Hume e o problema da identidade pessoal
Resumo
Esta dissertação investiga o problema da identidade pessoal nos escritos de David Hume no
Tratado da natureza humana. Para isso, apresento a concepção humeana de eu no âmbito das
operações do entendimento e das paixões ou emoções, bem como duas controvérsias
interpretativas suscitadas a partir dela. Uma vez que Hume considera ininteligível a noção de
substância, e que nega que exista uma impressão que seja uma e a mesma ao longo de toda a
vida de alguém, ele considera, na seção Da identidade pessoal, imperfeita a atribuição de
identidade e simplicidade ao eu. Tudo o que temos acesso acerca da mente são as sucessivas
experiências ou percepções, relacionadas por meio de qualidades associativas, o que faz com
que tendamos a acreditar na unidade do eu. Se há algo além das percepções sucessivas que as
une, não é possível descobrir através da experiência. A primeira controvérsia interpretativa
considerada diz respeito a se, por um lado, boa parte disso que propõe no Livro 1 é reafirmado
por Hume no Apêndice, por outro, ele afirma haver um aspecto que sua teoria não foi bemsucedida
em explicar. Entretanto, ao colocar o problema, para o qual admite não encontrar
solução viável, os princípios que relata não conseguir compatibilizar ou rejeitar não só não
são incompatíveis um quanto ao outro, como também são relevantes para outros temas
abordados no Tratado, não restringindo seu impacto ao problema da identidade pessoal. Qual,
então, o problema identificado por Hume quanto à teoria da identidade pessoal no Livro 1?
Hume reintroduz a noção de eu ao longo de todo o Livro 2, desta vez como objeto do orgulho,
afirmando, por vezes, que não só temos uma ideia de eu, como também uma impressão. A
segunda controvérsia, portanto, diz respeito a se há, no Tratado, diferentes noções de eu, uma
pressuposta pelo orgulho e outra por este produzida, ou se Hume desenvolve diferentes
aspectos de uma mesma concepção de eu, de maneira que o eu como feixe de percepções é o
mesmo implicado pela simpatia e produzido, enquanto objeto, pelo orgulho. Esta dissertação
expõe e discute esses problemas, buscando apresentar como os escritos de Hume nos livros 1
e 2 acerca da noção de eu se complementam e em que medida a propensão natural humana a
atribuir simplicidade e identidade ao eu se deve não apenas à semelhança, à causalidade e à
memória, como defendido no Livro 1, mas também às paixões.
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