Ciência e religião no Rio Grande do Sul: apometria como uma prática de cura espírita
Resumo
Esta dissertação trata da experiência histórica de um grupo espírita liderado pelo médico Dr. José Lacerda de Azevedo que se envolveu com o desenvolvimento de uma técnica de cura no Hospital Espírita de Porto Alegre (HEPA) durante os anos de 1964 a 1986. A técnica criada por eles, intitulada Apometria, caracterizava-se por ser um sistema que procurava conciliar os princípios do espiritismo, com elementos pertencentes à umbanda, ao esoterismo e práticas new age, todos embebidos e manifestados através de uma lente científica que procurava trazer aspectos da parapsicologia e de teorias especulativas, como a física quântica. Relacionada com um contexto de discussão sobre o caráter do espiritismo, debate que no Rio Grande do Sul ocorria através dos esforços da gestão que presidiu a Federação Espírita do Rio Grande do Sul (FERGS) entre os períodos de 1978 a 1986, o grupo ligado à Apometria acabou sendo alvo das pressões internas advindas de uma bem consolidada estrutura normativa que havia se consolidado através do trabalho da rede federativa espírita encabeçada nacionalmente pela Federação Espírita Brasileira (FEB). Assim, em decorrência do perfil acentuadamente experimental e sincrético da técnica apométrica, esta acabou sendo afastada das fileiras espíritas, de onde subsequentemente foi proscrita e negada. Nesse sentido, esta pesquisa procurou historicizar este processo com vistas a dar corpo a uma reflexão que relacionasse o caso da Apometria com outros casos, aproximados pelo perfil desviante e contestador mantido frente à estrutura normativa nucleada pela FEB. Dessa forma, o caso da Apometria acabou evidenciando a existência de uma ampla rede de relações sociais e institucionais que se mantiveram promovendo espaços alternativos de discussão e troca à margem das ofertas da Federação. Da mesma forma, o esforço movido por esta dissertação procurou pensar o fenômeno religioso relacionando-o com o jogo de interesses e necessidades surgidas das relações mantidas entre os indivíduos e as instituições, em um trabalho crítico que se propõe pensar de forma histórica as narrativas religiosas desenvolvidas e mantidas pelos grupos espíritas. A pesquisa usou como fonte os livros publicados sobre a técnica apométrica, documentos institucionais das sociedades espíritas envolvidas, normativas, estatutos, atas e anais. Já para dimensionar a discussão que se desenvolvia no Rio Grande do Sul sobre o caráter do espiritismo, este trabalho alicerçou-se particularmente nos periódicos da revista espírita A Reencarnação, veículo oficial da FERGS em edições lançadas entre o período de 1970 a 1989.