Discurso, sujeito e corpo: a grafia da dor como ins(es)crituração de si
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Data
2020-06-05Primeiro membro da banca
Ferreira, Maria Cristina Leandro
Segundo membro da banca
Sousa, Lucília Maria Abrahão e
Terceiro membro da banca
Dias, Cristiane Pereira Costa
Quarto membro da banca
Biazus, Camilla Baldicera
Metadata
Mostrar registro completoResumo
A presente tese aborda a ordem do corpo enquanto materialidade discursiva que possibilita a inscrição/escrituração/escrita do sujeito. Pela via do corpo, mais especificamente nas situações em que o sujeito produz cortes/automutilações, discorremos acerca da corpografia da dor no processo de vir-a-ser mulher. O trabalho filia-se ao campo teórico-analítico da Análise de Discurso francesa, preconizada por Pêcheux, na França, e desdobrada por Eni Orlandi no Brasil, em diálogo com pressupostos da Psicanálise. Situamos o sujeito dotado de inconsciente e interpelado ideologicamente, que vivencia um processo de construção imaginária do corpo, que compõe olhares e discursos sobre ele. Um corpo cortado, mutilado, cujas entranhas, sulcos, sangrias produzem uma corpografia, uma escrita, um gesto de re(ex)istência. Neste estudo, analisamos três materialidades discursivas – postagens de meninas que se produzem cortes corporais, no facebook, blogs e tumblr, a partir de imagens e narrativas publicizadas no espaço digital; sequências discursivas do filme Cisne Negro (acompanhando o percurso de Nina, a rainha dos Cisnes, e o antagonismo das posições-sujeito que lhe demandam sua mãe e seu treinador da companhia de ballet); e recortes da ficção UmaDuas, de Eliane Brum, uma escrita à sangue, testemunhando as dores de Laura no seu processo de separar-se da mãe e posicionar-se enquanto mulher. Ao trabalharmos com arquivos de estatuto audiovisual - imagens, fotografia, materialidade fílmica –, com a escrita ficcional e com o discurso digital, estamos considerando-os como processos discursivos, constitutivamente incompletos e contraditórios, traçando um caminho de leitura do arquivo que leva em conta as produções e reproduções de discursos: marcas da polissemia, opacidades, lugares de plurivocidade dos sentidos. A análise das imbricações materiais significantes desses arquivos nos leva a atentar aos elementos relativos à memória discursiva, aos componentes ideológicos e às contradições entre as posições-sujeito em tais materialidades. Como regularidades, visualizamos que o corpo anuncia e denuncia uma corpografia da dor subjetiva, além de pôr em cena as formações discursivas e ideológicas das práticas sociais. Ainda, o paradoxo entre o que se situa no campo dos excessos, dos transbordamentos, do imperativo do gozo, da completude, dos ideais, e o que se situa no campo do vazio, da falta, do desamparo, da dor, da fragilidade das referências simbólicas, dos apagamentos da alteridade e da destituição/desaparição do sujeito do desejo, elementos atrelados às condições de produção vinculadas à forma-sujeito-histórica contemporânea. Além disso, situamos o corpo como um arquivo vivo, que produz um mosaico de traços, cortes, marcas, cicatrizes que discursivizam a problemática da constituição da feminilidade. O traçado da escrita, da lâmina ou os rasgos na pele contam uma história, comportam memórias, apelam por inscritura. Encenam algo do luto, da perda, do gozo, do real. Suplicam por bordas e fronteiras, por olhares e escutas. Configuram-se como dizeres em cena: no corpo, no fio da lâmina, no espaço digital, na escrita que se faz um corpo de letras. Ainda, remetem ao que foi denegado do sintoma social e que retorna, de maneira sinistra, estranhamente familiar, pela via do corpo e suas entranhas, seus furos, seus cortes. Retorno do que não cessa de não se inscrever. Dizem de uma escrita que re-clama por inscrição.
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