Relicários da paisagem pastoril: uma geografia do Pampa remanescente no Brasil
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Data
2021-09-11Primeiro membro da banca
Flores, Carmen Rejane
Segundo membro da banca
Rieth, Flavia Maria Silva
Terceiro membro da banca
Chelotti, Marcelo Cervo
Quarto membro da banca
Medeiros, Rosa Maria Vieira
Metadata
Mostrar registro completoResumo
A presente tese analisou a dinâmica da paisagem pastoril remanescente dos processos de supressão
do Pampa em sua relação com a vida que a anima, dialogando com sujeitos sociais que com ela
interagem. A pesquisa foi desenvolvida entre 2017 e 2021, enfocando a alta bacia hidrográfica do rio
Quaraí, que se constitui em um dos últimos redutos da porção brasileira do Pampa a conservar
significativa parcela de áreas ditas “naturais” do bioma. Buscamos entender as condições sociais e
geográficas que tornam essa zona refratária ao avanço do sistema técnico-sojeiro em curso no entorno
regional – hoje a principal causa de supressão do Bioma Pampa – analisando até que ponto essa
contingência permite ou não a reprodução de velhas características desse meio geográfico. O lastro
teórico foi a compreensão do espaço geográfico enquanto formas-conteúdo, materialidade
indissociável das ações e representações humanas que a movimentam. Desse entendimento, decorre
nossa presunção inicial de que as manchas de Bioma Pampa remanescente pressupõem manchas
também de sistemas de práticas ou ações, conteúdo, em alguma medida. A pesquisa foi de caráter
qualitativo, operacionalizando analiticamente o conceito de paisagem enquanto foco conceitual. Dois
são os grupos de achados da investigação: o primeiro, na escala do Pampa brasileiro e do Sudoeste
Gaúcho, é fruto de uma geografia retrospectiva, baseada, sobretudo, em pesquisa bibliográfica e
documental. Através desse exercício, enxergamos a face historicamente construída do Pampa: a
paisagem pastoril, uma paisagem agrária. Uma obra com origem moderno-colonial, mas que, por
fundada na extensividade, foi sendo rotulada como “excessivamente entregue à natureza”, “arcaica” ou
“pré-capitalista”. Predestinada, segundo esses olhares exóticos modernos, ao destino agrícola como
forma de passaporte ao progresso, essa secular paisagem agora sucumbe rapidamente ao avanço da
soja. Restam remanescentes, confinados em geografias refratárias a usos hegemônicos, que, por outro
lado, veem crescer formas de valorização do diverso e do singular, na esteira das próprias sequelas
deixadas pelo produtivismo e pelos processos de massificação globalizantes, no que se traduz na
possibilidade de conversão de sua anterior marginalidade em uma paradoxal virtude. O segundo grupo
de achados, este na escala da mancha de remanescentes concentrada no Alto Quaraí, é fruto de uma
geografia do presente, baseada, basicamente, no trabalho de campo, com cruzamento entre
observação da paisagem e entrevistas semiestruturadas-interlocuções. Visualizamos, por essa via,
uma área relicário, cujas relíquias que guarda são a própria paisagem e a vida pastoril pampiana que
ali se reproduzem entre inércias, transições e mesmo ameaças, sob a “proteção” exercida pelas
próprias condições edafoclimáticas e/ou geomorfológicas desses domínios dos solos superficiais de
basalto e/ou da minoritária janela de solos de origem arenítica, acrescidos, ainda, do peso exercido
pela reprodução de certa reticência histórico-cultural local à agricultura. Observamos, ademais, que
esses mesmos condicionantes geográficos geradores de um efeito tampão à entrada das lavouras,
compõem, por outro lado, as singularidades de se criar gado nas “pedras” ou nas “areias”, que para
além do valor cultural que em si representam, fazem do Alto Quaraí um verdadeiro terroir ovelheiro e
uma zona de excelente aptidão para a cria bovina.
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