A recepção de Frege da noção kantiana de existência
Abstract
Este trabalho apresenta um estudo da relação entre duas célebres abordagens do conceito de existência. A primeira, apresentada por Kant, exclui o conceito de existência do conjunto dos possíveis predicados ou propriedades de objetos. A segunda, apresentada mais tarde por Frege, trata o conceito de existência como um predicado de nível superior, i.e., apresenta o conceito como um predicado de predicados, e não como um conceito que se aplica diretamente a objetos. Apesar de ambas abordagens se parecerem muito entre si, um estudo mais aprofundado de ambas servirá para mostrar que a diferença entre os sistemas teóricos em que se inserem, bem como entre os objetivos que visavam, sugerem que seria precipitado identificá-las. Tentar-se-á mostrar, neste trabalho, que Kant desenvolve suas concepções a respeito deste conceito num contexto epistemológico, tendo em vista, como fica claro na sua opus magnum, garantir o requisito de que todo conhecimento deve ter, além do elemento conceitual, também uma contraparte advinda da intuição. Frege, por sua vez, apresenta suas teses a respeito do tema dentro de um contexto basicamente lógico, onde se fazia necessária uma rigorização do tratamento das expressões que compõem a linguagem. O objetivo do presente trabalho consiste em estudar a abordagem de cada autor separadamente, e, em seguida, comparar as duas abordagens a fim de mostrar se existem diferenças significativas entre as caracterizações que ambos deram ao conceito de existência, e, em caso positivo, mostrar quais seriam estas diferenças. Dentre os principais resultados a que se chegou, destacam-se as diferenças que as posições dos autores possuem; diferenças sugeridas pela diferenciação entre os contextos de apresentação da temática nos dois autores. Também se destaca a equivalência das teses de ambos em alguns aspectos, como por exemplo, a tese segundo a qual o conceito de existência não se encontra entre os conceitos que podem servir para caracterizar um objeto, ou a alegação de que os enunciados existenciais constituem um tipo único de juízo, cuja aparência nas linguagens naturais sugere uma leitura errônea dos mesmos. Deve-se mencionar, por outro lado, a diferença significativa de posições de Kant e Frege em outros aspectos, como no que tange à possibilidade de se derivar existência por meio de análise conceitual, possibilidade negada categoricamente por Kant e admitida, com algumas ressalvas, por Frege. Por fim, destaca-se a possibilidade de se interpretar as teses de Frege como um aperfeiçoamento, mas não como uma mera repetição, das teses de Kant.