O amadurecimento do bebê e a linguagem: uma leitura a partir de Winnicott e Benveniste
Resumo
Esta Tese teve como objetivo aprofundar o conceito de experiência mãe-bebê de mutualidade, demonstrando como ele se expressa em sistemas semióticos, sejam eles verbais ou não verbais, de modo a favorecer a emergência do simbolismo e sustentar o processo de apropriação linguística pelo bebê, partindo da aproximação entre a teoria de Amadurecimento Pessoal de Winnicott e princípios semióticos encontrados na teoria enunciativa de Benveniste. Como objetivos secundários teve-se a análise da relação entre os princípios semióticos encontrados, a partir de evidências qualitativas e numéricas descritivas nos comportamentos materno-infantil entre um e quatro meses de idade do bebê, análise de evidências da transição de um desenvolvimento interpessoal para intersubjetivo, em um bebê entre quatro e sete meses. Outro objetivo ainda foi analisar em termos qualitativos e numéricos descritivos o tipo de linguagem dirigido ao bebê nos primeiros meses, sobretudo, na diferenciação entre presença e ausência de manhês. Para tanto, foram realizados dois empreendimentos fundamentais: a leitura de textos selecionados de Winnicott e Benveniste, e um estudo empírico longitudinal com quatro bebês e as pessoas que realizam o cuidado de tipo materno neste estudo, as mães biológicas dos bebês, desde um mês até quatro meses de idade dos bebês. Tratou-se, portanto, de um estudo de caso coletivo que abrangeu quatro etapas de coleta, tendo ocorrido à primeira entre 20 e 30 dias de vida dos bebês, a segunda entre 80 e 90 dias dos bebês, a terceira entre 110 e 120 dias, quando os bebês completaram quatro meses de idade. Apenas para um bebê foi possível validar e analisar a coleta para a quarta etapa, quando estava próxima aos 7 meses de idade. As coletas foram domiciliares, em dia e horário mais conveniente para a família e, nas quatro etapas foi realizada uma filmagem da cena de amamentação, iniciando pelo menos cinco minutos antes do início da amamentação, finalizando cinco minutos depois. As filmagens foram transcritas e, para análise de dados, foram realizados dois estudos. O primeiro estudo consistiu na análise qualitativa das transcrições para a identificação de aspectos do amadurecimento do bebê, à luz da teoria winnicottiana, relacionando, a partir da ideia de um exterior teórico, aos princípios enunciativos atrelados ao sistema semiótico corporal do bebê a linguagem materna, a saber: os princípios da interpretância e homologia. Já o segundo estudo foi realizado por meio de dois procedimentos de análise de três minutos de filmagem com o software ELAN para identificação de categorias enunciativas e dos comportamentos materno-infantis com base em protocolo de cognição social. A análise demonstrou que a experiência mãe-bebê de mutualidade proposta por Winnicott pode ser observada por meio da ideia benvenisteana de sistemas semióticos, verbais e não verbais da mãe e do bebê e, pelo modo como se relacionam. Tal experiência torna-se evidente nos momentos em que a mãe atribui sentido, interpreta e traduz os sinais do bebê, preenchendo o lugar enunciativo dele, pela tradução da sua demanda em palavras, estabelecendo uma relação de homologia entre os sistemas semióticos não verbais do bebê e o seu sistema semiótico verbal, por meio da interpretância. Além disso, os dados demonstraram que, na medida em que o objeto passa de subjetivo para objetivamente percebido, ao longo do processo de amadurecimento do bebê, a comunicação com ele passa a ser explícita e, este fato, indica a transição de um desenvolvimento interpessoal para intersubjetivo, evidenciado pela redução do uso do manhês, e pela presença da intersubjetividade como categoria de cognição social, no segundo semestre de vida do bebê. Por fim, destaca-se que os princípios semióticos propostos nesta Tese são, numericamente, evidenciáveis nos comportamentos das díades analisadas e que, portanto, podem ser propostos como princípios operantes em fase de extrema dependência do processo de amadurecimento, em que o bebê ainda não fala.