Entre o corredor e a estância: dinâmicas sociais e produtivas na APA do Rio Ibirapuitã
Abstract
A criação das APAs, como unidades de conservação de uso direto, surge da demanda atual de aliar a preservação do patrimônio natural e histórico-cultural nos territórios. Entretanto, preterir a participação da população local nos processos decisórios e reproduzir a idéia de um perfil cultural ligado a um segmento restrito e afastado da realidade local torna contraditória essa possibilidade. Na APA do Rio Ibirapuitã, objeto do presente estudo, esse mesmo conflito se processa, inclusive pelo desconhecimento das características e práticas dos seus moradores. De maneira a contribuir contra tal deficiência, este trabalho propôs-se a caracterizar os limites e as principais dinâmicas evidenciadas entre os grupos sociais típicos do pampa identificados na APA do Rio Ibirapuitã. Para tanto, procedeu-se metodologicamente utilizando-se como principal referência a Análise e Diagnóstico dos Sistemas Agrários. Inicialmente, foram buscados dados secundários para a caracterização agroecológica e socioeconômica da região e feitas entrevistas de campo para estabelecimento de pré-tipologias. Nos grupos identificados, a investigação constou de entrevistas semi-estruturadas, observação participante e uso do diário de campo. No tratamento dos dados, foram utilizados a Teoria do Valor Agregado para análise econômica, a análise estatística multivariada e a análise de discurso. Nos resultados, identificou-se, para a região do pampa, a característica campestre intimamente ligada às atividades dos grupos humanos que ali habitaram, desde a pré-história, assim como o perfil socioeconômico ligado estreitamente à pecuária e às disputas demarcatórias do território, configurando a estrutura agrária baseada predominantemente nas grandes propriedades pastoris.
Na caracterização agroecológica da APA identificaram-se 3 Zonas homogêneas, predominando em todas elas a atividade pecuária. Na mais alta, ao sul, a pecuária é hegemônica; na intermediária, a sudeste, divide espaço com lavouras de grãos de sequeiro; e na zona de altitudes inferiores, ao norte, convive com a lavoura de arroz nas várzeas do rio.
A distribuição demográfica segue a lógica dessas zonas, tendo uma frente composta pelas estâncias, centralizada; e outra frente periférica, onde predomina a lógica familiar aglutinando as moradias e formando os Rincões. Nas estâncias são encontrados os tipos de Agricultores do Segmento Patronal, divididos entre Empresariais e Tradicionais típicos e/ou com turismo; nos rincões, os Agricultores do Segmento Familiar, sendo de Origem Estancieira, Assalariados e changueiros, Aposentados, Quilombolas, Comerciantes, ou Ocupantes e agregados. Transitando pelos corredores, entre esses dois pólos, está o Segmento do Proletariado, composto pelos Assalariados temporários e permanentes e pelos Andantes ou teatinos. Os tipos de sistemas de produção predominantemente praticados nos estabelecimentos constam da Pecuária de corte, subdividida nas combinações de Bovinos e grãos, Bovinos e ovinos, Bovinos, ovinos e plantas de cercado ; e do Arroz. Destacam-se nesses tipos de sistemas as relações de trabalho, gênero, e com o ambiente. E, nas estratégias engendradas, sobressaem-se as do gado de corredor , do arrendamento por cabeça , das vendas conjuntas, do turismo e do marketing ambiental. Constata-se, diante desse cenário, a necessidade de reconhecer e atuar na mediação entre tais relações, de modo a diminuir as discrepâncias entre os segmentos sociais e aproveitar o conhecimento tradicional no sentido da conservação dos agroecossistemas e da herança cultural presentes no Bioma Pampa.