Representações de letramento no contexto escolar: a construção de um conceito socialmente situado em um programa de formação de professores
Resumo
O tema do letramento tem estado no centro das pesquisas e discussões em
Linguística Aplicada (ROJO, 2010; SOARES, 2011), bem como é recorrente o emprego do
termo em documentos oficiais, como os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1997;
2000), as Orientações Curriculares Nacionais (BRASIL, 2006) e, mais recentemente, os
Referenciais Curriculares Lições do Rio Grande (RIO GRANDE DO SUL, 2009).
Considerando esse panorama, este trabalho investiga as representações de professoras de
uma escola pública de Ensino Fundamental de Santa Maria, RS, acerca de suas
concepções de letramento e do modo como o representam discursivamente na prática de
sala de aula. O corpus foi coletado a partir de dois questionários, respondidos,
respectivamente, por 11 e 8 professoras participantes de um programa de formação
continuada de professores. Além dos questionários, desenvolvemos 14 sessões reflexivas
para problematizar o conceito de letramento. A análise do questionário inicial apontou três
conceitos centrais de letramento: como leitura [crítica] de mundo , como (de)codificação da
linguagem escrita e como processo cognitivo e de comunicação. A partir da análise do
discurso das participantes, em sala de aula, essas representações se realizam por meio de
práticas pedagógicas com foco na contextualização, interpretação, expressão de
pensamento/opinião, decodificação e produção textual. O cruzamento desses dados revelou
contradições entre o discurso e as práticas. No decorrer do processo reflexivo-colaborativo,
durante as sessões reflexivas, essas representações foram reconfiguradas e expandidas,
incluindo as representações de práticas e eventos de letramento e, brevemente, as relações
entre letramento e gêneros textuais/discursivos. Assim, a análise do questionário final
demonstrou a predominância de representações de letramento alinhadas ao conceito de
leitura [crítica] de mundo e tímidas adesões à concepção de letramento como forma de
comunicação. Com isso, as representações de práticas pedagógicas também sofreram
reconfigurações, ocasionando a reorganização daquelas práticas identificadas na análise do
questionário inicial em duas categorias: 1) na apropriação de saberes para a vida e 2) na
aquisição de tecnologias da escrita. Ao final do processo reflexivo, pudemos delinear um
conceito socialmente situado para letramento como processo de empoderamento
(empowerment) social e político do indivíduo capaz de levá-lo a transformar a realidade o
mundo (FREIRE, 1975) e, em consequência, observamos ressignificações dos discursos
das professoras sobre o próprio fazer docente.