O brincar de sujeitos com risco psíquico: um olhar interdisciplinar
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2014-03-31Metadatos
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Esta pesquisa analisa o brincar de dezesseis crianças entre 21 e 26 meses que apresentaram risco ao desenvolvimento, detectado entre 1 e 18 meses, por meio dos Índices de Risco ao Desenvolvimento propostos na pesquisa de Kupfer (2008). Para tanto, as crianças foram filmadas com seus familiares em atividades lúdicas por vinte minutos. A análise se deu a partir de três procedimentos distintos de análise do brincar: um protocolo que analisa o brincar e a comunicação a partir da visão cognitivista piagetiana (ZORZI e HAGE, 2004), outro composto por categorias propostas a partir da leitura de objeto transicional de Winnicott (GRAÑA, 2008) e uma análise descritiva realizada por três terapeutas, de distintas profissões, experientes na clínica infantil. Os resultados dessas análises foram confrontados com o histórico de risco das crianças e também entre si para verificação de que dados essas distintas análises forneceram acerca da necessidade ou não de intervenção precoce do tipo de intervenção indicado pelos profissionais. Os resultados descritivos a partir dos protocolos demonstraram que quatro das dezesseis crianças apresentaram um brincar, do ponto de vista cognitivo, aquém do esperado para sua faixa etária e que tal resultado estava correlacionado a menor pontuação nos itens de comunicação do protocolo e também com a indicação de profissionais fonoaudiólogas, de presença de necessidade de intervenção fonoaudiológica. Duas dessas quatro crianças apresentaram alteração na relação objetal indicando risco maior de estruturação de transtorno mental. As demais crianças não apresentaram alterações significativas nos protocolos. Quando analisadas, porém, as filmagens das dezesseis crianças pelos três profissionais experientes (uma fonoaudióloga, uma psicóloga e uma terapeuta ocupacional), apesar da coincidente preocupação com a linguagem e desenvolvimento psíquico dos quatro casos indicados pelos protocolos e pelas fonoaudiólogas, houve também outras oito crianças indicadas para intervenção precoce ou breve, tendo como base alterações qualitativas mais sutis na interação lúdica com a mãe. Apenas quatro casos não foram indicados para nenhuma intervenção. Tais resultados demonstraram que os índices de risco ao desenvolvimento cumprem a função de detecção precoce de casos de risco, tanto ao desenvolvimento, quanto psíquico, pois a maior parte da amostra desenvolveu algum tipo de dificuldade, mas que não devem ser tomados com valor diagnóstico, pois o curso de instalação de sintomas pode ser modificado por novas posturas familiares, sejam elas espontâneas ou instigadas por uma intervenção. Também sugerem que os protocolos, que analisam o brincar a partir de um olhar categorial exclusivo sobre o brincar da criança, não captam as sutilizas necessárias para uma reflexão clínica mais singular para pensar a intervenção. A análise que privilegie a intersubjetividade criança-familiar em atividade lúdica espontânea, possível a partir das filmagens, apresentou-se como forma comum e preferida pelas três profissionais que analisaram as dezesseis filmagens. Eles demonstraram que a interface entre aspectos cognitivos, linguísticos e psicoafetivos foi constante e indissociável, quando solicitados a analisar o brincar. Esse fato demonstra que a clínica de intervenção precoce demanda considerar esse tripé estrutural e possíveis desdobramentos instrumentais para efeitos diagnósticos, e que isso é possível a partir da análise do brincar entre os parceiros, sejam eles a criança e familiar, ou a criança e terapeuta. As três profissionais que analisaram as filmagens ressaltaram que na graduação o enfoque sobre o brincar é mais comumente cognitivista e que a face psicoafetiva se fez mais presente na formação de pós-graduação. As análises realizadas pelas terapeutas, e mesmo as relações entre as dimensões cognitiva e psicoafetiva do brincar são bem explanadas pela teoria winnicottiana, que permite sustentar a necessidade de se estabelecer uma hipótese do funcionamento do brincar singular a cada caso.