas, abrigos. As condições materiais das instituições também são exemplares da violência estrutural. A carência de pessoal e de equipamentos, as filas de espera, a falta de material, os horários inadequados de atendimento, a ausência de profissionais no trabalho e outras questões que conduzem ao não atendimento, ao atendimento precário e ao desrespeito dos direitos dos usuários são manifestações desse tipo de violência (FALEIROS, 2008, p. 33). Trazendo para o contexto da escola, a violência institucional seria, neste caso, a falta de professores e de funcionários, espaço físico da escola inadequado, materiais pedagógicos precários, falta de merenda e o descumprimento de horários e da carga-horária mínima exigida em lei. Existe, em nível institucional, outro tipo de violência: a negligência profissional. Sua manifestação caracteriza-se pelo desprezo (por desinteresse, despreparo ou incompetência) pelas outras formas de violência e de violação de direitos de crianças e adolescentes, ignorando os sinais de risco e a existência de processos violentos em curso que poderão levar a violências mais graves (como a sexual, por exemplo) ou até mesmo à morte (FALEIROS, 2008, p. 33). A negligência profissional implica a formação deficiente, desatualização, falta de conhecimento e de domínio de conteúdo, falta de planejamento e avaliações inadequadas. A negligência é o tipo de violência que ocorre com mais frequência. Caracterizada pela omissão, descaso, rejeição e indiferença, deixa sequelas gravíssimas e impulsiona outros tipos de violência. É importante destacar que a negligência é o “primeiro estágio” e também “fio da meada” das diferentes formas de violência praticadas contra crianças e adolescentes. Quando são protegidos, cuidados, amados e respeitados eles dificilmente serão expostos a alguma forma de violência [...]. As consequências e sequelas físicas, psicológicas e sociais da negligência sofrida na infância e na adolescência são extremamente graves, pois se configuram como ausência ou vazio de afeto, de reconhecimento, de valorização, de socialização, de direitos (filiação, convivência familiar, nacionalidade, cidadania) e de pleno desenvolvimento (FALEIROS, 2008, p. 34-35). A violência física é o tipo de violência que deixa marcas psicológicas e físicas. Dependendo da agressão, pode levar a vítima até a morte. A violência física contra crianças e adolescentes é uma relação social de poder que se manifesta nas marcas que ficam principalmente no corpo, machucando-o, causando-lhe lesões, ferimentos, fraturas, queimaduras, traumatismos, hemorragias, escoriações, lacerações, arranhões, mordidas, equimoses, convulsões, inchaços, hematomas, mutilações, desnutrição e até morte. Ela apresenta-se em diferentes graus, cuja severidade e gravidade podem ser medidas pela intensidade da força 61 física utilizada pelo agressor, pelo grau de sofrimento causado à vítima, pela gravidade dos ferimentos ocasionados, pela frequência com que é aplicada e pelas seqüelas físicas e psicológicas que provoca (FALEIROS, 2008, p. 35). Faleiros (2008) chama a atenção para o fato de que a violência física praticada contra crianças e adolescentes é uma violação dos direitos humanos universais e dos direitos peculiares à pessoa em desenvolvimento. Esses direitos estão assegurados na Constituição Brasileira, no Estatuto da Criança e do Adolescente e na Normativa Internacional (p. 35). O autor destaca ainda que, São formas de violência física: a disciplina física abusiva com fins corretivos (tapas, surras e agressões com qualquer tipo de objeto), torturas, privações físicas deliberadas (de comer e de beber), restrições de movimentos (confinamento), privação ou transferência de abrigo (expulsão do lar, colocação em outra residência, internação), trabalho forçado e inadequado à idade e desenvolvimento do vitimizado, eliminação física (assassinato) e violência sexual. Essa violência é acompanhada pelo medo, pelo terror, pela submissão, pelo espanto, pelo sofrimento psíquico, constituindo-se ao mesmo tempo em violência psicológica (FALEIROS, 2008, p. 35). Ao contrário da violência física, que deixa marcas no corpo, existe ainda a violência psicológica. Esta deixa marcas no psiquismo da vítima, destruindo sua autoimagem e afetando inclusive a sua socialização e os seus sentimentos. Como se pode perceber, a violência psicológica é tão destrutiva e traumática quanto a violência física. A violência psicológica é uma relação de poder desigual entre adultos dotados de autoridade e crianças e adolescentes dominados. Esse poder é exercido através de atitudes de mando arbitrário (“obedeça porque eu quero”), de agressões verbais, de chantagens, de regras excessivas, de ameaças (inclusive de morte), humilhações, desvalorização, estigmatização, desqualificação, rejeição, isolamento, exigência de comportamentos éticos inadequados ou acima das capacidades e de exploração econômica ou social. Essa forma de violência é muito frequente e também a menos identificada como uma violência, em função do alto grau de tolerância da nossa sociedade frente a esse tipo de abuso. Praticamente ninguém denuncia ou responsabiliza pais, parentes, professores, policiais, profissionais da saúde e da assistência, entre outros, que desqualificam ou humilham crianças e adolescentes (FALEIROS, 2008, p. 36). Trata-se, então, de uma relação opressora, onde um adulto utiliza-se do poder e do autoritarismo exercidos sobre a criança, para obter a obediência e subserviência desta. Como revelou o autor, é um tipo de violência que passa despercebida, por isso não é denunciada, tampouco seus agressores são responsabilizados. A violência psicológica situa-se no conceito geral de violência como uso ilegítimo de autoridade decorrente de uma relação de poder. Assim, no lugar de oferecer a proteção, o que é seu dever, o adulto se relaciona com a criança por meio da 62 agressão verbal ou psicológica e do domínio, substituindo e invertendo o papel que dele se espera. Essa inversão da proteção em opressão configura uma “despaternalização”, ou seja, a negação das funções sociais e pessoais dos papéis de pai e mãe, do poder familiar, muitas vezes ancorada em uma tradição autoritária da disciplina (FALEIROS, 2008, p. 37). Temos ainda o Bullying, que é um termo utilizado para descrever atos de violência física ou psicológica, intencionais e repetidos, praticados por um indivíduo ou grupo de indivíduos com o objetivo de intimidar ou agredir outro indivíduo (ou grupo de indivíduos) incapaz (es) de se defender. O termo bullying, deriva do inglês bully, que significa: brigão, valentão, tirano. Ou ainda: tiranizar, ameaçar, intimidar, maltratar (Hollaender e Sanders, 2008, p. 40). As vítimas de bullying são excluídas e maltratadas, geralmente, por alguma característica física diferente do “padrão” exigido por determinado grupo. Suas manifestações são por meio de rótulos, apelidos, gozações e zombarias. Tognetta e Vinha (2008) ressaltam que os educadores precisam atentar aos casos de bullying, “primeiro, porque não estamos acostumados a lidar com os problemas de nossos alunos que não nos afetam diretamente e, segundo, porque há um grande sofrimento de alguém em jogo” (p. 207). Dani (2009) apresenta aspectos relevantes sobre o bullying, os conflitos, os sentimentos e a violência escolar a partir de informações coletadas durante o desenvolvimento do projeto de pesquisa intitulado “Os conflitos e os sentimentos presentes na relação pedagógica e seus entrelaçamentos na construção da personalidade moral”. Os objetivos da pesquisa foram: identificar quais os sentimentos que afloraram nas situações de conflitos presentes na relação pedagógica e quais as significações que foram construídas pelas crianças envolvidas em tais situações, buscando compreender como esses elementos atuam na construção da personalidade moral autônoma. O foco central dessa investigação direcionou-se para um estudo de caso de uma turma dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental de uma escola da rede pública municipal da cidade de Santa Maria – RS, composta por 26 alunos com faixa etária entre 9 e 14 anos e a professora regente. Num período de três meses, foram realizadas observações e atividades nas quais as crianças teriam de expressar seus sentimentos em relação às situações de conflitos. Os resultados apontaram para a ideia de que a convivência baseada no conceito de agrupamento (CORTELLA; DE LA TAILLE, 2005) favorece a construção de significações que legitimam a violência nas relações interpessoais escolares. 63 Diante de toda a complexidade das violências que atingem as salas de aula, a violência da omissão do professor para com a turma é uma das mais preocupantes. Ao mesmo tempo, uma das menos discutidas, talvez menos conhecida. Passa a chamar-nos a atenção um tipo de violência que, em campo educacional, tem passado um tanto despercebido: a violência das omissões. Afinal, o professor é habilitado, admitido pela escola, autorizado pelos pais e responsáveis para intevir em vidas; de tal modo que não cabe ao mestre negar-se a fazer o que precisa fazer. E aqui não me refiro apenas a negligências e preguiças; focalizo também certas posturas do professor derivadas de curiosos modos de pensar que defendem uma liberdade que não é referenciada nem à faixa etária e nem ao caráter relativo das liberações humanas quando em confronto com conquistas que exigem disciplina – como é o caso do crescimento cultural (MORAIS, 1995, p. 47). Segundo Morais (1995), “no que respeita ao educacional, muitas vezes se é levado a atitudes omissas, seja por vias mal-intencionadas seja por caminhos de boa intenção” (p. 48). Ele busca também outros sentidos para a palavra omissão. Quando vamos ao dicionário, Aurélio Buarque de Holanda apresenta o vocábulo omissão com uma sinonímia do tipo: negligência, descuido, falta, ausência de ação, inércia etc., mas o mesmo filósofo explica um sentido para omissão que denomina de “ético-jurídico”: “Ato ou efeito de não se fazer aquilo que moral ou juridicamente se devia fazer”. Nomeado pela sociedade para preparar seus cidadãos, o professor não pode estar, na escola, como que a pedir desculpas pela sua presença; ele precisa seguramente intervir em vidas, fazendo o que moralmente se deve fazer (MORAIS, 1995, p. 48). Por compreender que é tarefa do educador “intervir em vidas”, alguns docentes buscam alternativas para lidar com as situações de tensões na escola, seja por meio da literatura específica, seja por meio de formação continuada, de participação em seminários temáticos. Eles procuram compreender melhor esse fenômeno, que, infelizmente, é corriqueiro nos espaços escolares. Por outro lado, há docentes que se acomodam e procuram apenas achar culpados para tais situações “indesejadas”. Então, aparecem como responsáveis pelo “mau” comportamento dos estudantes: a família desestruturada, a mídia, o baixo nível econômico, o desemprego dos pais, a sociedade, o governo, a má distribuição de renda, a interpretação distorcida do Estatuto da Criança e do Adolescente, entre outros motivos. Isso, quando a própria criança não é culpabilizada por ter um temperamento violento. Porém, Analisar a natureza da violência, explicitando sua dinâmica e reconhecendo os elementos ambíguos que a compõem, não significa abstraí-la de um contexto histórico e social, mas apontá-la como um fenômeno que coloca à mostra a intensidade das experiências coletivas, permitindo a manifestação das pequenas desordens da vida cotidiana. (GUIMARÃES, 1996, p. 77). 64 Nesse sentido, compreender as facetas das violências e suas ambiguidades é um desafio que se apresenta para professores e membros da equipe diretiva das escolas. Aprender a lidar com as violências e entender sua dinâmica é imprescindível. 2.2.3 Desafios para a escola Compreender as violências em suas diferentes formas é apenas um entre tantos desafios para a escola, mas, para isso, é necessário entender o contexto em que elas surgem. O chamado “fracasso” da educação brasileira faz com que a população considere esse problema, juntamente com o do salário, como o mais grave com o qual se defronta o país. Ao mesmo tempo, o aumento dos índices da violência permite prever que, em pouco tempo, o problema passará a ocupar, com a educação, o primeiro lugar na pauta das inquietações da população (BARRETO, 1992, p. 56). Diante de tal informação, ficamos atônitos. O “atraso” da educação ainda é um fator que nos preocupa. No entanto, apesar de ainda não termos “resolvido” este problema, estamos avançando, embora lentamente, no que se refere ao combate às violências na escola. Para auxiliar no combate das mesmas e para a proteção dos indivíduos, criou-se, por exemplo, o Estatuto da Criança e do Adolescente, bem como, a fiscalização dos Direitos Humanos, entre outros. Foi alterada a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (Lei de Diretrizes e Bases da educação nacional), para incluir entre as incumbências dos estabelecimentos de ensino a promoção de ambiente escolar seguro e a adoção de estratégias de prevenção e combate ao bullying. O Congresso Nacional decretou: Art. 1º O art. 12 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar acrescido do seguinte inciso IX: “Art. 12[...]. IX – promover ambiente escolar seguro, adotando estratégias de prevenção e combate a práticas de intimidação e agressão recorrentes entre os integrantes da comunidade escolar, conhecidas como bullying.” (BRASIL, 2011). O Congresso Nacional tem, ao menos, dez projetos de lei que tratam do combate ao bullying nas escolas. Entre as propostas, estão a adoção de uma política nacional de combate ao fenômeno da violência e o enquadramento do bullying como crime, punido com prisão [...]. Pela proposta, a ofensa na escola ou agressão psicológica deve ser enquadrada como crime contra honra, passível de detenção de um a seis meses e multa. [...] Se houver violência no bullying, a possibilidade da pena aumenta para detenção de três meses a um ano e multa, além 65 da pena correspondente à agressão. Se o bullying for com preconceito, causa reclusão de dois a quatro anos e multa (BRASIL, 2011). Também foram criadas outras medidas para a melhoria da qualidade da educação. Como exemplo, destacamos: os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), os Referenciais Curriculares Nacionais (RCN) para a Educação Infantil, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBN 9394/96). Essas normas garantem aos estudantes uma formação ética e moral, para, assim, promover a formação de cidadãos autônomos, críticos e reflexivos. Acredito que as contribuições advindas com este conjunto de leis sirvam para orientar novas práticas pedagógicas e quiçá, para maior reflexão entre os docentes sobre as violências na escola. Para tanto, será necessário, além de reflexão, ação por parte dos docentes, ou seja, um investimento nos conteúdos morais e na educação de valores. Quando conseguirmos ultrapassar a preocupação em somente vencer conteúdos e preparar para o mercado de trabalho, talvez consigamos nos aproximar de uma educação em valores. A violência é uma questão que precisa ser relacionada com a tradição pedagógica da escola moderna que adotamos no Brasil. Reduzimos, em grande medida, as práticas escolares ao esquema: professores que transmitem informações (a título de conteúdos disciplinares) e verificam a capacidade de reprodução dessas informações (nas avaliações de aprendizagem). Assim, formam, no transcorrer dos anos de escola, sujeitos aptos a cumprir ordens e executar tarefas, preparados para o mercado de trabalho (como mercadorias em liquidação). Pensar soluções para o problema passa necessariamente por pensar a educação, as escolas e o que fazemos nelas (CUNHA, 2008, p. 248). Enquanto os educadores concentrarem seus esforços apenas na transmissão de conteúdos técnicos e científicos para a obtenção de aprovação nos sistemas de avaliação do governo em detrimento do investimento em uma formação moral e na educação em valores com os alunos, grandes serão os prejuízos em longo prazo. “Sem descurar dos conteúdos, é possível que uma sala de aula seja a oportunidade ímpar de se ultrapassarem os conteúdos. [...] Para que serve uma sala de aula se não for capaz de nos transportar além da sala de aula?” (NOVASKI, 1986, p. 15). Nesse sentido, é importante o educador refletir sobre sua prática pedagógica e principalmente refletir sobre aquele que é (ou pelo menos deveria ser) o centro do processo: o aluno. Pensar: que aluno quero ajudar a “formar”?; para que tipo de sociedade?; qual o papel da escola na construção da cidadania?; a minha prática contribui para minimizar as 66 desigualdades e as violências na escola e fora dela?; trabalho valores como: o respeito, a reciprocidade, a solidariedade, enfatizando a importância destes para a boa convivência? Se pretendemos a escola como um lugar de acolhimento, de convivência harmônica, sem violências, precisamos “construir” um clima de amizade, de afeto, de respeito mútuo para com os nossos alunos. Disso depende o entendimento dos professores acerca dos conflitos e de alternativas para serem trabalhados a fim de não fomentarmos a violência, mas evitá-la, através de uma forma de comunicação simples, direta e efetiva: o diálogo. “Sabemos que na medida em que a palavra se torna impossível é bem provável que um ato violento se instaure” (SCRIPTORI, 2008, p. 17). Tendo em vista a importância do diálogo para minimizar e/ou evitar as violências, Garcia e Puig (2010) sistematizam o que para eles significa facilitar o diálogo. Dessa forma, abordam o diálogo em três aspectos, quais sejam: Diálogo como método: aprender a dialogar usando a prática e a experiência; Diálogo como finalidade moral: estar consciente do valor do diálogo, valorizar o diálogo como instrumento ideal para situações de controvérsia moral; A coletividade: protagonista do diálogo: considerar coletivamente as questões significativas para os membros do grupo. Além disso, No processo lingüístico do diálogo, a utilização de uma abordagem adequada é fundamental para que haja uma comunicação efetiva entre os envolvidos. As palavras utilizadas e a forma como são expressas fazem uma grande diferença nas comunicações interpessoais. [...] Assim, é importante levar em consideração a linguagem que utilizamos se quisermos fomentar a não violência (SCRIPTORI, 2008, p. 28). Sendo assim, percebemos o diálogo como importante instrumento para se educar em valores, educar-se para a paz, para a não violência. No entanto, enquanto professores, precisamos ser cuidadosos e seletivos com as nossas expressões e com a nossa linguagem a fim de não inverter o efeito desejado na emissão de nossa comunicação, que é a pacificação harmônica da situação violenta. É importante evitar palavras com duplo sentido, que podem gerar interpretação equivocada daquilo que se pretende comunicar. Além disso, usar um vocabulário adequado ao da criança e evitar palavras muito rebuscadas que dificultam o entendimento também são detalhes importantes. Encorajar a criança a falar sobre os seus sentimentos precisa ser um hábito de rotina na sala de aula. Morais (1995, p. 76) afirma que o diálogo neutralizará os autoritarismos. E, conquanto a violência esteja no profundo de nós, seres humanos em geral, como constitutivo primevo que sobrevive, a vontade de dialogar será a única coisa capaz de minimizá-la. 67 O diálogo e a expressão dos sentimentos pela criança é fundamental para que o educador a compreenda e, a partir desta compreensão, pense alternativas para solucionar as situações de violências entre os alunos. Frequentemente as crianças que sofrem violências por parte de seus colegas na escola não têm coragem de relatar o fato por medo, constrangimento, vergonha. Isso ocorre por não se sentirem preparadas ou até motivadas para falar sobre as violências ou até mesmo por não saberem reconhecê-las. Por isso, é relevante pensar sobre as seguintes questões: Deparamo-nos, frequentemente, com sentimentos de simpatia e antipatia que surgem entre as crianças. Tais sentimentos e todos aqueles, tidos como emoções, que elas expressam em seu cotidiano, as alegrias, as raivas, as tristezas, são necessários ao seu desenvolvimento moral. Expressá-los torna-se condição para a construção da autoestima e do autoconhecimento (TOGNETTA, 2003, p. 184). Os sentimentos das crianças precisam ser trabalhados pelos educadores de forma a propiciar, através da fala delas, certa sensação de alívio, de bem–estar, até mesmo de autonomia. Em consequência, a criança vai sentir mais prazer em estar na escola, vai se sentir valorizada porque é olhada e escutada atentamente. Assim, terá mais confiabilidade no professor, maior autoestima, poder de decisão e encorajamento no enfrentamento das possíveis “tensões” e violências diárias. É possível que a crise existente nas relações interpessoais venha sendo fomentada pelas violências. No entanto, algumas formas de violências têm sido geradas dentro da própria escola, a exclusão é uma delas. [...] Lembramos que a nossa tarefa é procurar entender de que forma o processo de exclusão social que ocorre no âmbito de sistema escolar contribui para o aumento da desigualdade social e para o descrédito da escola e do exercício da cidadania. (FUKUI, 1992, p. 124). Nesse sentido, Excluem-se da escola os que não conseguem aprender; excluem-se do mercado de trabalho os que não têm capacitação técnica, porque antes não aprenderam a ler, escrever e contar; e excluem-se, finalmente, do exercício da cidadania esses mesmos cidadãos porque não conhecem os valores morais e políticos que fundam a vida de uma sociedade livre, democrática e participativa. Neste ponto é que ocorre, a meu ver, a ligação entre o mundo educacional e o mundo da violência. Há como uma integração recíproca entre essas duas esferas da atividade humana que, aparentemente, estão bem distantes uma da outra. No caso brasileiro, a crise da educação vem sendo agravada pela inserção da violência em suas diversificadas formas no mundo racional da escola, derrubando os alicerces da educação, desde autoridade do professor até o abandono de exigências mínimas de aprovação dos alunos (BARRETO, 1992, p. 59-60). 68 Por tudo isso, as manifestações de violências na escola se constituem, hoje, em um dos maiores desafios para toda a comunidade escolar. Dessa forma, parafraseando Cunha (2008, p. 248), para pensar soluções para o problema das violências, é indispensável pensarmos a educação, as escolas e o que fazemos nelas (p. 248). Pensar na escola requer analisar a nossa prática pedagógica e as contribuições desta para a vida dos alunos. Indagar se esse agir docente está criando relações pedagógicas positivas ou fomentando as violências escolares reproduzindo práticas autoritárias? Refletir sobre estas questões implica necessariamente pensar no que significa educar, no seu sentido amplo. Segundo Quera (2005), “a educação, em seu sentido mais amplo, implica ir adiante de uma forma integral, ou seja, não somente intelectual, mas desenvolvendo também a parte emocional e espiritual das pessoas” (p. 133) e para Novaski (1986), “educar, etimologicamente, significa “levar de um lugar para outro” (p. 11). Espera-se que, através do diálogo e da comunicação franca entre professor e aluno, consiga-se “tirar” este do lugar de insegurança, medo, constrangimento para “levá-lo”, por meio da educação, principalmente da educação de valores, a um lugar seguro. Assim o aluno se sentirá protegido e, ao mesmo tempo, autônomo, capaz de realizar suas escolhas, consciente de seus direitos e deveres e exercer sua plena cidadania. Nesse processo de conscientização, é preciso desafiar a criança a pensar e expressar sentimentos. É preciso que os alunos pensem, [...] e, assim, possam tomar consciência dos problemas; e, por outro, é preciso que esses meninos e meninas se sintam valorizados, não pelos outros, mas por si mesmos. Para isso, precisam de relações de confiança com sua autoridade e de possibilidades de se conhecerem. (TOGNETTA; VINHA, 2008, p. 223). Tognetta e Vinha (2008) ressaltam a importância de os educadores considerarem e valorizarem a capacidade de pensar e sentir dos seus alunos à mesma medida que se valorizam os conteúdos técnicos e científicos. Nesse sentido, não pretendo negar a importância desses conteúdos. Ao contrário, o que desejo é reforçar a necessidade destes estarem permeados de conhecimentos que façam sentido aos alunos assegurando um convívio saudável entre eles. Ressalto também que ensinamentos aligeirados, “instantâneos”, provenientes de aprendizagem mecânica pouco servem para a vida do educando. Na escola são significativas as aprendizagens que auxiliam professores e alunos a lidar com as situações de violências produzidas nesse ambiente. Nisso, a ação educativa tem muito a contribuir. 69 Acredito que a ação que mais pode nos esforços contra o nosso lado de sombras das violências, essa coisa que entontece com razão o nosso tempo, é a ação educativa. Nas famílias, nas escolas, nas igrejas, nos locais de trabalho, perdeu-se muito uma antiga noção que está merecendo ser retomada: a noção de “exemplaridade”. Que os educandos encontrem vidas exemplares que os auxiliem na autoconstrução de si mesmos – eis um velho tema que corajosamente retomo, sabedor de que para muitos este é hoje um discurso à século XIX. Preocupa ver que outras características muito mais ao estilo do passado século, e que segue indevidamente marcando as idéias educacionais, passam despercebidas aos críticos aos quais acabo de aludir (MORAIS, 1995, p. 26-27). Morais (1995) ressalta a importância do resgate da noção de exemplaridade nos diversos contextos nos quais a criança está inserida. É de suma importância que os alunos encontrem nos seus professores verdadeiros “exemplos” de vida, de conduta, de ética, de dignidade. Que possam se espelhar em referenciais sólidos para a formação do seu caráter e da sua personalidade. Dani (2008) ressalta que “a construção da personalidade moral não é uma tarefa solitária que alguém realiza durante seu desenvolvimento. Todo o contexto social, cultural e histórico onde a pessoa vive contribui e influencia nesta construção (p. 127). Certamente não é somente a escola que irá influenciar a construção da personalidade da criança, mas todos os ambientes que ela frequenta: clube, igreja, entre outros. Porém, a escola é o local onde ela permanece grande parte do seu dia, da sua infância e da sua adolescência. Aí constrói conhecimentos e observa os modelos que ajudarão a constituir a sua personalidade e o seu caráter. Esses mesmos modelos poderão favorecer relações interpessoais positivas e negativas. As violências são um modelo negativo, aprendido através de imitação. Muitas vezes as violências são o único modo de “comunicação” entre crianças e adolescentes que estão acostumados a presenciar brigas e confrontos em seus lares, em sua comunidade e em sua escola. A violência que surge nas nossas escolas seria explicada porque os diferentes atores sociais estariam reproduzindo o sistema de normas e valores da comunidade em que estão inseridos e da sociedade em geral. Os alunos estão sendo socializados em antivalores, tais como a injustiça, a falta de solidariedade, os maus tratos físicos e psíquicos; em resumo, em um modelo de relações baseado na intolerância (MAYA, 2005, p. 77). Nesse caso, eles reproduzem os comportamentos que lhes são transmitidos nos diversos contextos dos quais elas fazem parte. Contextos estes, muitas vezes empobrecidos de valores morais, de ética e de respeito, elementos fundamentais para a aprendizagem de virtudes e de uma conduta digna. Surge, então, a relevância da parceria escola-família. 70 Diante dessa constatação, é relevante pensarmos no papel da família e da escola enquanto transmissores de modelos de comportamento que serão facilmente reproduzidos pelas crianças. Há que se pensar em uma efetiva aliança entre escola e família com a finalidade de adotar medidas preventivas para as violências. Desse modo, A tarefa dos pais é essencial. Gerenciando o tempo de televisão, comentando as imagens, eles ajudam a fazer a triagem, evitam que uma natural violência infantil seja reforçada, confortada por espetáculos violentos e que ultrapasse, mais tarde, o limiar da violência efetiva. Mas o trabalho da escola, que cada dia privilegia mais a comunicação, as trocas no contexto de suas próprias regras sociais, não deixa de ter o papel benéfico de um contrapoder (OLIVIER, 2000, p. 12). Nesse sentido, é pertinente a parceria escola-família, cada uma fazendo a sua parte, cumprindo o seu papel de cuidador, de transmissor de valores morais, de promotores do diálogo e de estimuladores da interação social entre as crianças. A educação das crianças não é responsabilidade somente da escola ou somente da família, mas de ambas. É importante que as duas instituições unam forças no intuito de uma complementar a outra. Com objetivos comuns, família e escola precisam trabalhar de forma integrada, visando a uma formação completa, satisfatória e que venha atender os critérios necessários ao desenvolvimento pleno da criança. No entanto, ressaltamos que o maior desafio dos educadores e da escola é a aprendizagem de que os conflitos que envolvem violências precisam ser pensados, acolhidos e resolvidos não por membros fora da escola ou pela direção. É necessário, portanto, que professores e alunos aprendam a encontrar o caminho para a resolução de conflitos. Nesse caso, é imprescindível que se estabeleça o diálogo, que se faça uma avaliação da situação levando em consideração as causas e as consequências do conflito e, principalmente, os sentimentos de todos os envolvidos. O fundamental é que a solução parta do professor e de seus alunos. Essa aprendizagem se constitui em um grande desafio. 2.2.4 Quem deve resolver os conflitos e as violências? Tendo em vista que grande parte dos professores sente-se despreparado e impotente para lidar com tais situações, deparamo-nos com este dilema: quem deve resolver os conflitos e as violências? O conflito deve ser “solucionado” pelos próprios envolvidos, mediatizados pelo professor, que é capacitado para isso (ou deveria ser!), e no local onde foi ocorrido. Por 71 exemplo, se o conflito aconteceu entre alunos na sala de aula, deverá ser resolvido na sala de aula pelos alunos, auxiliados pelo professor, que tentará uma conciliação pacífica entre os colegas e ouvirá atentamente as partes. As situações de conflitos disciplinares devem ser enfrentadas no âmbito em que ocorrem, até que se esgotem as possibilidades de solução. Trata-se de superar os famosos “encaminhamentos” de alunos para a orientação ou direção, ou ainda as mais famosas “convocações de pais”. Assim, por exemplo, dado um conflito em sala de aula, o professor deve fazer tudo que estiver ao seu alcance para resolvê-lo nesta esfera, individual ou coletivamente (VASCONCELLOS, 1995, p. 92). Quando o professor delega a outro a incumbência de resolver os conflitos que são da sua competência e responsabilidade, está “terceirizando” o problema, logo, abrindo mão da sua própria autoridade. Ninguém melhor do que ele que presencia uma cena de conflito para poder resolvê-lo ou amenizá-lo. É preciso superar a fragmentação das relações. Comumente, os problemas de disciplina são enfrentados por ruptura de relações: manda-se o “aluno problema” para a orientação ou direção, faz-se conselho de classe sem a participação dos alunos; faz-se reunião de representantes de classe sem a participação dos professores, etc. e depois não se sabe porque com tanto trabalho as coisas não vão para frente[...] (VASCONCELLOS, 1995, p. 92). Segundo Vasconcellos (1995), o encaminhamento, além de fragmentar as relações, ainda aumenta o problema e o trabalho a posteriori. A resolução das violências pode ocorrer de forma pacífica ou acarretar mais violência; depende da ação do professor. O importante é não deixar passar a oportunidade de problematizar as aprendizagens que podem ser extraídas desta experiência, que tanto pode ser rica quanto pode ser traumática. Não ficar mandando toda hora aluno para fora, nem ficar sofrendo com aluno em classe por receio de tomar uma decisão mais firme; procurar resolver o problema diretamente com o aluno; se não tiver êxito, solicitar ajuda de colegas, da orientação, da coordenação. Se emergiu um conflito em sala de aula, é ali que deve ser tratado; quando, por exemplo, o professor manda o aluno para a direção, fica uma situação muito artificial: o conflito não é entre o aluno e a direção, mas entre aluno, professor e coletivo de sala. Se a dificuldade, pois, está na relação professor-aluno, ou professor – aluno - coletivo da classe, é esta que deve ser trabalhada (VASCONCELLOS, 1995, p. 92). É preciso que o aluno perceba o professor presente ali, para lhe dar assistência naquilo que não é de sua capacidade, naquilo que não está ao seu alcance e que deve ser resolvido entre eles. Afinal, Vasconcellos (1995) ressalta que, quando o problema é da sala de aula, é desta que deve partir a solução e não da direção ou de terceiros. Precisamos romper com o modelo tradicional de educação, pois, 72 Na escola tradicional é comum, quando há desavenças entre as crianças ou entre o aluno e o professor, que se utilizem procedimentos que resolvem o problema temporariamente, mas que não educam. Ou seja, para lidar com as situações em que as crianças brigam, comportam-se mal, desobedecem as regras ou são indisciplinadas, os professores, em geral, utilizam punições, como por exemplo: escrevem na agenda do aluno o que ele fez de errado, transferindo o problema que deveria ser da competência da escola para a família; contam diretamente aos pais; encaminham os infratores ao diretor, orientador, coordenador...; tiram algo que dá prazer à criança, como o parque, a educação física, o vídeo, o recreio, etc., colocam para “pensar no que fez”; advertem; suspendem; ameaçam; fazem sermões; retiram o amor (dizendo que está triste, que é feio, que não gosta mais...); dão ponto negativo; etc. [...] Ou ainda se valem das recompensas, “formas açucaradas de controle”, para que a criança apresente determinado comportamento. Esses educadores utilizam as punições e as recompensas porque estão convencidos que são esses os procedimentos que fazem as crianças serem obedientes e educadas, desconhecendo uma outra maneira de agir, acreditando que esses “instrumentos” são fundamentais para a formação de futuros cidadãos adultos bons, honestos e inteligentes (VINHA, 2003, p. 233). Lembrando Guimarães (1996), “Como encontrarmos um equilíbrio entre os interesses dos alunos e as exigências da instituição? É preciso deixar de acreditar que paz signifique ausência de todo conflito” (p. 81). Os conflitos são ótimas oportunidades para trabalharmos valores e regras. São compreendidos como momentos que estão presentes no cotidiano de cada classe e que nos dão “pistas” sobre o que as crianças precisam aprender. Dessa forma, as desavenças são encaradas como positivas e necessárias, mesmo que desgastantes. Surgem principalmente na troca de pontos-de-vista, só possível pela interação social. Sua ausência reflete relações de respeito unilateral, em que raramente há discordâncias, brigas ou discussões, pois apenas uma das partes detém a autoridade, o poder, a razão (VINHA, 2003, p. 232). Em um lugar onde se manifestam a diversidade e a multiculturalidade, como a escola, é natural que haja pontos de vista divergentes o que, não raro, resulta em conflitos. Estes são excelentes momentos para oportunizar o diálogo entre os pares, possibilitar a fala sobre as suas emoções e sobre os sentimentos emergentes daquela situação. Nessa ou em outras situações de conflito, o educador poderá intervir, explicitando o problema de tal forma que as crianças possam entender, ajudá-las a verbalizar seus sentimentos e desejos, promovendo uma interação, e auxiliá-las a escutar umas as outras, convidando-as para colocar suas sugestões e propor soluções (VINHA, 2003, p. 236). Para Vasconcellos (1995), a escola deve prever momentos durante o ano para um contato mais próximo entre professor-alunos, sempre que for necessário. Para ele, No caso limite em que isto não esteja acontecendo ainda, poderia se apontar uma inversão da prática corriqueira: ao invés de encaminhar o aluno para a orientação/coordenação/direção, solicitar que a orientação fique em classe com os 73 alunos fazendo algum trabalho, enquanto o professor pode ter um contato mais profundo com o(s) aluno (s) em questão (p.92). Fica a sugestão do autor, assim como todas as suas exposições ao tema. São reflexões importantes que nos motivam, enquanto educadores, a pensar alternativas justas e adequadas para as violências na escola. São desafios propostos pelos autores que pensam, assim como nós, na relação pedagógica e no enfrentamento das violências na escola. 2.2.5 Pesquisas relacionadas Bernard Charlot (2002), professor de Ciências da Educação (Escol, Université Paris), realizou importante pesquisa cujo objetivo principal era saber como falar com rigor desta noção de “violência” que compreende coisas muito diferentes. Portanto, foi preciso, inicialmente, distinguir a violência na escola, a violência à escola e a violência da escola. A violência na escola é aquela que se produz dentro do espaço escolar, sem estar ligada à natureza e às atividades da instituição escolar: quando um bando entra na escola para acertar contas das disputas que são as do bairro, a escola é apenas o lugar de uma violência que teria podido acontecer em qualquer outro local. Pode-se, contudo, perguntar-se por que a escola, hoje, não está mais ao abrigo de violências que outrora se detinham nas portas da escola. A violência à escola está ligada à natureza e às atividades da instituição escolar: quando os alunos provocam incêndios, batem nos professores ou os insultam, eles se entregam a violências que visam diretamente à instituição e àqueles que a representam. Essa violência contra a escola deve ser analisada junto com a violência da escola. Violência da escola: uma violência institucional, simbólica, que os próprios jovens suportam através da maneira como a instituição e seus agentes os tratam (modos de composição das classes, de atribuição de notas, de orientação, palavras desdenhosas dos adultos, atos considerados pelos alunos como injustos ou racistas...). Esta distinção se fez necessária: se a escola é largamente (mas não totalmente) impotente face à violência na escola, ela dispõe (ainda) de margens de ação face à violência à escola e da escola. Os resultados desta pesquisa apontaram para a importância da relação com o saber quando se trabalha (como pesquisador ou como professor) a questão da violência na escola. Certamente esta é uma questão que está vinculada ao estado da sociedade, às formas de dominação, à desigualdade, uma questão que está vinculada também às práticas da instituição (organização do estabelecimento, regras de vida coletiva, relações 74 interpessoais, etc.). Mas é também uma questão que está ligada às práticas de ensino quotidianas que, em último caso, constituem o coração do reator escolar: é bem raro encontrar alunos violentos entre os que acham sentido e prazer na escola... Tal conclusão faz recair uma pesada responsabilidade sobre os professores, mas esta lhes atribuiu também uma dignidade profissional que os trabalhos sociológicos, estabelecendo uma relação direta entre o social e o escolar, tendem a retirar deles... (CHARLOT, 2002, p. 442). Outra importante pesquisa realizada pelo coletivo de autoras: Tognetta, Domiciano, Grana, Rossi e Sampaio (2010), foi publicada em três volumes. O primeiro deles, “Um panorama geral da violência na escola... E o que se faz para combatê-la”: trata-se de uma pesquisa coordenada pelos membros da linha de pesquisa “Afetividades e virtudes” do Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Moral, cujo foco é caracterizar a violência e as formas pelas quais professores e alunos a veem na escola. “Compreendendo o fenômeno: as classes difíceis, o bullying escolar e as concepções dos educadores”: trata especificamente do bullying, das classes difíceis e das concepções dos educadores, como o próprio nome sugere. E o terceiro volume, “Quando o conflito é resolvido: da sala de aula à instituição escolar”: voltada ao professor e à equipe gestora. Reflete como gestores e demais educadores precisam se sentir “pertencentes” à necessidade de resolver os problemas na escola. As autoras se utilizam de pesquisas realizadas por: APEOESP – DIEESE, 2007; Fante, 2003; Leme, 2006; Soares, 2007; Tardeli, 2003; Tognetta, 2009, entre outras que foram divulgadas sobre violência da escola e na escola. Deste apanhado de pesquisas, elas indicaram alguns resultados: De acordo com Fante (2003), muitos professores dedicam entre 21% e 40% do seu dia de trabalho à resolução de problemas de indisciplina e de conflitos entre seus alunos. Tardeli (2003), que tratou também sobre essa questão, mostrou que 77,7% dos professores de Ensino Médio estão desmotivados com a profissão em virtude da mesma situação comportamental. No que diz respeito aos atos violentos cometidos por alunos dentro da escola, a Associação dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp) e o Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Econômicos (Dieese) empreenderam uma investigação no ano de 2006, com 684 professores da rede pública a qual mostrou que, dentre as principais causas dessa violência, estavam: os conflitos entre alunos (76%); o uso de drogas e álcool (63%); a falta de funcionários (60%) e a pobreza generalizada (45,6%). (Apeoesp- Dieese, 2007). Na pesquisa “Convivência, conflitos e educação nas escolas de São Paulo”, realizada por Maria Izabel da Silva Leme (2006) os resultados apontam a família como problemática. 75 Dentre os 55 diretores que responderam ao questionário aplicado pela pesquisadora, 46% atribuíram à educação recebida no núcleo familiar como fator responsável pelos conflitos ocorridos na escola, 30% imputaram essa responsabilidade à instituição. Outra causa recorrente nas respostas dos diretores, mostrada no estudo de Leme (2006), relacionava-se à personalidade conflituosa (28%) e intolerante (40%) dos alunos. Já entre alunos e professores, as causas dos conflitos foram atribuídas à ausência de limites por parte dos pais (58,8%) e desinteresse dos alunos por qualquer aula (29,4%). Da mesma forma, os diretores atribuíram à ausência de limites na educação (73,5%) o motivo principal dos conflitos entre alunos e funcionários. Em uma pesquisa coordenada por Maria Tereza Perez Soares (2007) com 3.500 docentes de diversas regiões do país sobre qual seria a maior insatisfação sentida por eles em relação aos seus alunos, obteve 53,5% das respostas como sendo a falta de respeito, seguido do fracasso ao tentar motivar os alunos para as atividades (20,6%). Nessa investigação, Soares (2007) levantou ainda as principais dificuldades sentidas pelos professores em seu trabalho, as que mais apareceram foram: a manutenção da disciplina em sala de aula (37,1%), seguida pela educação pautada na construção de valores (34%). Por fim, a Apeoesp (2008), com vistas a investigar a violência nas escolas públicas, solicitou a 580 professores que respondessem a um questionário. Os resultados revelaram que 27% desses professores foram vítimas de violência física e 43% de violência verbal por parte dos seus alunos no ambiente escolar. Nas pesquisas mencionadas, verificamos uma tendência, tanto dos diretores quanto dos professores, de responsabilizar outros atores para os episódios de violência escolar, como a família, a situação econômica e a personalidade do aluno, entre outros, bem como de eximir a responsabilidade dos profissionais da escola pelos conflitos gerados e pela resolução deles. Tigre (2009), em sua dissertação de mestrado, Violência na escola: representações sociais dos sujeitos envolvidos, teve como objetivo principal compreender o que os diversos agentes envolvidos com o cotidiano escolar entendem por violência na escola e que procedimentos têm sido adotados para enfrentá-la em suas diversas formas de manifestação. As atitudes tomadas diante de situações conflituosas são pontuais e não planejadas e variam desde conversar com os alunos, encaminhar para serviços especializados, comunicar aos pais, suspender, expulsar, até mesmo chamar a polícia. Quando isso ocorre, a Patrulha Escolar é chamada, o que gera uma sensação de segurança a todos na escola. Não foi evidenciado nenhum projeto, mais estruturado, que contemplasse a prevenção da violência escolar (TIGRE, 2009, p.104). 76 Quanto ao entendimento do conceito de violência pelos sujeitos participantes da pesquisa, os resultados comprovam que, no cotidiano escolar, a palavra violência vem sendo utilizada para representar a mais variada gama de ações, e a maioria dos envolvidos não consegue delimitar e definir com segurança o conceito, que, muitas vezes, é empregado como sendo um sinônimo de indisciplina (TIGRE, 2009, p. 99). Em sua tese de doutorado Violência na escola: um estudo sobre conflitos (Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, 2010), Janete Cardoso dos Santos teve, como objetivo central, analisar a relação entre conflito e violência e as potencialidades da escola em criar uma cultura que tenha, como base, o diálogo e a aprendizagem. Os dados empíricos foram coletados em cinco escolas de educação básica da Rede Pública do Distrito Federal, por meio de entrevistas e observações com diretores e grupos focais de adolescentes entre onze e dezesseis anos. [...] O estudo enfatiza a necessidade de perspectivas teóricas que incluam a dimensão antropológica nos processos da escola, tendo como referencial que o contexto é produzido pelas relações sociais, e que, portanto, a violência está na esfera da ação humana. A resolução dos conflitos de forma não violenta constitui contribuição significativa para os processos de educação básica hoje, e apontam para uma mudança de paradigma – a começar pelos educadores. Juliana Prudente de Oliveira, em sua dissertação de mestrado Representação social da violência na escola (Universidade Católica de Goiás, 2002), objetivou conhecer as representações sociais sobre violência na escola. Para tanto, contou com a colaboração de trinta e um adolescentes, estudantes de uma escola estadual de Goiânia, e 28 pais. Os resultados indicam que para os adolescentes a violência está vinculada às suas experiências de vida e é um fenômeno presente no cotidiano da escola. [...] Há uma tendência à banalização da violência à medida que a mesma se torna uma manifestação de autoafirmação. Quanto aos pais, há uma diferença entre o gênero feminino e masculino. As mães desconhecem a violência na escola, e para os pais a violência é fruto da violência estrutural. Os pais reafirmam a banalização da mesma quando justificam esses atos como manifestações de brincadeiras de crianças. Os resultados permitem afirmar que os adolescentes, por se encontrarem próximos ao objeto, possuem uma representação de natureza funcional da violência na escola. Os pais, por outro lado, possuem uma representação de natureza normativa da mesma, pois se encontram distantes do objeto. Na tese de doutoramento intitulada Formação de professores e violência nas escolas (Pontifícia Universidade Católica - SP, 2006), Eni de Fátima Martins buscou compreender as mudanças, no conjunto de sentidos e significados do professor a respeito de violências, que 77 podem ser mediatizadas por um processo de formação continuada. Foi acompanhado um grupo de formação continuada onde estavam três docentes. Utilizaram-se na coleta de dados, questionário de mapeamento sócio-demográfico, entrevista coletiva e observação participante durante o processo de formação grupal. Como resultados, foi observado, que as participantes expressam reflexões em que buscam articular suas práticas educativas com as questões teóricas sobre a violência, ampliando o conceito desse fenômeno, pois, inicialmente, apontavam apenas a violência física, cometida pela família e comunidade, e não mencionavam a possibilidade de violência da escola. [...] Ficou ressaltada a importância dos processos formativos para a construção/reconstrução dos sentidos e significados da violência na escola. O vir a ser desse processo de intervenção educativa de enfrentamento da violência dependerá de circunstâncias históricas que possibilitem às docentes novos conhecimentos sobre a violência nas escolas e, consequentemente, a reflexão coletiva sobre como intervir. Observou-se que as professoras estão em processo de reflexão sobre a importância da atuação do professor no processo de sociabilidade de crianças e adolescentes, contribuindo para a formação de sujeitos históricos que possam participar mais criticamente da sociedade em que estão inseridos, até mesmo com ações que visem à superação da violência nas relações sociais. Entre interações e violências: a percepção dos atores sociais a respeito de seu cotidiano escolar (Universidade Federal de Juiz de Fora, 2008) foi o título da dissertação de mestrado apresentada por Fernanda Campos Junqueira. Este trabalho teve como objetivo observar as interações sociais desenvolvidas entre os diversos atores numa instituição escolar estadual localizada no município de Juiz de Fora; analisar o processo de formação de grupos e identidades sociais a partir destas relações e averiguar a existência e as modalidades de expressões violentas e criminosas ocorridas na escola – bem como suas representações -, tendo como base as diferentes percepções e proposições dos diversos atores da comunidade educacional, como alunos, professores, corpo técnico-pedagógico e funcionários. Os resultados apontaram que a escola, enquanto espaço de convivência, é também palco de expressões violentas, definidas diretamente por atores distintos, além de ser um ambiente de desencontros significativos entre os grupos que se manifestam em confrontos, estigmatizações e rotulações. [...] A partir do referencial teórico interacionista, foi procurado compreender a miríade de questões peculiares ao ambiente educacional procedentes das variadas situações interacionais, respeitando as definições de cada um de seus interagentes. Sinara Mota Neves de Almeida defendeu a tese de doutorado intitulada Avaliação das concepções de violência no espaço escolar e a mediação de conflitos (Universidade Federal 78 do Ceará, 2009), tendo como objetivo discutir a mediação como prática de resolução dos conflitos escolares. A pesquisa foi desenvolvida em uma Escola Pública Municipal em Fortaleza – Ceará, localizada em uma zona considerada vulnerável. Os instrumentos metodológicos foram: observações, entrevistas, questionários, curso de formação sobre mediação e cultura de paz para professores, alunos e pais/responsáveis. Os participantes da pesquisa foram cento e dezoito alunos, trinta professores, dois diretores e cinco pais/responsáveis. Constatou-se que a comunidade escolar não se encontrava preparada para gerenciar os conflitos e a violência, ali gerados. Sugeriu-se, desse modo, uma estratégia de intervenção baseada numa técnica não-adversarial – a mediação – com vistas a possibilitar a cultura do diálogo. Convém esclarecer que a mediação não busca inocentes e culpados, ganhadores e perdedores, tem como pretensão trabalhar com os disputantes o enfrentamento da tensão: interação cooperativa para descobrir alternativas criativas na solução de impasses, de forma que não ocorra injustiça. A partir da implantação da mediação escolar, ocorreu uma redução da violência na escola. Torna-se imperativo, por conseguinte, gerir os conflitos eficientemente, haja vista oportunizar ações promotoras de paz. Os conflitos e os sentimentos presentes na relação pedagógica e seus entrelaçamentos na construção da personalidade moral é, atualmente, o projeto principal do Grupo de Estudos Afetos Morais. Desde 2004 o grupo pesquisa sobre relação pedagógica e personalidade moral, sob coordenação da Professora Doutora Lúcia Salete Celich Dani. Apontaremos os resultados das pesquisas realizadas entre 2006 e 2010. A escolha do recorte se deu em função de eu ter sido bolsista no projeto desde o primeiro semestre de 2006 até o segundo semestre de 2009 e participante a partir deste período. Importante destacar que os dados que apresentarei foram organizados pela professora coordenadora e pela atual bolsista, no relatório do projeto PROLICEN, 2010. Em 2006, a investigação trabalhou com a memória de formandos de alguns cursos de licenciatura da UFSM. Na pesquisa, foram considerados os conhecimentos adquiridos ao longo de sua formação e as práticas pedagógicas utilizadas em sala de aula, pois, naquele momento, os alunos realizavam o seu estágio curricular. No ano seguinte (2007), continuou-se pesquisando sobre a utilidade dos conhecimentos construídos pelos alunos estagiários durante o curso de graduação para a resolução de conflitos que surgiam na sala de aula. Participaram da pesquisa alunas do Curso de Pedagogia - UFSM e professores da rede municipal de ensino. A partir das constatações em 2008, achou-se necessário compreender o que pensavam os alunos do Ensino Fundamental sobre os conflitos que surgem na escola, na sala de aula, na 79 relação aluno-aluno e na relação aluno-professor. A pesquisa abrangeu 366 alunos do 1º ao 9º ano do Ensino Fundamental de uma escola municipal da cidade de Santa Maria - RS. Duas turmas nos fizeram pensar acerca da necessidade de retomar a investigação, tendo, como enfoque, os sentimentos que emergem nas situações de bullying nestas mesmas turmas. Portanto, no ano de 2009, o foco da pesquisa foi os sentimentos que emergiram nas situações de bullying de quatro turmas de alunos de 7º e 9º ano do Ensino Fundamental, somando um total de 100 alunos. O levantamento de dados foi feito através de um questionário, e os resultados mostraram que o bulliyng encontrava-se presente nas relações aluno-aluno e professor-aluno. As violências mais evidentes foram os apelidos, reclamações, exclusões, desabafos e indignações. Em 2010, foi investigado outro aspecto das violências escolares, aquelas que os alunos (as) cometem contra os professores(as). Na coleta de dados foi utilizado um questionário direcionado para professores da Educação Básica do estado do Rio Grande do Sul. Tivemos a colaboração de 155 professores de escolas da rede pública e privada de 8 municípios. Os resultados mostraram que grande parte dos professores não procura resolver os conflitos e as violências com os envolvidos, encaminhando-os a terceiros e solicitando a presença dos pais na escola. Esses dados se contradizem quando os professores são indagados sobre como eles acreditam que seria correto resolver as violências que eles sofrem. A maioria, cento e vinte, respondeu que, através do diálogo com os envolvidos, procurando uma solução positiva, seria a melhor solução. Seria interessante refletirmos e discutirmos mais sobre essas questões. No entanto, o espaço e o tempo não nos permite. Portanto, faremos um breve comparativo entre as pesquisas apresentadas neste item como forma de concluir temporariamente essa problematização. Ao analisar as pesquisas citadas, deparei-me com o primeiro ponto em comum com a minha investigação: a preocupação em descobrir qual o entendimento dos educadores acerca do termo violências. Em segundo lugar, percebi o interesse comum pelos procedimentos que têm sido adotados no enfrentamento das violências. Alguns temas como o bullying e os conflitos, vinculados às violências, também são abordados embora não sejam enfatizados. Além disso, as manifestações das diferentes formas de violências e os conflitos e as estratégias de enfrentamento e resolução destes são realidades vivenciadas pela relação pedagógica. Ao propor a temática A relação pedagógica e o enfrentamento das violências na escola, busco compreender se as atividades propostas pela professora de Educação Física 80 contemplam, de alguma forma, as violências e os conflitos na escola, prevenindo- os ou minimizando-os. A organização da aula, a prática pedagógica e o sentido da relação pedagógica para o agente educativo estão também permeando esta investigação. Nesse sentido, procuro saber como são tratados estes fenômenos pela educadora e, em extensão, pela escola. Charlot (2002), ao distinguir os diferentes conceitos de violência da escola, violência à escola e violência na escola, alertou para o fato de as instituições também serem produtoras de violência à medida que não são trabalhados os conteúdos de forma prazerosa e significativa para os alunos. Outra forma de instigar as violências são as imposições autoritárias através de regras, a falta de acolhimento das diferenças, a organização das instituições e a inexistência de problematizações acerca dos conflitos interpessoais. Certamente essas questões de pesquisa estão relacionadas aos achados do coletivo de autoras citado por Tognetta (2010) e são efetivamente contemplados na trilogia desta autora, pois, nessa coleção, são trabalhados conceitos de conteúdos moral e ético, como: valores, afetividade, sentimentos, disciplina, entre outros. A partir desta obra, percebe-se que o professor precisa agir no sentido de desconstruir antigos paradigmas calcados em práticas docentes tradicionais que enfatizavam memorizações mecânicas de conteúdos “vazios de sentido” para a vida do educando e para o acolhimento dos seus sentimentos. É preciso haver afetividade para haver sentido e prazer na escola. A proposta trazida por Tigre (2002), em sua dissertação de Mestrado, de pesquisar os tipos de enfrentamento nas “diferentes formas” de violência pelos professores, coaduna com as minhas perspectivas de pesquisa, quer seja, as diferentes estratégias de enfrentamentos para as diferentes formas de violência. Esta questão traz implícita a possibilidade de múltiplas maneiras de se resolver uma situação de violência ou de conflito na sala de aula, lembrando também que, além de possível, é necessário que sejam enfrentados. Este enfrentamento também supõe criatividade por parte do educador. Não conseguindo resolver de uma forma, deve criar outra alternativa e encarar o problema de frente. Além disso, não se deve fomentar a violência da escola pela nossa indiferença para com os alunos, como lembra Charlot (2002). As teses de doutoramento e as dissertações de mestrado, aqui explanadas, também relacionam-se diretamente a nossa temática, tendo como palavras-chaves a violência, os conflitos, o enfrentamento destes e as relações interpessoais. Além disso, os dados, obtidos nos projetos de pesquisa coordenados pela Professora Doutora Lúcia Salete Celich Dani, 81 comprovam a relevância social desses projetos, bem como a necessidade de dar continuidade às investigações a fim de contribuir com a comunidade escolar e também com a sociedade em geral. Muitos entrelaçamentos ainda são possíveis entre estes estudos interessantes e o meu projeto de pesquisa. No entanto, optamos por pincelar brevemente apenas alguns aspectos considerados mais relevantes como: a importância de conhecer as diferentes concepções do significado de violência pelos educadores bem como descobrir o que eles estão utilizando como recurso no enfrentamento dos diversos tipos de manifestações das violências. 3 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS Neste capítulo, serão apresentadas a análise e a discussão dos dados obtidos através dos instrumentos de investigação mencionados no capítulo I “Ponto de partida: desenho da pesquisa”. Assim, apresentamos os dados coletados na entrevista semi-estruturada (Apêndice E), no questionário (Apêndice F) com a professora, no questionário com os alunos (Apêndice G) e nas observações das aulas. Esses dados serão analisados à luz dos pressupostos teóricos e com vistas à discussão e problematização das questões propostas nesta investigação. As análises e discussões sobre a relação pedagógica e seus condicionantes: o saber, as atividades e as regras, possibilitarão a compreensão das influências (favoráveis ou não) destes no enfrentamento das violências e dos conflitos escolares. Para tanto, além dos dados coletados, foi importante a aproximação entre a pesquisadora e a escola. Para Passos (1996), “estudar a escola a partir da análise do seu cotidiano é compreender a ação dos sujeitos que nela se movimentam, entendendo essa realidade específica nas suas articulações com a realidade macrossocial” (p. 121). Através dessa inserção, foi oportunizada a percepção de sutilezas do cotidiano escolar, que, de outra forma, não teria sido possível senão pela vivência e observação do espaço escolar como um todo. Durante um semestre, acompanhei três turmas de quinto ano com as quais a professora Bela trabalhava a disciplina de Educação Física. Cada turma tinha em torno de vinte alunos. O objetivo das observações, assim como da entrevista semiestruturada (Apêndice E) e dos questionários (Apêndices F e G), foi perceber se a forma como são trabalhados os condicionantes da relação pedagógica (o saber, as atividades e as regras), em sala de aula/pátio, favorece ou não o enfrentamento das violências. Para tanto, foi necessário um olhar atento para a forma como eram trabalhados os condicionantes da relação pedagógica e como eram tratadas pela professora as situações de conflitos e de violências na sua disciplina. Isso exigiu descobrir também quais as concepções que ela tinha acerca destes temas desafiadores: conflitos e violências. Cada aula tinha duração de cinquenta minutos. As turmas tinham horários diferentes, nunca as juntaram, exceto em uma gincana que aconteceu no último dia de aula, onde as turmas competiam entre si. As turmas eram relativamente bem divididas em termos de número de alunos e de gênero. A maior diferença estava na idade dos alunos, que variava entre oito e doze anos. 84 Essa diferença às vezes se salientava no comportamento individual, principalmente nas meninas. Enquanto umas trocavam adesivos e figurinhas de personagens infantis, outras se olhavam na tela do celular para ver como estava o cabelo ou a maquiagem. A postura da professora com as três turmas era praticamente a mesma. As exigências, principalmente no que diz respeito ao comportamento, às regras, às atividades e às atitudes frente às situações adversas eram idênticas. Geralmente, no início da aula, e principalmente quando trazia uma atividade diferente, eram combinadas as regras que deveriam ser seguidas. Em algumas vezes eram expostas pela professora, e em outras vezes, ela pedia aos alunos que sugerissem algumas e acrescentava outras regras às propostas por eles. Bela esforçava-se em reforçar com as turmas a importância da boa convivência e da obediência às regras da escola e da disciplina. No entanto, seu discurso nem sempre convencia. Algumas aulas transcorriam tranquilamente; outras eram bastante perturbadas pela agitação da turma. Quando as regras não eram cumpridas por determinados alunos, geralmente eram encaminhados à direção, ou era mencionada a condição de participação da gincana, que estava atrelada ao bom comportamento e obediência às regras. O interesse em participar da gincana entre turmas era grande por parte dos alunos, que foram bastante motivados durante todo o semestre pela professora. Bela treinava algumas modalidades de jogos e brincadeiras com os alunos que ficavam animados, pois, primeiro, competiam entre si, na própria turma e, depois, os melhores competiam com os melhores das outras turmas do mesmo ano/série. As atividades eram diferenciadas e podiam ser escolhidas por seus participantes. Estes poderiam participar de até três modalidades. Tinha chute a gol, acerte o alvo, pular corda, vôlei adaptado, entre outras. Como as atividades eram interessantes, ajudavam a “acalmar os ânimos”, mas não impedia o surgimento dos conflitos. Neste caso, o conflito não era solucionado, mas latente. Estava adormecido, esperando uma oportunidade de eclodir. As atividades apenas adiavam a manifestação destes. Quando surgiam os conflitos entre alunos, muitas vezes Bela parava a aula e discutia o problema com a turma. Outras vezes, chamava os envolvidos em particular e conversava com eles sem a turma saber o que se passava. E ainda, algumas vezes, quando solicitada, a professora parecia não escutar as reclamações dos alunos que tinham sido ameaçados (com gestos e/ou palavras) ou ofendidos por colegas. 85 Bela sempre enfatizava a importância da amizade e do respeito entre as pessoas e chamava a atenção também para a questão do bullying, dos apelidos e dos rótulos. Nas salas de aula, havia expostos trabalhos recentes sobre esses temas, desenvolvidos pelos professores e alunos. Percebi um ótimo relacionamento entre a professora e as turmas. Os alunos tinham um imenso carinho pela professora, que os acompanha desde o primeiro ano na escola. Carinho este recíproco e facilmente percebido quando Bela se referia aos seus alunos. Ela conhecia a história de vida de quase toda a turma, sabia de suas dificuldades, limitações, superações, carências e habilidades e as acolhia. Já não se pode dizer o mesmo do relacionamento entre os colegas. Não se pode generalizar e dizer que ninguém se entendia, mas havia alguns casos complicados e desafiadores para a professora lidar. No geral, as relações interpessoais são boas, mas as exceções são preocupantes, no sentido de que, seguidamente aconteciam os encaminhamentos para a direção/secretaria resolver os conflitos entre colegas quando a professora não dava conta da situação. Essa forma de solucionar conflitos: encaminhamento para a direção e/ou secretaria, na maioria das vezes, implicava a postura de procurar os “culpados” pelas violências. Raramente escutavam- se os alunos. Com o sentimento de responsabilidade, gerador de inquietação e apreensão, buscamos descobrir o que pensavam os vinte e seis alunos do quinto ano, a respeito dos conflitos e das violências que ocorriam em sua escola. Acreditamos na importância da escuta, da expressão dos sentimentos e da acolhida destes como forma de respeito ao educando e também como forma de desafiá-lo a pensar/repensar o seu cotidiano. Muitas vezes, ao serem questionados sobre o motivo que os levava a agir violentamente com os colegas, alguns nem sabiam explicar o porquê da agressão, da intolerância, do desrespeito para com o colega. Nesse sentido, consideramos relevante oportunizar aos discentes momentos de reflexão e introspecção, para pensarem não apenas nas atitudes dos colegas, mas nas suas também. Exercícios de introspecção são necessários para o autoconhecimento e para autorregulação, visto que possibilitam o desenvolvimento social e pessoal. Alunos que são acusados e castigados por suas ações dificilmente serão desafiados a pensar sobre elas. Garcia e Puig (2010) ressaltam que “a reflexão aumenta a possibilidade de adquirir informação significativa sobre si mesmo e também amplia a autonomia do sujeito” (p. 28). 86 Além disso, ajudará na autoestima, pois perceberão que as suas opiniões e os seus sentimentos são importantes e precisam ser conhecidos. Por tudo isso, iremos analisar o que disseram os nossos interlocutores, professora e alunos, a respeito da temática. Foram quatorze questões dissertativas (1-11; 15-17) e três questões objetivas (12-14) respondidas pelos alunos através dos questionários. Responderam ao questionário doze meninas com idade entre oito e onze anos (apenas uma aluna com oito anos) e quatorze meninos com idade entre nove e doze anos, totalizando vinte e seis alunos (das três turmas) colaboradores da pesquisa. A professora das turmas também respondeu a um questionário com treze questões objetivas e a uma entrevista com sete questões acerca da formação e memórias enquanto aluna dos anos iniciais e dez questões acerca da temática, totalizando dezessete questões. Ressalto que, para identificar as falas dos diferentes participantes, a entrevistadora será representada pela letra “E”, a professora Bela será identificada pela letra “B”; alguns alunos serão representados por suas iniciais (quando necessário) e as demais respostas, quando desnecessária a identificação, serão representadas pela letra “R”. 3.1 Os condicionantes da relação pedagógica e as respostas dos interlocutores da pesquisa Quando refletimos sobre a complexa temática: conflitos e violências escolares, logo surge o interesse em descobrir como as escolas estão agindo no enfrentamento destas situações delicadas e ao mesmo tempo desafiadoras. Os professores, muitas vezes, encontram-se frente à difícil tarefa de solucionar alguns problemas para os quais não foram ou não se sentem preparados. Nesses casos, alguns docentes buscam, em suas memórias, nas experiências que tiveram enquanto alunos, estratégias de soluções para os atuais problemas, tendo como parâmetro a prática pedagógica utilizada por seus antigos professores. Pensando nessa realidade, procurei trabalhar com as memórias da professora participante, a qual chamei pelo nome fictício de Bela. A intenção foi, neste primeiro momento, analisar se a sua prática pedagógica traz alguns resquícios da prática de seus professores e se estes influenciaram nas atuais atitudes dela para com os seus alunos. Para Bela as lembranças mais significativas das aulas de Educação Física, dos professores desta disciplina e das relações interpessoais estabelecidas foram as seguintes: 87 B- Sempre fui muito ativa, gostava muito da Educação Física [...]. Era mais rígido, não tinha essa de largar as crianças no pátio, mas eu adorava. Naquela época tinha as regras, se os alunos não obedeciam iam para a direção, ganhavam castigo, escreviam coisas do tipo “devo me comportar”. A maior lembrança era das regras, as crianças não tinham muita liberdade. Pela afirmativa de Bela, as regras foram muito significativas em sua formação e os castigos e encaminhamentos para a direção parecem ter sido a solução encontrada por sua professora àqueles que não obedeciam a elas. Esse modelo pedagógico tradicional, infelizmente ainda é comum nos dias atuais. Percebi, pela fala de Bela, que as regras que ela vivenciou na escola restringiram a liberdade dos alunos. Se havia regras, faltava liberdade; se os alunos tinham liberdade, era sinal de que as regras eram ausentes, um laisse-fair. Outro aspecto que parece sugestivo é de haver, “naquela época”, uma associação entre regras e autoritarismo. O autoritarismo traduz-se em desequilíbrio; desequilíbrio que deriva de insegurança do educador ou de seus eventuais traços sádicos de personalidade. Autoritarismo é o que poderíamos chamar de princípio de competição [...]. O autoritarismo é o tapume atrás do qual alguma incompetência se esconde. Ele usa a diferenciação natural do mundo para hipertrofiá-la, não reconhecendo as coisas transformáveis, mas sim parasitando-as, e fazendo-o deformar o educando. (MORAIS, 1995, p. 46). Quando a interlocutora relata a existência de castigos como a escrita de expressões: “devo me comportar”, deixa claro o modelo de educação tradicional e autoritário ao qual foi submetida nos anos iniciais de sua formação. Morais (1995) ressalta que “há uma convicção que é básica: educar é intervir em vidas, assim como ensinar o é. Intervenção em vidas humanas é alguma coisa que se faz pelo convite e não pela invasão” (p. 45). Mesmo sendo tão distintos no significado, infelizmente, autoridade e autoritarismo ainda hoje são confundidos e tratados como se fossem equivalentes por alguns educadores. Apresentamos a memória da professora para relacioná-la ao autoritarismo que ela viveu enquanto aluna dos anos iniciais e ver se essas vivências repercutem em sua prática hoje. Para tanto, questionei à Bela como eram resolvidas pelo seu professor as situações de conflitos, agressões e violências ocorridas na Educação Física. Ao que ela me respondeu: “eram encaminhadas à direção, ficavam sem recreio, não deixavam brincar com as outras crianças”. Para refletir sobre a postura dos professores de Bela de anos iniciais e a sua postura diante de seus alunos, questionei a eles como são resolvidos os conflitos e as violências 88 ocorridas na Educação Física. Dentre as respostas emitidas por eles destaco algumas ações na prática de Bela que se assemelham à prática de seus antigos professores. R- “A professora põe “eles” na direção/secretaria” R- “A professora xinga” R- “Castigo” R- “Bilhete para a casa” Os achados de Dani (2008) se assemelham aos achados nesse estudo. Bela parece, em certos momentos, repetir os autoritarismos praticados por seus antigos professores, com seus atuais alunos. Em seu artigo sobre as significações do autoritarismo na relação pedagógica e suas repercussões na construção da personalidade moral, Dani (2008) afirma que “o autoritarismo sutil e/ou explícito que vivemos em nossas escolas não nos tornou melhores em relação ao nosso agir pedagógico” (p. 112). Portanto, Nas escolas temos professores que [...] criam situações que, aparentemente, permitem aos alunos participarem e tomarem decisões em atividades, mas, se observarmos a forma como aconteceu o processo, perceberemos a existência do controle e do autoritarismo dissimulados (DANI, 2008, p. 123). Na entrevista e também no questionário, Bela afirma que, para não perder a autoridade frente à turma, quando não consegue resolver um conflito em sala de aula, encaminha os envolvidos à direção. Nas observações das aulas, percebi que esta era uma atitude frequente da professora e semelhante às atitudes de seus antigos professores, relatadas em suas memórias enquanto aluna dos anos iniciais. Sobre os encaminhamentos à direção, questionei à Bela: o que a direção faz? B- Se é reincidente chamam os pais, se é a primeira vez fica ali pensando no que fez, depois liberam. Passo a tratar eles como eles são mesmo, de acordo com as suas características próprias. De repente os outros pegam e acham motivo para fazer o conflito aumentar ainda mais. Novamente “o caso” é encaminhado. A professora encaminha à direção e esta, por sua vez, encaminha aos pais numa tentativa de que estes resolvam o problema ocorrido na escola. A maior parte dos problemas disciplinares que ocorrem numa escola não cabe aos pais resolverem. Era necessário rever todo o conceito de autonomia, disciplina, aprendizagem, o “fazer pedagógico” dos professores, etc. Além disso, ao invés de relatar a “infração” aos pais, primeiramente deveria ser colocado o problema de forma objetiva e descritiva ao maior interessado, o próprio aluno, para ouvir o que 89 ele tem a dizer e quais as propostas que pode apresentar para resolver o mesmo. Dessa forma, no processo de resolução de conflitos e diante de situações de indisciplina, não basta somente fazer regras, que muitas vezes mascara o real problema ou dificuldade. É necessário que procure compreender os motivos, que seja feita uma revisão imparcial e profunda da questão, do contrário, está-se atuando apenas em cima das consequências e não na principal causa do mesmo (VINHA, 2003, p. 266). Concordo com Vinha (2003) que este seja o melhor encaminhamento dado aos conflitos disciplinares: problematização com vistas ao entendimento das causas e reflexão profunda e imparcial. Professora e alunos poderiam buscar juntos a resolução justa aos conflitos disciplinares, já que estão relacionados ao descumprimento das regras. Segundo Bela, “se é a primeira vez fica ali pensando no que fez, depois liberam”. Fiquei me questionando: será que eles realmente ficam pensando no que fizeram, sem a intervenção de alguém que problematize o acontecido, questione sobre os seus sentimentos, motive-os a se colocar no lugar do outro, a verbalizar e refletir sobre as causas e as consequências do conflito ou da violência? Pensando nessas questões, indaguei à Bela: a partir de seu “encaminhamento”, o que mudou nas atitudes dos alunos? B- Alguns não adianta mesmo, não mudam. Alguns melhoram, passam a ter mais confiança em mim. Outros precisam de mais tratamentos psicológicos aprofundados. Acho que muda bastante. Às vezes acho que exponho demais. Faço com eles se coloquem no lugar dos outros, como resolver conflitos, [...]. Às vezes eles veem o professor como um guarda, um robô, e eu mostro que não é assim. Eles passam a ter mais carinho contigo, pensam melhor antes de tomar uma atitude. Considerando as afirmações de Bela, perguntei aos alunos o que acontecia a eles caso não obedecessem às regras. A maioria dos alunos (onze meninos e oito meninas) relatou que, se não obedeciam às regras, eram mandados para a direção. Apareceram, também, outras formas de castigo apontadas pelos estudantes, como: assinar o caderno (na direção), ficar sentado no banco, bilhete (para os pais) no caderno e sair da aula. Perguntei, ainda, aos alunos se todos sempre obedeciam às regras da professora. Dez meninas responderam que sempre obedeciam e duas responderam que nem sempre. Quanto aos meninos, dez responderam que sim, um respondeu não e três responderam que nem todas as regras eram obedecidas. Nas respostas, ficou evidente a existência de associação entre os encaminhamentos, os castigos e a desobediência às regras. Destaco algumas justificativas colocadas pelos estudantes que sempre obedeciam às regras: 90 R- Porque tem que respeitar senão vai para a diretoria; R- Se não obedeço posso rodar de ano; R- Para não ir de novo para a diretoria; R- Não quero ter má educação; R- Porque temos que obedecer; R- Por que é muito importante; R- Porque é divertido; R- Porque é “obrigativo”; R- Porque é bom obedecer às regras que os mais velho nos dão; R- Porque nunca fiz coisas erradas; R- Porque as regras têm que ser obedecidas; R- Porque daí não brigo com ninguém; R- Obedeço porque sim; R- Porque a professora manda; R- Porque desobedecer é ruim; R- Porque não gosto de ir para a secretaria; R- Porque antes eu não gostava dos meus colegas, agora eu me dou bem com eles; R- Porque eu sou muito educado e gosto muito da professora. Nas justificativas apontadas pelos alunos, chama a atenção o receio em serem mandados para a direção/secretaria e o medo da reprovação no final do ano como consequência da não obediência às regras. Na verdade se desejamos que a criança respeite as regras da classe porque elas são necessárias (ou pelo menos deveriam ser) para organizar os trabalhos, para que haja justiça, então, por que, quando as crianças não obedecem, nos valemos de procedimentos contrários a essa idéia, como castigos, retirada de amor, ameaças ou recompensas? Dessa forma, percebe-se, na educação das crianças, uma certa incoerência entre o que os adultos gostariam de ensinar e o que realmente ensinam, por meio das suas condutas, das respostas que são dadas diante das situações cotidianas. Não basta somente que a criança relacione-se bem, siga alguns valores, cumpra as regras [...] O principal está no por que ela faz (VINHA, 2003, p. 234). Dessa forma, as regras deveriam ser respeitadas e obedecidas por serem compreendidas pelos alunos e necessárias a estes. O medo dos castigos não poderia ser, então, a justificativa dos alunos para a obediência às regras. Vinha (2003) enfatiza que o essencial é por que o aluno cumpre as regras, por isso é relevante questioná-lo a este respeito. Alguns estudantes não sabiam justificar a obediência às regras, ou seja, não as compreendiam como algo necessário à boa convivência e à organização da aula. Para estes, as regras têm a representação de algo obrigatório, que deve ser simplesmente cumprido e não questionado por eles, afinal são ordens de um adulto que exerce certo domínio e autoridade sobre eles. Vinha (2003) afirma que o importante não é a obediência às regras externamente, pois isso pode ser conseguido com castigos, ameaças, punições, autoritarismos, recompensas, etc. O essencial é o processo pelo qual obtemos a cooperação da criança (p. 267). 91 Para a regra ser efetivamente significativa, precisa ser internalizada, assimilada pela criança. Assim, é preciso conseguir a colaboração da criança de forma a não coagi-la, mas incentivá-la a compreender as regras e saber justificá-las para os outros e principalmente para si mesma. Os alunos que nem sempre ou nunca obedeciam às regras justificaram sua opção desta forma: R- Às vezes não obedeço porque ela grita R- Porque tem umas (regras) que são “impossíveis” R- Não. Porque não sei. Em relação à primeira resposta, “às vezes não obedeço porque ela grita” aponta para o uso da linguagem como forma de violência. O tom de voz e a expressão que a professora usa são os principais motivos da recusa em obedecer às regras. O grito da professora gera resistências no aluno ao que ela estabeleceu como regra. Gritos são modelos negativos que podem ser imitados e facilmente incorporados pelas crianças. Para ele, não é esta a forma de comunicação que ele gostaria de receber da professora e, por isso, não faz questão de colaborar com ela. Nesse sentido, reforça-se que A professora deve ter sempre presente que o seu comportamento serve de modelo para a imitação, pois a criança tende a imitar os modelos que valoriza. Portanto, ela não poderá exibir comportamentos que não devam ser imitados pela criança. Assim, por exemplo, se a professora tem o mau hábito de gritar com as crianças, estas, por certo, imitarão esse comportamento e passarão a gritar umas com as outras (ASSIS, 2003, p. 129). A segunda resposta diz respeito às regras “impossíveis de serem cumpridas”. Esta aponta para o conceito de autonomia, proposto por Piaget (2003). Vê-se que o aluno sabe analisar criticamente o que considera uma regra “impossível de ser cumprida” e se posicionar diante disso. Sua “decisão” e tomada de consciência a respeito das regras mostra que não está submisso à coerção e tampouco disposto a obediência cega àquilo com que não concorda. Também parece não aceitar como justa toda e qualquer regra apenas porque foi exigida pela professora. É preciso ensinar os alunos a pensar, e é impossível aprender a pensar num regime autoritário. Pensar é procurar por si próprio, é criticar livremente e é demonstrar de forma autônoma. O pensamento supõe então o jogo livre das funções intelectuais, e não o trabalho sob pressão e a repetição verbal (PIAGET, 2003, p. 275). 92 Garcia e Puig (2010, p. 73) afirmam que “tem um comportamento autônomo aquele sujeito que, diante de um problema moral, se guia por critérios de consciência escolhidos livremente, resultantes de processos de diálogo e reflexão interna” (p. 73). A reflexão e o senso crítico são indispensáveis na elaboração de uma regra, pois auxiliarão a definir sua pertinência, utilidade e coerência. Não basta fazer regras, mas pensá- las como uma ferramenta que contribuirá para o desenvolvimento individual e coletivo, minimizando as violências e não as reforçando. Na terceira resposta, um aluno fala que não obedece às regras, mas não sabe o porquê. Talvez seja por não perceber sentido nestas, ou então, por nunca ter sido levado a refletir sobre elas. Pensar criticamente sobre as regras significa analisar para que, para quem e por quem foram criadas. Além disso, refletir sobre a diferença que as regras fazem na vida pessoal e grupal, qual a contribuição que trazem aos relacionamentos, às aprendizagens e ao ambiente no qual são colocadas em prática e/ou evidência. Para analisar a postura de Bela em relação às regras, se ela as pensa criticamente e se estas atendem as reais necessidades do grupo de alunos, indaguei-a a respeito de como as regras eram construídas. B- Nos primeiros dias de aula, converso, passo todas as regras que vamos ocupar o ano todo. São as regras de convivência e tem as regras de jogos. Depois reviso as regras para ver o que precisa mudar. Peço a opinião deles depois. Faço as regras de acordo com a minha experiência com os alunos. Passo um pouco da responsabilidade para eles, aí não tem o que eles discutirem. Bela, em relação às regras, parece estar centrada nas suas convicções. “Passo todas as regras”, “Peço a opinião deles depois”, “Faço as regras de acordo com a minha experiência” [...]. Considerando a fala de Bela “passo todas as regras”, indaguei aos alunos sobre como eram organizadas as regras. As respostas emitidas por eles confirmaram que é a professora quem impõe as regras. No questionário, vinte e quatro, dos vinte e seis alunos, afirmaram que é a professora quem cria as regras. Um aluno respondeu que é a professora e os alunos, e um disse que é o diretor. Além disso, ela é categórica ao afirmar que “coloca” as regras e não que as discute. Isso nos leva a pensar que as regras foram impostas pela docente, dificultando às crianças a conquista da autonomia. 93 Para chegar a uma verdadeira autonomia é preciso que ela compreenda as razões e os significados dessas normas. Assim sendo, as regras ou normas disciplinares nunca podem ser impostas pela professora. Toda vez que há necessidade de se determinarem as regras do jogo, ou seja, as normas que orientarão o funcionamento da classe, estas são decididas em conjunto. Porém, uma vez estabelecida uma norma, esta deve ser sempre cumprida. Tal procedimento exige uma coerência muito grande por parte da professora e das próprias crianças. Mesmo com relação às normas mais simples, tais como qual o comportamento que se deve ter no refeitório crianças e professores devem discutir e chegar a conclusões que implique o acordo mútuo entre ambas as partes (ASSIS, 2003, p. 199). Sendo assim, é pertinente que os educandos participem da elaboração das regras, discutindo suas finalidades e modificando-as sempre que necessário. Essa co-responsabilidade na construção e validação das regras fará com que os alunos sintam-se comprometidos com estas. Nash (1968) enfatiza que “oportunidades para que a criança participe ativamente do planejamento e da execução de seu programa escolar levá-la-ão a empenhar-se ainda mais, e em decorrência, a disciplinar-se” (p. 287). [...] Deve-se objetivar que os princípios subjacentes às regras a serem cumpridas pelo sujeito tenham como pressuposto os ideais democráticos de justiça e igualdade, bem como a construção das relações que auxiliem esse sujeito a “obrigar sua consciência” a agir com base no respeito a esses princípios, e não por obediência (ARAÚJO, 1996, p. 114). Entendendo a finalidade da regra, entenderá o sentido desta para si e para o grupo ao qual pertence. Para Bela, “a utilidade das regras é para que eles também se responsabilizem em se conscientizar de que as regras são para o bem de todos, do grupo. Para não estragar as aulas de Educação Física, porque não posso simplesmente ignorar as coisas”. Nas discussões sobre as regras, o professor pode enfatizar as razões para a criação das mesmas. Quando as próprias crianças fazem suas regras em resposta aos problemas que elas experenciam na classe, elas são mais propensas a tomar posse das mesmas. Elas estão também mais propensas a sentir necessidade de seguir essas regras, e dividir a responsabilidade em cumprir as mesmas com os outros (DE VRIES; ZAN, 2003, p. 222). Bela, declara:“reviso as regras para ver o que precisa mudar”. Essa aparente flexibilidade não corrobora com os princípios defendidos por Vinha (2003), que percebe como necessária a reflexão, a problematização e a modificação das regras para que efetivamente sirvam àqueles que as utilizam. O processo de construção de regras utilizado por Bela parece não atender a estes critérios expostos por Vinha (2003). 94 Ao rever e rediscutir as regras sempre que for preciso, ao modificá-las ou construir outras quando necessário, o professor está auxiliando a criança que uma norma não é boa ou ruim por si mesma, e que a validade dessa regra não depende da autoridade de quem a impõem, mas sim, da função que exerce para as pessoas que fazem uso dela; portanto, as pessoas podem mudar as regras (VINHA, 2003, p. 263). No que se refere às mudanças nas regras, Bela ressalta: “Quando coloco uma regra, cumpro. Mesmo que seja pela primeira vez, eu cumpro [...]”. Essa afirmação de Bela é significativa para pensarmos questões sobre o autoritarismo. Quando a docente assegura que, depois de colocada uma regra, ela cumpre, demonstra certa inflexibilidade em relação às mudanças nas regras, o que contradiz sua primeira fala “[...] depois reviso as regras para ver o que precisa mudar”. Ainda, no que tange às regras, indaguei aos alunos se já haviam recebido algum castigo por não obedecer a elas. Aos que responderam sim, foram apontadas algumas formas de castigo: assinar o caderno, receber nota baixa, ir para a direção, não participar da aula, ficar sem recreio, pais foram chamados à escola e advertência. Bela, ao ser questionada sobre o que fazia com os alunos que não obedeciam às regras, respondeu: B- É o que mais passo a responsabilidade para eles. Pergunto a eles mesmos o que fazer com quem não obedece às regras, já que eles concordam com elas. Geralmente eles me dão a opção que já tenho. Eles mesmos dizem: tirar da aula, tirar o recreio, levar para a direção, não deixar jogar futebol no final. Esta afirmação de Bela me reporta às práticas de sua professora de anos iniciais que, ao ver descumprida uma regra sua, mandava seus alunos para a direção e castigava-os. Vinha (2003, p. 267) é enfática: “ressalta-se que ser disciplinado não significa ser treinado a obedecer, mas sim compreender as razões de se comportar de um modo ou de outro. A disciplina é resultante e não pré-existente”. Sendo assim, é pertinente que as crianças entendam as regras e principalmente a sua finalidade. Quando a criança conseguir esta compreensão, terá avançado do estado de heteronomia, no qual a obediência se dá pelo respeito unilateral, para a moral autônoma, na qual a obediência se dá pelo autogoverno. A reflexão crítica acerca da finalidade da regra levará a criança a obedecer a ela ou não. A heteronomia é a moral da obediência, gerada pelo respeito unilateral que a criança tem pelo adulto. Desta forma, ela admite que uma regra deve ser cumprida, independentemente do que prescreve. A heteronomia conduz também a uma concepção objetiva da responsabilidade dos atos, os quais são avaliados não em função da intenção com que foram praticados, mas por estarem ou não de acordo com as regras estabelecidas. Na medida em que a criança passa a pensar com lógica, os conceitos de justiça, igualdade, reciprocidade, lealdade, adquirem um novo 95 significado para ela. Libertando-se do egocentrismo ela progride na conquista da moral autônoma que se caracteriza pelo autogoverno, pela reciprocidade (ASSIS, 2003, p. 179). Contudo, se os educadores desejam desafiar os estudantes na construção da autonomia, precisam ajudá-los também a desenvolver as noções de respeito mútuo, de justiça e de reciprocidade. Segundo De Vries e Zan (2003), “se nós quisermos desenvolver as convicções morais internas, devemos engajá-las em atividades nas quais podemos permiti-las de ser autorreguladas” (p.269). Nos jogos, as crianças têm possibilidades de construir seguramente seus sentimentos de obrigação com as regras. Sentimentos de necessidade moral sobre as relações com os outros se desenvolvem em jogos que demonstram como as crianças enfrentam questões de justiça, direitos individuais e razões para as regras. Elas podem praticar um respeito mútuo que é uma característica de cooperação e princípios democráticos (DE VRIES; ZAN, 2003, p. 269-270). Os jogos em grupo são uma ótima opção para promover o exercício das regras, da solidariedade, da cooperação, do respeito mútuo. É um momento de descentração, em que são postos os interesses da equipe, não apenas de um jogador. É a oportunidade de o egocentrismo dar lugar ao altruísmo, do só falar do professor à observação e escuta atenta dos alunos. na tentativa de compreender os conflitos e aprender com eles. Muitas vezes os alunos são ouvidos pelos educadores, porém, a intenção é discernir, através do conteúdo do que falam, o certo e o errado. Dar voz aos alunos pode ser uma forma não de maior controle, mas de favorecimento de um laço que permita a elaboração comum de regras, cujo objetivo não seja reprimir os conflitos, mas compor com eles (GUIMARÃES, 1996, p. 101). O aluno poder se expressar efetivamente, elaborar as regras da classe com professora e demais colegas pode ser uma oportunidade de todos compreenderem os conflitos e aprender com eles. Esse exercício de liberdade e democracia na sala de aula minimizaria também o autoritarismo da professora e reforçaria a sua autoridade. Bela afirma tentar resolver tudo e é enfática ao falar que é preciso ter autoridade sem autoritarismo. Em outros momentos, porém, contradiz-se afirmando que é preciso ser autoritária. No entanto, [...] Os autoritarismos estão na raiz de toda violência que venha a ocorrer em campo educacional. E muitas são as formas que o autoritarismo pode assumir, indo desde manifestações grosseiras e explícitas até expressões bastante dissimuladoras. De qualquer forma, os autoritarismos se caracterizarão sempre por uma fundamental indisposição ao diálogo (MORAIS, 1995, p. 57). 96 Apesar de muitos momentos de autoritarismos, também presenciei Bela parar a aula e conversar com os alunos. Ela problematizava situações conflitivas, questionando-as e fazendo-os refletir acerca do fato ocorrido. A professora perguntava como eles se sentiriam se fossem ofendidos pelos colegas e falava da importância de se colocar no lugar do outro e aceitar as diferenças. Alguns alunos se manifestavam e falavam dos seus sentimentos. Ela não obrigava ninguém a falar, mas oportunizava aos que desejavam, expressarem-se acerca do que estavam sentindo em relação aos colegas, às atividades e às regras. Outro aspecto a ser ressaltado sobre as regras está relacionado à pergunta feita aos alunos sobre quais as regras estabelecidas pela professora. Entre as mais citadas estavam: não brigar, não gritar, não dar chute, dividir o material, usar o uniforme. Também apareceram como proibições: palavrão, apelidos, xingamento, violências, agressões, sair sem permissão. Além disso, devia-se ter respeito, obedecer às regras e ouvir e respeitar a professora. Bela, quando indagada sobre as regras que estabelecia com suas turmas, relatou que utilizava dois tipos de regras: as de convivência e as de jogos. Tudo indica, pelas falas na entrevista e respostas nos questionários de ambas as partes, que os alunos de Bela têm muito claras as regras de convivência, principalmente a do respeito ao colega e à professora. Assim, o bom relacionamento entre os alunos foi uma das contribuições da prática da professora de Educação Física. Para ela, o diferencial da disciplina está na possibilidade de conversar sobre os relacionamentos já que não possui conteúdo fechado. B- [...] A educação física é um espaço onde podem (os alunos) se liberar bastante. Não tem essa de ficar sentados, conteúdo fechado. Como a educação física não tem conteúdo fechado, tem mais tempo de conversar sobre relacionamentos. Outra maneira é trazer brincadeiras diferentes que eles escolhem e fazem as regras, e jogos também. Fazer, dentro da própria brincadeira, que eles entendam que eles estão aprendendo, não só brincando por brincar. Fazer da brincadeira uma ferramenta de educação. Observei, durante as aulas, que a professora trazia uma diversidade de atividades durante as quais os alunos podiam se expressar livremente e também se colocar no lugar do outro. Foram jogos de tabuleiro, jogos em duplas, jogos em grupos e até um jogo para toda a turma participar. Principalmente nos dias de chuva, a turma ficava na sala, jogando um dos jogos que a professora trazia, ou sugeria algum outro jogo. Nesse sentido, indaguei aos alunos sobre as atividades. Em resposta, dezesseis disseram que somente a professora decidia quais atividades eram realizadas na aula. Dez alunos responderam que estas eram pensadas pela professora e pelos alunos. 97 Acredito que essas atividades tenham realmente contribuído para a liberdade de expressão e para minimizar os conflitos. Outra atividade que contribuiu também para a minimização dos conflitos foi a organização de uma gincana. Ela foi uma atividade de “fechamento”. Nela, os alunos puderam colocar em prática os saberes que aprenderam em um ano todo de atividades. Isso tudo favoreceu as relações interpessoais, criando um clima propício às aprendizagens de conteúdos e de valores, ou seja, a prática da professora de Educação Física pode sim contribuir para evitar e/ou minimizar os conflitos e as violências escolares. Além disso, Bela, disse que, em seu planejamento, previa atividades para trabalhar as questões conflituosas entre alunos. Ela assim exemplifica uma das atividades trabalhadas com as turmas: B- A gincana que eu fiz, não tem a ideia de competição, mas de conviver em competição. As brincadeiras eu planejo pelo que conheço dos alunos, imagino como cada um vai agir. Tem brincadeiras que não faço em determinada turma. Exemplo: a brincadeira de passar em baixo das pernas (túnel). Não faço para não haver constrangimento das meninas. Bela falou nas brincadeiras planejadas a partir do que conhece dos alunos, supondo possíveis reações. Em seu planejamento, evitou atividades constrangedoras, impossibilitando conflitos desta ordem na turma. Também se referiu à gincana que propôs à turma, com o objetivo de “conviver em competição”, ou seja, oportunizar situações de competição onde os alunos pudessem praticar a cooperação. É preciso também se criar na escola um ambiente social que proporcione às crianças as relações interpessoais que favoreçam a cooperação e não a competição. O ambiente social da escola deve ser propício para incentivar as relações entre as crianças e seus pares, entre as crianças de diferentes idades e com os adultos (ASSIS, 2003, p. 165). No entanto, é preciso atentar para que a competição não se transforme em um fator negativo e nem se torne um empecilho às relações e interações entre as crianças. Estas, às vezes, são instigadas a competir pela vitória com seus pares e, ao mesmo tempo, a cooperar com estes. Essa dualidade pode esconder intenções. Segundo Nash (1968), “essa ambivalência pede resultados por meio de uma espécie de competição disfarçada, que é muito mais difícil de manter do que uma competição aberta, ou o abandono da competição: a criança deve competir sem que pareça competitiva” (p. 154). No caso da gincana proposta por Bela, evidenciou-se (através das observações que fiz durante a gincana) a necessidade da cooperação com o colega e com o grupo. O respeito com 98 o coletivo e com o grupo “perdedor” foi também uma das exigências observadas por Bela durante a competição. Aprender a cooperar em situações de competição foi uma aprendizagem importante para as relações interpessoais e certamente um saber imprescindível para os alunos. Quando questionados sobre o que aprenderam nas aulas de Educação Física deste ano, foram salientados pelos próprios alunos os três condicionantes da relação pedagógica: o saber, as atividades e as regras. Porém, o destaque nesta questão fica para as aprendizagens de valores como: a amizade, o respeito, o trabalho em equipe, o não ser preconceituoso. Além de responderem que aprenderam a “ver de perto os conflitos” e “muitas coisas sobre as violências”, saberes para além dos conteúdos! As diferentes modalidades do esporte também apareceram como aprendizagens da disciplina, mas em número menor. Parece que as relações interpessoais foram trabalhadas de modo positivo e significativo para estas turmas. A maioria dos alunos afirmou que a Educação Física ajudou no relacionamento com os colegas. As justificativas foram as seguintes: R- Por causa dos trabalhos em grupo; R- Porque “eles” não brigam; R- Porque me ajudou a ser amiga de todos; R- Eu brigava com colegas e a educação física ajudou; R- Achava que meus colegas riam de mim e me chamavam de burra e a Educação Física mostrou que não é assim; R- Foi nas atividades; R- Porque eu me entendi com a “R”; R- Porque “eles” pararam de brigar, “eles” tem respeito e “eles” não são mais preconceituosos; R- Porque a gente brinca; R- Ajudou a me entender com a “J”; R- Porque nós trabalhamos em grupo; R- Porque a gente faz equipe para melhorar a gente; R- Porque tiveram que trabalhar em equipe e se conhecer melhor; R- Ajudou porque eu aprendi a ser educada, muito melhor. Nestas respostas, os alunos destacaram as aprendizagens de valores que são relevantes ao bom relacionamento entre colegas: a amizade, o respeito, o não ser preconceituoso e a educação. O trabalho em equipe/grupo apareceu como um fator determinante nas relações interpessoais. A educação deve também favorecer a cooperação entre as crianças, através de jogos e atividades que sejam desenvolvidas em grupo. Tais jogos e atividades são indispensáveis para que a criança tenha a oportunidade de confrontar o seu ponto de vista com o de seus colegas. (ASSIS, 2003, p. 129). 99 Alguns estudantes disseram que a Educação Física não os ajudou nos relacionamentos com os colegas. Outros não perceberam mudança no relacionamento com os colegas, pois continuaram se desentendendo. Ainda havia aqueles que citaram o recreio como lugar ou momento em que as possíveis aprendizagens da Educação Física não alcançam êxito. R- Porque eu nunca me dei bem com ninguém; R- Não. Eu brigo com a “S”; R- Não sei por que, mas acho que não; R- Não porque eu me entendia com todos os meus colegas; R- Não. Porque na hora do recreio sempre estão brigando com a gente. Novamente, percebe-se o recreio como um lugar e um momento intensificador das manifestações conflituosas, propício às ações violentas. Questiono se todas as aprendizagens construídas em sala de aula, ou no pátio (no caso da Educação Física) são destruídas ou ameaçadas por quinze minutos de convivência no pátio, longe do olhar do professor. Essa pergunta encontra resposta nas afirmações de alguns alunos quando ressaltaram que foram significativas as aprendizagens que tiveram nos esportes. Foram aprendizagens em relação à amizade, ao respeito e até aos conflitos e às violências. Foi ressaltada pelos alunos a importância dos trabalhos em equipe, dos jogos cooperativos e do respeito ao colega ao realizar as atividades. Realizadas tais análises, pode-se inferir que tive o objetivo de instigar, refletir e problematizar, mais do que afirmar, concluir ou responder definitivamente a qualquer questão com referência aos condicionantes da relação pedagógica. No entanto, fazem-se necessários alguns apontamentos a respeito desses condicionantes. As regras, pelo que percebi nas observações, na entrevista e nos questionários, na maioria das vezes, foram impostas e, algumas vezes, foram discutidas com o grupo de alunos. Quando elas não eram obedecidas pelos alunos, a professora tentava dialogar com eles e, não adiantando, encaminhava-os à direção. Percebi certa instabilidade da professora em relação às regras. Quando, algumas vezes, era solicitada por algum aluno a tomar uma atitude frente a uma situação conflituosa, ela parecia não escutá-lo. Por exemplo: se um aluno ofendia o outro com um xingamento, o ofendido falava para a professora e esta não lhe dava atenção. Outras vezes, parava a aula imediatamente e dialogava com o grupo acerca do ocorrido. Quanto aos encaminhamentos à direção, haveria necessidade de a professora superá- los através do diálogo com os envolvidos, no local do ocorrido, tentar entender os motivos da ocorrência e principalmente ouvir e acolher os sentimentos aflorados durante o conflito. É 100 importante também que os alunos sugiram o que pode ser feito para solucionar o problema. A solução partindo deles mesmos fará com que se responsabilizem e se comprometam em cumprir o acordado. Além disso, este exercício de refletir sobre o problema, suas causas, consequências e possíveis soluções oportunizará o pensar crítico e reflexivo do aluno, o desenvolvimento da autonomia, a descentração de si próprio e a cooperação. Isso tudo contribuirá na elaboração e execução das regras. Segundo o referencial teórico utilizado na pesquisa, a forma mais adequada de construir as regras é junto aos alunos, observando sua coerência, sua utilidade e finalidade. Ao permitir aos alunos a coautoria nas regras, estes se sentem responsáveis pelas mesmas e se percebem como parte do processo educativo. Excetuando as regras universais, as demais regras devem ser flexíveis e alteradas quando necessário. Caso contrário, não favorecerão o enfrentamento dos conflitos e das violências na escola. As atividades propostas pela professora foram ao encontro das necessidades dos educandos. Segundo eles, as atividades contribuíram para a aprendizagem dos conteúdos da Educação Física e também dos valores necessários à boa convivência. Ao propor as atividades, a professora enfatizava a necessidade de se colocar no lugar do outro e de não fazer a ele o que não se quer para si. Saberes estes que ultrapassam os muros escolares e acompanham o aluno em todo o lugar, minimizando as possibilidades de envolvimento em conflitos negativos que possam vir a se tornarem violências. As relações interpessoais nem sempre foram trabalhadas positivamente. Um exemplo disso foi quando os alunos foram mandados para a direção. Apesar disso, as atividades possibilitaram saberes como a alteridade e o respeito, que, sendo adquiridos pelas crianças, o auxiliá-las-ão a enfrentar as violências e os conflitos na escola. Estes poderão ser positivos se administrados adequadamente, favorecendo o crescimento social e pessoal. 3.2 Os conflitos e as violências Nesse subitem, problematizo a apresento as questões consequentes desta pesquisa. Elas versam sobre qual o entendimento que os alunos e a professora de Educação Física possuem sobre as violências e os conflitos escolares e como ela os trata. Primeiramente, a interlocutora assim definiu violências: “vai além da agressão física, as agressões verbais, o bullying mesmo”. E sobre os conflitos ela disse: 101 B- É não saber conviver com a diferença. São problemas de diferença entre meninos e meninas, entre os que sabem e os que não sabem, entre os que têm mais experiências e os que não têm, a diferença de habilidades. Às vezes o que tem mais habilidade chama o outro de bocaberta, não sei o quê”... A professora apresenta um conceito muito vago sobre os conflitos. Ela parece não ter a compreensão de que conflitos podem ser negativos e/ou positivos. Para Belmar (2005, p. 101) “o conflito é um processo natural da sociedade e um fenômeno necessário para a vida humana, podendo ser um fator positivo para a mudança e o crescimento pessoal e interpessoal ou um fator negativo de destruição”. Isso dependerá da forma de regulação dos conflitos. Burguet (2005, p. 42) acrescenta que há necessidade de valorizar positivamente os conflitos como ferramentas de mudança, de desafios para desenvolver respostas novas e soluções criativas. Na resposta de Bela, fica evidente que sua visão de conflitos é apenas a negativa, pois, em nenhum momento, ela os identifica como a possibilidade de mudança, de desafio ou de crescimento. Apenas associa-os às diferenças. Parece “sutil” a ideia apontada pela professora sobre as diferenças serem mesmo “a causa” da existência de conflitos na turma. Assim, podemos dizer que a professora não conseguiu definir conflitos e apontou apenas “as causas” da ocorrência dos mesmos. Entendo que a docente atribuiu a causa dos conflitos à competição de habilidades, idades, gênero, saberes entre os alunos. Desse modo, o conflito fica restrito apenas às diferenças. Bela entende, então, que as diferenças de gênero, de saberes, de experiências e de habilidades são geradoras de competições e, em extensão, de conflitos entre os educandos. Bela identifica também, como causas das violências e dos conflitos escolares, a família desestruturada, a falta de acompanhamento dos pais, a falta de limites, a falta de ações preventivas na escola, a falta de valores e o despreparo dos professores para lidar com estas situações. No entanto, grande parte dos alunos acredita que os conflitos e as violências acontecem na escola por causa dos apelidos, do bullying, das agressões físicas e verbais, dos ciúmes, provocações, porque um aluno quer ser melhor do que o outro e ainda porque não sabem ser educados. Chamou-me a atenção a fala de outros três meninos: R- Porque nem todo mundo obedece; R- Porque são gente desobediente R- Porque não obedecem às regras 102 As respostas apontam para uma questão que precisa ser pensada: a associação que estes três alunos fazem entre a ocorrência das violências e a falta de obediência às regras. Dessa forma, torna-se relevante perguntar: por que há alunos na turma que desobedecem às regras? Ou será que se referem aos que não obedecem às regras como alguém que, pela falta de entendimento e reflexão sobre as regras, não desenvolveu o respeito mútuo e, por isso, são, inconscientemente, disseminadores dos conflitos e das violências? Quando foi perguntado aos alunos o que entendem por violências na escola, evidenciou-se que a maioria as percebe, apenas ou principalmente, como a agressão física. Apenas dois alunos consideraram como formas de violência “ferir os sentimentos” e “tudo o que agride o outro”. Apareceram também: palavrão, xingamento, apelido, matar, bullying, agressão moral e brincadeiras de mau gosto. Com as respostas emitidas pelos alunos e descritas acima, destaca-se o fato de que poucos alunos possuíam a capacidade de perceber que as violências não são somente físicas, existindo, ainda, outras formas. Para tanto, é necessário desenvolver nas crianças esta sensibilidade para que saibam perceber os diversos aspectos peculiares e sutis que a violência apresenta. Indagados sobre quando ocorriam os conflitos e as violências, os alunos responderam que tais situações ocorriam quando havia violência física (soco, chute, empurrão) e quando “enticam” com os outros, quando chamam de “coisas feias”. Relataram também que as brigas e discussões ocorriam na sala de aula, no jogo, na fila, no recreio e na aula de Educação Física. Indagados ainda sobre como se sentiam quando ocorriam os conflitos e as violências, os alunos relataram que os sentimentos que surgem a partir dessas situações são bastante variados. Os sentimentos (dos alunos) de tristeza e de raiva são os mais fomentados pela presença dos conflitos e das violências na escola. No entanto, alguns alunos relatam que se sentem: mágoa, medo, ódio, pena, mal/ruim e chateados. Chama a atenção dois interlocutores que afirmam não se abalarem com os conflitos e com as violências. “Normal”; “Nem alegre, nem triste”. Acredito que este “posicionamento” possa ter duas interpretações: uma positiva, outra negativa. A interpretação positiva é que, por um lado, pode-se pensar que estes alunos conseguem manter certo “distanciamento” da situação, mantendo-se equilibrados ou imparciais frente a estas tensões. Não obstante, pode-se pensar que esteja havendo uma 103 insensibilidade para o fato e uma alienação às questões sociais que o cercam, que é uma interpretação negativa. Esta indiferença pode ser entendida também como a banalização das violências, considerando-as normais e não se importando se estas afetam, inclusive, seus amigos e colegas. Com isso, não quero exaltar como positivos os sentimentos de raiva e de tristeza manifestos por alguns. No entanto, podem significar uma reação contrária àquilo que está posto, uma discordância com os atos violentos. Será um desafio para o educador “trabalhar” estas expressões manifestas nos educandos, mas este processo logra resultados em longo prazo e nada tem a ver com “domesticação” de corpos aptos à obediência cega e à passividade. Pelo contrário, O professor não deve esperar uma classe de crianças silenciosas, comportadas, e nem mesmo que aspectos relacionados à personalidade de uma determinada criança, como ser mais sensível, nervoso ou irritadiço, transforme-se em curto espaço de tempo (VINHA, 2003, p. 249). Isso demanda tempo, paciência, flexibilidade, escuta e aceitação do outro. Implica também auxiliar o aluno no entendimento dos seus próprios sentimentos e na amenização da intensidade daqueles que prejudicam como a tristeza e a raiva. Questionados se são incentivados a falar sobre os sentimentos que surgem nos conflitos, dois alunos responderam que sempre; um outro não respondeu. Nove responderam que nunca e quatorze alunos responderam que às vezes são incentivados a falar sobre os sentimentos que surgem nos conflitos. O professor auxilia o autoconhecimento quando ajuda as crianças a refletirem sobre seus sentimentos e tendências de reação. Todavia, ele evita tomar partido, falar pela criança ou propor a resolução estimulando-as a descreverem por si próprias seus pontos de vista e sentimentos, favorecendo a coordenação dos mesmos (porém quando surge um impasse e elas não apresentam nenhuma alternativa, o adulto pode oferecer uma sugestão; após propô-la e perguntando à criança se concordam com a sugestão apresentada, se é justa, se alguém tem outra idéia...). A escola deve ajudar a criança a controlar seus impulsos, tornando-a apta para refletir sobre as conseqüências de seus atos. Isto envolve a descentração e a reciprocidade, condições necessárias para considerar perspectivas e os sentimentos dos outros (VINHA, 2003, p. 237). Bela ressalta a importância de se trabalharem os relacionamentos desde os anos iniciais. Ela enfatiza dizendo “Nas séries iniciais é muito importante trabalhar os conflitos”. Sastre e Moreno (2005) corroboram com o pensamento da professora e dizem que “a aprendizagem de resolução de conflitos deve começar desde as idades precoces” (p. 71). 104 B- Acho que tem que ser trabalhado desde os anos iniciais os relacionamentos e conflitos porque na adolescência é mais difícil, já jogam futebol sem regras, são mais independentes. Perguntei aos alunos: você já presenciou ou viveu uma situação de conflito ou violência na escola? Em sua opinião, porque este conflito aconteceu? Por quem e como foi resolvido? A opinião das meninas foi bem dividida. Seis disseram ter presenciado ou vivenciado tais situações; as outras seis meninas disseram o contrário. As respostas afirmativas assim se explicaram: R- Porque “eles enticam” com a gente. A professora xingou eles. R- Porque a conversa para “eles” não existe. Foi resolvido na direção; R- Porque “eles” brigaram. Não foi resolvido; R- Não sei por quê. O diretor resolveu; R- Quem resolveu foi à orientadora; R- Por causa de xingamentos e apelidos. A orientadora resolveu. Entre os meninos, apenas dois relatam não ter vivenciado ou presenciado conflitos e violências na escola. As respostas dos demais apontam, na maioria, para a resolução destes pelo diretor da escola, ou, em alguns casos, não foi resolvido. R- Porque eu não quis dar a resposta da prova. O meu colega que resolveu; R- Por causa de xingamentos. Ninguém resolveu, acabou sozinho; R- Foi resolvido por uma forma de não brigar; R- Aconteceu por “botar” nome e foi resolvido pelo diretor; R- Na direção; R- Sim. O guri não parava de dar coice na minha bunda; R- Por causa de agressão verbal. Ninguém resolveu; R- A diretora colocou nós na secretaria; R- Porque um chamou o outro de vagabundo. Foi resolvido pelo diretor; R- Porque eles não gostavam um do outro. O diretor resolveu Bela diz já ter presenciado briga entre alunos, agressão física e verbal, bullying, ameaça, desrespeito ao professor e aos colegas, preconceito e furto. Segundo ela, a condução à direção, a chamada dos pais à escola, tirar do jogo/atividade e a tentativa de resolução com os alunos, são os encaminhamentos dados às situações de violências e conflitos na escola e em suas aulas. “Entre alunos e professores, só má criação, falta de respeito, de bater boca. Agressão física nunca presenciei. Entre os alunos é diário, tu tens que estar controlando sempre: é apelido, xingamentos, brigas”, ressalta Bela. Indaguei, então, o que seria estar controlando? B- Não deixar o conflito aumentar. Parar a aula, conversar e fazer eles entenderem que aquilo ali é uma bobagem, que não vale a pena. Quando coloco uma regra, cumpro. Mesmo que seja pela primeira vez eu cumpro, para os reincidentes 105 perceberem esta segurança. Não tem os “protegidos”, os “estudiosos”, cumpro. Custo a tirar da sala de aula, quando vejo que vou perder a autoridade levo para a direção. Não discuto na frente dos outros, nem bato boca. Eles têm resposta pra tudo, aí tu ficas nervosa, não dá para ser na frente da turma. Mas tento resolver tudo. Tem que ter autoridade sem autoritarismo. Esta fala da professora nos permite algumas reflexões. Para começar, o que ela considera apenas como uma “bobagem”, para os alunos pode não ser. Entendemos que os conflitos acontecem geralmente por opiniões distintas acerca de determinada situação e sempre manifestam os sentimentos dos que neles estão envolvidos. Isso já é um bom motivo para não serem considerados como uma bobagem. No entanto, a professora pode ter se expressado mal e ter desejado, transmitir a ideia de que o “não vale a pena” seria uma forma de amenizar a situação e não reforçar a violência. Ao se referir ao cumprimento das regras, Bela afirma não dar preferências “aos estudiosos” ou “aos protegidos”. Porém, ao falar “quando vejo que vou perder a autoridade, mando para a direção”, a professora declara delegar a outrem o que seria de sua responsabilidade. A falta de segurança é expressa quando afirma ficar nervosa quando precisa tomar uma atitude frente à turma, no entanto diz sempre cumprir as regras para os alunos perceberem esta segurança. Nos momentos em que é necessário mostrar autoridade, quando é preciso colocar uma limitação ou revalidar uma regra não negociável, uma sugestão é de que o educador seja lacônico e direto. O exercício da autoridade requer brevidade, firmeza [...] Os conflitos não devem ser motivos para se perder tempo com discussões estéreis e reações exageradas. Deve-se procurar evitar desgastes desnecessários, não os encarando como tragédias e nem tampouco desencadear discursos, lições de moral ou grandes reflexões. Assim como evitar as discussões, os sermões, as explicações longas e também os “porquês” sem respostas, como os de motivação psicológica (“Por que você é sempre tão agressivo?”). A fala do adulto será levada mais a sério se for objetiva, breve (VINHA, 2003, p. 243). Bela afirma a presença de líderes negativos nas turmas em que trabalha e afirma não sentir-se preparada para lidar com conflitos e violências. Apesar de não sentir-se preparada para lidar com os conflitos, afirma que previne e trabalha os conflitos e que os alunos falam de seus sentimentos com ela. Belmar (2005) expressa que O conflito é uma situação de oposição consciente entre duas partes e é um processo natural da sociedade, podendo ser um fator positivo de mudança e desenvolvimento pessoal e social. Entretanto, se não é regulado no sentido de sua resolução adequada, pode engendrar ações de violência em seus diferentes tipos. Os conflitos são resolvidos conhecendo-se suas causas e compreendendo sua formação e seu desenvolvimento (BELMAR, 2005, p. 111). 106 Sendo assim, percebe-se a importância de o educador estar preparado para o enfrentamento dos conflitos a fim de regulá-los positivamente e evitar que se transformem em violência. Nesse sentido, Sastre e Moreno (2005) ressaltam que É freqüente que a demanda dos professores que desejam ser formados na resolução de conflitos para aplicá-lo nas aulas aumente quando os conflitos tomam tintas de violência entre seus alunos. É preciso dizer que não existem fórmulas mágicas para resolver esses problemas na sala de aula, de maneira imediata, mas existe, sim, a possibilidade de realizar um processo educativo que permita aprender a resolvê-los de maneira não-violenta. Ou seja, existe a prevenção da violência e a formação cognitivo-emocional, a qual permite sua adequada resolução (SASTRE; MORENO, 2005, p. 71). A resolução de conflitos de forma não violenta e o trabalho de prevenção das violências foram parcialmente percebidos na prática de Bela. Seu discurso em prol da boa convivência e do respeito mútuo era constante, porém, algumas vezes, não era o suficiente. Por isso, no intuito de descobrir se para os alunos a Educação Física ajuda a reduzir as violências na escola, indaguei-os. Vinte e um alunos responderam que sim, quatro responderam que não e um respondeu que às vezes ajuda, às vezes não. Dentre aqueles alunos que responderam que a Educação Física ajuda a reduzir as violências, destaco algumas respostas que justificam essa ideia: R- “Porque tem esporte” R- “Porque tem trabalho em grupo R- “Porque a Educação Física ensina que com a violência não ganhamos o que queremos R - “Porque ensina regras” R - “Porque tem brincadeiras” Surge aqui a associação do esporte, do lúdico, do trabalho em equipe, das regras e dos valores como fatores preventivos e/ou minimizadores da violência na escola. Consciente ou inconscientemente, os alunos já têm a noção de que os condicionantes da relação pedagógica (atividades, saberes e regras) influenciam positivamente nos comportamentos, minimizando os conflitos e as violências. Os alunos que responderam afirmando que a Educação Física não reduz as violências na escola se referiam à hora do recreio e quando estavam no pátio, lugar onde brigavam muito. A exceção foi uma aluna que disse “Não, por que a Educação Física é só para aquecer”. Bela estabeleceu algumas relações entre a prática pedagógica do professor de Educação Física e as situações de violências e de conflitos na escola. 107 B- Não é só por isso (prática do professor de Educação Física) que tem violência. Na aula de Educação Física é onde eles mais se expressam, se extravasam. A diferença de idade, por exemplo, tu não podes tratar os maiores como criancinha. O conteúdo tem que ser muito reciclado, variado para chamar a atenção de todos. As brincadeiras têm que ser variadas, que atraia até os grandes. Tem que levar em consideração tudo, o conteúdo [..]. Tem que conversar, deixar o aluno contar tudo, e a Educação Física tem essa liberdade. Na entrevista, a professora relacionou, como se pode perceber, a prática pedagógica àquilo que ela considera relevante de ser observado e trabalhado em sua disciplina, como: a diferença de idade e de interesses, os conteúdos e as brincadeiras. Quanto aos conflitos e às violências, deixou a desejar, tangenciando o assunto. Os conflitos nem foram mencionados e, quanto às violências, a resposta foi vaga, apenas lembrou que não é só nas aulas de Educação Física que há violência. Já, no questionário, quando perguntada sobre as contribuições da prática do professor de Educação Física, ela destacou que a sua prática pedagógica contribui para: evitar os conflitos entre os alunos, evitar as violências na escola, trazer socialização, interação e melhor relacionamento entre colegas, trabalhar os conflitos com os alunos, trazer cooperação, competição e solidariedade, levar os alunos a aprenderem a modificar as regras e trazer a autonomia. Segundo o relato de Bela, sua prática contribui para além dos conteúdos e técnicas, que, aliás, nem foram mencionados nessa parte da entrevista. Não foi ressaltada por Bela nenhuma modalidade esportiva em especial, tampouco uma metodologia utilizada. Suponho que, com sua prática pedagógica, ela almeja trabalhar mais a “humanização” dos alunos, as relações interpessoais e a boa convivência entre a turma, sem descuidar dos conteúdos e sem focar somente estes. Bela afirmou que sua prática contribuiu, entre outras coisas, para evitar os conflitos e as violências, para despertar a cooperação, a solidariedade e para o melhor relacionamento entre os colegas. Assim, entendeu-se que, seu “fazer pedagógico” contribuiu também para o surgimento de sentimentos como: a amizade e o amor. O amor, como reconhecimento e aceitação do outro como ser humano integral, é a pedra angular e a dinâmica do edifício educacional; e o amor tem como sua exigência mais nuclear a indispensabilidade do diálogo. O mais autêntico trabalho educacional exige paciência, benignidade, ausência de soberba e inveja, trata-se de sempre “batermos à porta” dos educandos, sem omissão; se eles não quiserem abrir a porta para acolher-nos, terão feito escolha pelos precários relacionamentos objetais. Mas se se abrirem ao encontro humano (o que vale também para o educador), um fecundo EU-TU minimizará, ou até mesmo neutralizará, nossos impulsos violentos (MORAIS, 1995, p. 75). 108 Sendo assim, a aceitação do outro exige amor e diálogo e, para educar efetivamente, aceitar e reconhecer o outro como diferente e único é indispensável. Garcia e Puig (2010, p. 50) afirmam que “a relação de acolhimento e a atitude de aceitação também aludem à intenção de colaborar por meio da qual o adulto se coloca a serviço das crianças, para ajudá- las tanto quanto possível”. Quando o aluno percebe-se aceito e incluído, a tendência é de que ele mantenha bom relacionamento entre seus pares e com os seus professores. No entanto, se rejeitado e excluído, possivelmente a rebeldia e as resistências se façam presentes em seu cotidiano, pois percebe quando seus professores não estão sendo verdadeiros. Por isso, Morais (1995) afirma que “os educadores que cumprem uma vocação, e não mentem a si mesmos nem a seu povo, podem ser artífices privilegiados de uma sociedade menos violenta” (p. 110). O educador não é o único responsável pelas violências presentes na escola, mas, como educador, tem a oportunidade de fazer um trabalho diferenciado. Sendo assim, ele pode desafiar seus alunos na construção de valores como a tolerância, a justiça, o respeito mútuo, a dignidade, a justiça, o amor. Aprendizagens estas apreendidas pelo exemplo, pela persistência, pela comunicação franca e pela forma como os conflitos são trabalhados e resolvidos em sua sala de aula. Considerando essa ideia, perguntei aos alunos se estavam satisfeitos com a forma como foram tratados e resolvidos os conflitos e as violências na Educação Física. Sete meninas responderam que sim, quatro responderam que não e uma respondeu que se encontra “mais ou menos” satisfeita. Entre os meninos, apenas três não estão satisfeitos. Os onze que responderam estar satisfeitos com a forma como os conflitos e as violências eram tratados e resolvidos na Educação Física assim se expressaram: R- A professora resolve e “eles” ficam amigos; R- Pararam de brigar. Ela “botou” regras; R- As professoras ficarem cuidando, sempre; R- É ter um trabalho mais rígido; R- Estou satisfeito porque está sendo resolvido o problema; R- Pelo que era antes[...]. Antes os professores ficavam só olhando e depois resolviam; R- Porque daí ninguém briga; R- Resolve muito; Perguntei, ainda, aos alunos qual seria a melhor forma de resolver os conflitos e as violências na escola. As respostas das meninas foram as seguintes: 109 R- Seria melhor apertar a mão e dar um abraço; R- “Botando” regras e sendo amigos; R- Fazer amigos e não brigar; R- Se a professora não conseguir resolver, ela dá suspensão; R- Tinha que ser mais rígido, se o aluno fizer as coisas de outra forma; R- As pessoas tinham que ser mais educadas e ter um pouco mais de respeito; R- Expulsar aquele que traz violência; R- Pelo diretor; R- Falando que não é para fazer isso. As respostas dos meninos não se diferenciaram muito das respostas das meninas. Alguns sugeriram castigos como: nota baixa, suspensão, expulsão, encaminhamento à direção. Outros sugeriram, como alternativa para a resolução de conflitos: o diálogo, o pedido de desculpas e o trabalho em equipe. A seguir, estão as respostas dadas pelos meninos: - Deixando todos os que brigam na direção; - Tirarem os alunos da escola; - Ninguém podia brigar; - Dando um castigo; - Fazer trabalho em grupo; - Todos os que brigam serem suspensos; - Na direção; - Chamar os pais; - Conversando com o aluno; - Pedindo desculpas para o colega; - Dialogando com os alunos; - Suspendendo; - Dar nota baixa e deixar sem participar da aula. É importante destacar a sugestão advinda de um menino para a resolução de conflitos e violências. Ele expressou a ideia de que o “agressor” faça um pedido de desculpas ao agredido/ofendido/violentado. Tognetta e Vinha (2008) alertam para o cuidado que o educador deve ter caso proponha entre seus alunos algum tipo de reconciliação. Para elas, [...] “o pedido de desculpas precisa ser motivado por quem foi o alvo do problema: é preciso perguntar à vítima se ela se sentiria melhor se o agressor lhe pedisse desculpas” (p. 213). Destaco também outra proposta feita por um aluno. Ele acredita que o trabalho em grupo possa amenizar as violências na escola. Considero esta proposta positiva e importante, pois muitas são as contribuições que resultam deste recurso educativo. O método do trabalho em grupo consiste numa organização de trabalhos em comum... A experiência mostra que os fracos e preguiçosos não são abandonados à própria sorte, são então estimulados e mesmo obrigados pela equipe, enquanto os adiantados aprendem a explicar e dirigir, muito melhor do que se permanecessem na 110 situação de alunos solitários. Além do benefício intelectual e da crítica mútua e do aprendizado, da discussão e da verificação, adquire-se desta forma um sentido da liberdade e da responsabilidade conjuntas, da autonomia na disciplina livremente estabelecida (PIAGET, 2003, p. 278). Apesar de algumas opiniões serem favoráveis à solução pacífica dos conflitos e das violências, são preocupantes as expressões dos alunos que são favoráveis aos castigos e punições aos “infratores”. Inúmeras foram as sugestões de expulsão, suspensão, castigos, baixa na nota, entre outras. Estas formas de “solução”, além de não resolverem conflitos, legitimam e mascaram as violências latentes e ou explícitas. Quando perguntei à Bela que tratamento havia dado às situações de conflitos e violências e como agiu diante destas situações, ela assim respondeu: “tento resolver ali mesmo na turma. Se não consigo, encaminho para a direção para não perder a autoridade e ficar discutindo na frente dos outros”. Novamente, surge na fala da interlocutora, a expressão autoridade atrelada ao encaminhamento à direção. Sobre alunos difíceis e conflituosos, a professora fez o seguinte comentário: “Tem que colocar limites, ser autoritária e ao mesmo tempo descobrir a história do aluno, o porquê de ele estar agindo assim. Quando tem platéia, eles querem chamar mais a atenção”. Para finalizar, destaco alguns aspectos significativos no que se refere aos conflitos e às violências. Notei que os alunos estão divididos em suas opiniões. Alguns estão satisfeitos com a forma como têm sido tratados os conflitos e as violências pela professora; outros não compactuam com essa idéia. A maioria dos alunos compreende violências apenas como as manifestações de agressão física. Poucos a percebem também como agressão moral e psicológica. Entendem que os conflitos surgem de provocações por parte de alguns colegas e também porque estes não obedecem às regras e não sabem respeitá-las. Quanto à professora, entende as violências para além das agressões físicas, mas restringe os conflitos às manifestações que ocorrem devido às diferenças entre os alunos. Não concebe a idéia de o conflito poder ser positivo e contribuir para o crescimento e desenvolvimento pessoal e social, se bem regulado e trabalhado. A forma como a professora entende e como trata os conflitos e as violências, de certa forma, está favorecendo o enfrentamento destes na escola, pois enfatiza e trabalha muito as relações interpessoais e os valores morais com as turmas. No entanto, poderiam ser criados mais espaços para serem trabalhados os sentimentos dos alunos. CONSIDERAÇÕES PARA NÃO FINALIZAR Com base no referencial teórico apresentado neste estudo e também na análise dos dados coletados, apresento, a seguir, algumas considerações que percebo relevantes para serem discutidas. Ressalto que o objetivo maior é a problematização e a reflexão sobre a temática. Em momento algum tive a pretensão de realizar prescrições para a escola ou para a professora. Pelo contrário, acredito que a escola deva procurar administrar os conflitos a partir do seu contexto, da sua realidade e de acordo com a necessidade de sua clientela. Enfatizo também que compreendo a escola apenas como um dos espaços de socialização dos alunos. Apesar de ser muito influente na construção da personalidade moral da criança, ela não é a única responsável pela geração ou pela solução de todos os conflitos e de todas as violências ocorridas com as crianças. Penso que o trabalho do pesquisador seja mais instigar do que concluir ou afirmar. Parar a ação para refletir, não procurando culpados, mas provocando certa inquietude a respeito daquilo que se pode modificar na prática pedagógica. Nesse sentido, em relação à professora e a sua prática docente, não fui levada pela presunção de querer julgá-las, criticá-las e, tampouco, de querer lhes apontar erros e acertos. Pelo contrário, aprendi muito com a professora participante que, desprovida de qualquer vaidade ou egoísmo profissionais, partilhou generosamente comigo seus saberes apreendidos nos bancos escolares e na vida. A professora colaborou com a pesquisa efetivamente. Mostrou-se solícita às questões, teceu comentários sobre a temática e sempre estava disposta a ensinar e a aprender. Além disso, aceitou dividir comigo o carinho e a atenção das três turmas de alunos do quinto ano com as quais trabalhava. Aprendi muito com os alunos também, com as suas histórias, com seus anseios, com suas dificuldades, limitações, e com suas superações. Enfim, com suas especificidades. Surpreendeu-me, em especial, uma menina que, durante toda a observação, estava no centro dos conflitos e das violências, sempre envolvida como agressora ou como agredida. No último dia da minha presença na escola, ao terminar de responder ao questionário, ela me abraçou e me agradeceu a oportunidade de falar sobre os seus sentimentos, dizendo que nunca tinha falado “sobre isso” com ninguém. A sensação que tive foi de que a menina sentia-se aliviada por poder se expressar e dividir com alguém os seus anseios. Seus olhos brilhavam e ela parecia muito feliz. 112 A reação dos demais alunos em colaborar com a pesquisa também foi positiva. Participaram com interesse, demonstraram que gostaram de refletir e falar sobre os conflitos e sobre as violências na escola. Ser ouvido por alguém e saber que seu ponto de vista e sua opinião sobre determinado assunto é importante e interessa a alguém eleva a autoestima, principalmente das crianças. Elas muitas vezes são ignoradas ou “invisíveis” aos adultos, algumas vezes tidos como os detentores do saber e da verdade. Para alguns alunos, participar da pesquisa parece ter sido uma oportunidade de desabafo e até mesmo de se colocar no lugar do outro. A inversão de papéis, a alteridade e a introspecção são técnicas relevantes na administração dos conflitos. Estar inserido no universo escolar em si já é um grande aprendizado para todos os integrantes desse cenário complexo, mas gratificante. Não existe a possibilidade de um pesquisador chegar a uma escola para observar o trabalho de um professor e determinadas turmas isoladamente. O contexto todo ali presente ensina muitas lições: as condições da escola, os materiais utilizados, o coletivo de professores, de alunos e de serventes, o currículo oculto, as regras, os valores, a organização geral, a participação da família ou a falta dela, os sentimentos, os gestos, a cultura da escola, sutilezas que fazem a diferença para a melhor compreensão dos fatos e da realidade vivenciada pela comunidade escolar. Compreender se as regras, as atividades e os saberes auxiliam/favorecem no enfrentamento dos conflitos e das violências ou não é mais complexo do que parece. Nisso está implícito o entendimento do educador acerca do que são os conflitos e as violências e como trata/administra essas situações desafiadoras e reais. Como já afirmei anteriormente que o objetivo deste estudo é problematizar e não definir ou responder definitivamente às questões propostas, concluo, por hora, colocando apenas as minhas impressões acerca destas, enquanto pesquisadora. Observando o contexto todo da escola acredito que a forma como a professora trabalhou os condicionantes da relação pedagógica: o saber, as atividades e as regras, contribuiu parcialmente no enfrentamento dos conflitos e das violências. Não se pode dizer que Bela não tenha feito nada a respeito de tais situações. No entanto, não se pode afirmar o contrário, que sua prática tem sido efetivamente satisfatória no tratamento dos conflitos e das violências. Poderiam ser criados mais espaços para o diálogo e para a problematização dos sentimentos dos alunos envolvidos nos conflitos. 113 Dessa forma, poderiam ser oportunizadas reflexões acerca do ocorrido nos conflitos, com vistas ao entendimento das causas e de possíveis “soluções”. Isso evitaria ou minimizaria as chances de os conflitos tornarem-se violências. A forma como foram organizadas as regras são inadequadas de acordo com o coletivo de autores utilizados neste estudo de caso. A maioria das regras não está sendo construída com o grupo de alunos e, por vezes, a professora se mostra inflexível a estas. Isso desfavorece ou retarda o desenvolvimento da autonomia e da autorregulação nos alunos, que se acostumam à obediência cega e ao não questionamento dos fatos. Além disso, a não participação nas decisões da aula inibe o desenvolvimento do senso crítico e da reflexão, o que leva os alunos a naturalizarem-se com o respeito unilateral e a conformarem-se com a heteronomia. A forma como a professora abordou as atividades e os saberes contribuiu parcialmente para o enfrentamento dos conflitos e das violências. Durante as aulas, foi ressaltada, a todo o momento, a importância e a necessidade do respeito ao outro, do colocar-se no lugar do outro, da boa convivência e dos valores. No entanto, somente o discurso é insuficiente. Poderiam ter sido promovidas mais atividades que pudessem desafiar os alunos na construção de valores. Em diversas ocasiões, foram realizadas atividades em equipe que promoveram a interação, a socialização e a cooperação entre os alunos. Porém, como já disse anteriormente, a escola é apenas um dos meios em que a criança convive, portanto não pode ser a única responsável por todo o aprendizado dos valores. É preciso uma parceria entre a escola, a família e toda a comunidade escolar. Quanto à administração dos conflitos e das violências, a educadora mostrou-se instável. Em algumas situações, parava a aula e discutia com a turma ou somente com os envolvidos numa tentativa de solucionar com estes o conflito. Esta forma de agir, para os autores citados no estudo, é o procedimento coerente. Em outros momentos, ela pouco dialogava e encaminhava os alunos à direção para que a equipe diretiva resolvesse o problema que surgiu na sua disciplina, durante as suas aulas. Acredito que os educadores poderiam investir mais no trabalho preventivo dos conflitos e das violências. Criar espaços pedagógicos reflexivos onde pudessem ser evidenciados os sentimentos que afloram das relações interpessoais poderia ser uma das opções de trabalho da escola. No ano de 2010, durante o período em que fiz a Docência Orientada, eu e outra colega, ministramos a um grupo de acadêmicos do curso de Pedagogia da UFSM uma disciplina chamada Prática de Pesquisa A, sob coordenação da Professora Lúcia Dani. Nesta 114 disciplina, criou-se um espaço pedagógico reflexivo, onde partilhamos conhecimentos e problematizamos questões referentes aos conflitos e às violências emergentes da relação pedagógica. Nessa oportunidade, a Professora Lúcia Dani também orientou os acadêmicos em relação ao trabalho de campo, às entrevistas e questionários, os quais eles puderam participar aplicando-os e analisando-os. Essa idéia de criar espaços pedagógicos reflexivos está registrada no projeto de extensão intitulado “Conflitos, sentimentos e violências na Escola” que a professora Lúcia Dani (2009) escreveu e desenvolveu para uma escola estadual da cidade de Santa Maria - RS. Mas, para que isso ocorra, antes é necessária uma melhor preparação dos docentes durante a sua formação inicial. Aprender a reconhecer os conflitos e a diferenciá-los das violências é importante, mas não é o suficiente. É preciso aprender a administrá-los de forma correta e a aprender a lidar com eles para, assim, criar novas estratégias de tratamento, evitando que se tornem violências. As violências também precisam ser vistas como tais e tratadas de acordo com a sua intensidade. O professor não pode fazer “vista grossa” ao que para ele parece uma bobagem, mas que para o aluno não é. Não cabe ao professor banalizar nem mesmo as pequenas grosserias e gestos indelicados entre alunos. É necessário que sejam discutidos, refletidos e que os alunos sejam levados a pensar em alternativas de gerir tais situações. Por tudo isso, ao refletir sobre as questões deste estudo de caso, penso que a forma como foram trabalhados os condicionantes da relação pedagógica pela professora e seu entendimento acerca dos conflitos e das violências e sua administração destes contribuiu, de alguma forma, para o enfrentamento dos conflitos e das violências. Porém, poderiam ser intensificados os trabalhos para a valorização dos sentimentos dos alunos e para a sua participação na elaboração e na modificação das regras. Dessa forma, estaríamos evidenciando a humanização dos alunos e ajudando-os a formar e consolidar os sentimentos de cidadania e democracia. 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Para: Direção da Escola Municipal de Ensino Fundamental < Nome da Escola> Da: Profª Drª Lúcia Salete Celich Dani Prezado (a) Senhor (a) < > A mestranda Márcia Simone da Silva Bordin, acadêmica do Curso de Mestrado em Educação do Programa de Pós-Graduação em Educação /CE/UFSM está desenvolvendo um projeto de pesquisa sobre “A relação pedagógica e o enfrentamento das violências na escola” sob minha orientação. Nesse sentido, com o desejo de concretizar a pesquisa na escola sob sua direção, solicito a colaboração para que a mestranda possa realizar observações em sala de aula, entrevista com a professora de Educação Física e questionário com os alunos de três turmas de sua escola. Desde já, agradeço sua compreensão. Atenciosamente. ____________________________________ Profª Drª Lúcia Salete Celich Dani APÊNDICE B AUTORIZAÇÃO DA ESCOLA PARA A REALIZAÇÃO DA PESQUISA PREFEITURA MUNICIPAL DE SANTA MARIA SECRETARIA DE MUNICÍPIO DA EDUCAÇÃO E.M.E.F. Autorizo a realização dos procedimentos investigativos (observação das aulas, entrevista com a professora e questionário com os alunos) que contribuirão no Projeto de Pesquisa intitulado A relação pedagógica e o enfrentamento das violências na escola, desenvolvido pela aluna Márcia Simone da Silva Bordin, sob orientação da Profª. Drª. Lúcia Salete Celich Dani. Este projeto tem por objetivo investigar quando e como a prática pedagógica da professora de Educação Física contribui no enfrentamento das violências e dos conflitos. Os participantes da pesquisa serão: uma professora de Educação Física e três turmas de quinto ano. ___________________________________________ Assinatura da Direção Santa Maria, APÊNDICE C TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO À PROFESSORA PARTICIPANTE UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO MESTRADO EM EDUCAÇÃO TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO À PROFESSORA (PARTICIPANTE DA PESQUISA) Pelo presente consentimento, declaro que fui informada, de forma clara e detalhada, dos objetivos e da justificativa do presente projeto de pesquisa, que busca investigar sobre “A relação pedagógica e o enfrentamento das violências na escola”. Tenho conhecimento de que receberei resposta a qualquer dúvida sobre os procedimentos e outros assuntos relacionados com essa pesquisa, terei total liberdade para retirar meu consentimento, a qualquer momento, e deixar de participar do estudo, sem que isso traga nenhum prejuízo. Autorizo para fins exclusivos dessa pesquisa a realização de entrevista estruturada e registro escrito das minhas considerações, na certeza de que se manterá o caráter confidencial das informações registradas, bem como serão ocultados os nomes dos participantes da pesquisa e o nome da escola na qual ela está sendo realizada. A pesquisadora responsável por este projeto de pesquisa é a Pedagoga Márcia Simone da Silva Bordin, que poderá ser contatada pelo telefone, < nº de contatos>. Concordo em participar desse estudo. Santa Maria, APÊNDICE D CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO AOS PAIS UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO MESTRADO EM EDUCAÇÃO Santa Maria, . Senhores pais ou responsáveis pelo (a) aluno (a) --------------------------------------- A aluna Márcia Simone da Silva Bordin, acadêmica do Curso de Mestrado em Educação do Programa de Pós – Graduação em Educação /CE/UFSM, está desenvolvendo um projeto de pesquisa sobre “A relação pedagógica e o enfrentamento das violências na escola”. Nesse sentido, com o desejo de concretizar a pesquisa na escola, pede a autorização para a realização de um trabalho escrito, realizado em sala de aula, com seu filho (a). Desde já agradeço a compreensão e colaboração. Atenciosamente. ----------------------------------------------------------------------------------- APÊNDICE E ROTEIRO DA ENTREVISTA SEMIESTRUTURADA (PARA A PROFESSORA) UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO MESTRADO EM EDUCAÇÃO Acadêmica: Márcia Simone da Silva Bordin Orientadora: Profª. Drª. Lúcia Salete Celich Dani Professor: 1. Nome: 2. Tempo de serviço: 3. Formação: 4. Série em que atua: 5. Escola Municipal ( ), Estadual ( ), Particular ( ) 6. Enquanto estudante de anos iniciais, quais as lembranças mais significativas das aulas de Educação Física, dos professores desta disciplina e das relações interpessoais estabelecidas? 7. Como eram resolvidas, pelo professor, as situações de conflitos, agressões e violências ocorridas na Educação Física? Temática: 1. Como você define “violências” na escola? 2. Como você define “conflitos”? 3. Que relações você estabelece entre a prática pedagógica do professor de Educação Física e as situações de violências e conflitos na escola? 4. Você já presenciou situações de violências e/ou conflitos entre seus alunos ou entre alunos e professores? 132 5. Que tratamento você deu a estas situações? Como agiu diante desta problemática? 6. A partir de seu “encaminhamento” o que mudou nas atitudes dos alunos? 7. Você acredita que a prática do professor de Educação Física pode contribuir para evitar e/ou minimizar essas situações? De que forma? 8. Em seu planejamento você prevê atividades para trabalhar as questões conflituosas entre alunos? Quais? 9. Quando e como são construídas as regras na sua disciplina? Qual sua utilidade? E o aluno que não segue a regra, o que fazer? 10. Fale sobre sua prática pedagógica, violências e conflitos na escola: dificuldades, limitações, perspectivas, possibilidades. APÊNDICE F ROTEIRO DO QUESTIONÁRIO (PARA A PROFESSORA) 1) Você já presenciou situações de conflitos ou violências em suas aulas? Quais? ( )briga entre alunos ( )agressão física ( )agressão verbal ( )bullying ( )ameaça ( )preconceito ( )desrespeito ao professo r ( )desrespeito aos colegas ( )furto 2) Quais encaminhamentos você dá às situações de conflitos e violências? ( )encaminha à direção ( )resolve com os alunos ( )deixa que os alunos envolvidos resolvam ( )chama os pais ( )encaminha à especialistas 3) Quanto aos conflitos, você: ( )previne ( )resolve ( )trabalha ( )impede ( )ignora ( )evita 4) Quanto às violências, você: ( )encaminha à especialistas (psicólogos, psicopedagogos, neurologistas, etc.) ( )encaminha à direção ( )chama os pais ( )resolve com os alunos ( )os alunos resolvem entre si ( )suspende ( )tira o recreio ( )tira do jogo/atividade 5) As relações interpessoais são levadas em conta na avaliação? O “bom comportamento” e a obediência às regras influenciam na nota? ( )sim ( )não 6) Na resolução dos conflitos e violências, você trata todos os alunos como iguais? ( )sim ( )não 7) Quem estabelece as regras na Educação Física? ( )professora e alunos ( )somente os alunos ( )somente a professora 8) Você acha que os alunos devem sempre obedecer as regras? ( )sim ( )não 9) Nas turmas em que trabalha, existem líderes negativos? ( )sim ( )não 10) Você se sente preparada para lidar com conflitos e violências? ( )sim ( )não 134 11) Você considera que sua prática pedagógica contribui para: ( )evitar os conflitos entre os alunos ( )evitar as violências na escola ( )os alunos aprenderem a obedecer regras ( )socialização ( ) interação ( )resiliência ( ) melhor relacionamento entre colegas ( )trabalhar os conflitos com os alunos ( ) cooperação ( ) competição ( )os alunos aprenderem a criar regras ( ) solidariedade ( )os alunos aprenderem a modificar as regras ( )autonomia 12) A que você atribui a causa dos conflitos e violências na escola? ( )família desestruturada ( )influência da mídia ( )falta de acompanhamento dos pais ( )situação econômica desfavorável ( )falta de limites ( )falta de ações preventivas na escola ( )falta de valores ( )regras impostas ( )despreparo dos professores para lidar com conflitos e violências ( )falta de interesse dos alunos pela escola ( )desmotivação pelo conteúdo trabalhado ( )má interpretação do ECA ( )falta de integração entre escola e comunidade ( )falta de recursos na escola ( )forma de avaliação ( )discriminação ( )preconceito ( )modelo de ensino tradicional ( )falta ou pouca ludicidade ( )desvalorização do ensino e da educação 13) Os alunos falam de seus sentimentos com você? ( )sim ( )não APÊNDICE G ROTEIRO DO QUESTIONÁRIO (PARA OS ALUNOS) 1) O que você entende por violências na escola? 2) A Educação Física ajuda a reduzir as violências na escola? Por quê? 3) O que aprendeu nas aulas de Educação Física este ano? 4) A Educação Física ajudou no melhor relacionamento entre colegas? Por quê? 5) Quando ocorrem conflitos e violências? Como você se sente? 6) Como são resolvidos os conflitos e as violências ocorridos na Educação Física? 7) Quais as regras estabelecidas nas aulas de Educação Física? 8) Quem cria as regras? 9) Você sempre obedece às regras? Por quê? 10) O que acontece se você não obedecer às regras? 11) Em sua opinião, porque ocorrem conflitos e violências na escola? 12) Você é incentivado a falar sobre os sentimentos que surgem nos conflitos? ( ) as vezes ( ) sempre ( ) nunca 13) Quem decide quais as atividades serão feitas nas aulas? ( ) somente a professora ( )somente os alunos ( ) professora e alunos 14) Você já recebeu algum castigo por não obedecer as regras? Se sim, qual? ( ) foi para direção ( ) assinou o caderno ( ) foi suspenso ( ) ficou sem recreio ( ) não pôde participar da aula ( ) ficou fora do jogo ( ) recebeu nota baixa ( ) seus pais foram chamados à escola ( ) recebeu advertência 136 15) Você já presenciou ou viveu uma situação de conflito ou violência na escola? Em sua opinião, porque este conflito aconteceu? Por quem e como foi resolvido? 16) Você está satisfeito com a forma como estão sendo tratados e resolvidos os conflitos e as violências na Educação Física? 17) Qual seria a melhor forma de resolver os conflitos e as violências na escola?