História do Predestinado Peregrino e seu irmão Precito, de Alexandre de Gusmão: a parábola fingida, e verdadeira, do peregrino e do réprobo
Abstract
Alexandre de Gusmão (1629-1724) foi membro importante da Companhia de Jesus. Seu
nome, por vezes, avulta na historiografia da Literatura Brasileira como responsável pela
composição de História do Predestinado Peregrino e seu irmão Precito (1682), considerada a
“primeira novela escrita no Brasil” (MOISÉS, 1990, p. 222). Com efeito, boa parcela da
crítica atual acerca de Gusmão dedica-se aos caminhos paralelos, mas contrários, dos irmãos
Predestinado e Precito. Contudo, alguns aspectos ainda se nos apresentam lacunares, cabendo
a este trabalho destacar certas encruzilhadas críticas e apontar caminhos possíveis de análise,
sobretudo em relação ao gênero da obra e à configuração de seus protagonistas, Predestinado
e Precito. Buscamos respeitar, na medida do possível, os parâmetros retórico-poéticos
vigentes no Seiscentos ibérico, período de valorização da metáfora aguda e pictórica enquanto
base da invenção, bem como o contexto teológico-político da época, atrelado à Reforma
Católica e às noções de “corpo místico” e “bem comum”. Privilegiando a classificação de
Gusmão, que considera sua obra uma “história” e uma “parábola”, acreditamos que ela utilize
a alegoria enquanto ornamento retórico e aproveite-se da tradição exegética bíblica, em seus
sentidos parabólico, moral e anagógico. Por fim, consideramos Predestinado, o peregrino, e
Precito, o réprobo, como tipos genéricos do “virtuoso” e do “vicioso”, modelos exemplares à
ordenação dos hábitos do público-alvo em direção à salvação ou à condenação eternas. Tudo,
enfim, conforme os três principais objetivos retóricos – ensinar, deleitar e mover as paixões –
com vistas a uma audiência iniciante na leitura e na catequização.