Preferência condicionada a psicoestimulante em ratos jovens após suplementação com diferentes ácidos graxos
Abstract
A dieta ocidental sofreu grandes modificações nas últimas décadas, principalmente em decorrência do grande consumo de alimentos industrializados e fast foods, que contém uma grande proporção de gorduras ricas em ácidos graxos trans (AGT). Ácidos graxos poliinsaturados (AGPI) são componentes essenciais nas membranas neuronais, sendo que os principais AGPI são os da série ômega-3 (n-3) e ômega-6 (n-6), os quais são obtidos exclusivamente da dieta. Os ácidos graxos trans (AGT) podem inibir a atividade de enzimas como as dessaturases e elongases, e também competir com os AGPI pela incorporação nas membranas neuronais, modificando sua fluidez e afetando as funções fisiológicas neuroquímicas cerebrais.
A qualidade das gorduras consumidas durante os períodos de gestação e lactação determina uma significativa transferência de AGPI e AGT através da placenta e do leite materno. Diferentes mecanismos relacionados à alteração da composição dos AG podem provocar alterações comportamentais, as quais podem ser especialmente refletidas sobre a neurotransmissão dopaminérgica, aumentando assim a ansiedade e a hedonia, os quais podem exacerbar o efeito aditivo de drogas psicoestimulantes.
A adolescência é o período em que há grande busca por novidades, o que aumenta a probabilidade para o início de experiências que podem culminar em adição. O protocolo de preferência condicionada de lugar (PCL) é um modelo animal bastante utilizado para a compreensão dos mecanismos envolvidos no abuso de drogas psicoativas, servindo também como uma ferramenta de estudos que permitam a prevenção e/ou tratamento da adição.
O objetivo deste estudo foi avaliar a influência da suplementação de diferentes gorduras ricas em ácidos graxos n-3 (óleo de peixe-OP), n-6 (óleo de soja-OS) e ácidos graxos trans-AGT (gordura vegetal hidrogenada-GVH) desde o período pré-concepcional, gestação e lactação, e mantidas até a adolescência sobre parâmetros de ansiedade e de preferência à anfetamina (ANF) em ratos jovens, os quais foram avaliados em conjunto com análises do status oxidativo cerebral.
Durante 6 semanas, 24 ratas Wistar adultas foram suplementadas com OS, OP e GVH, compreendendo os períodos desde a concepção, prenhez até o final da amamentação. Após o desmame, apenas 1 filhote macho de cada ninhada foi separado e mantido com a mesma suplementação da projenitora até atingir 40 dias de idade, quando foram submetidos ao protocolo de condicionamento (8 dias) com ANF a fim de conduzir os testes comportamentais e bioquímicos. GVH aumentou a preferência de lugar condicionado por ANF e apresentou sintomas de ansiedade durante a abstinência, indicando um maior potencial de abuso neste grupo experimental. A suplementação de GVH durante o desenvolvimento e crescimento também foi associada aos maiores danos oxidativos e reduzida atividade antioxidante, enquanto o grupo suplementado com OP mostraram menores níveis de proteína carbonil. Este estudo permitiu observar a influência deletéria do consumo de AGT durante o período perinatal e durante o desenvolvimento, a qual pode ser especialmente evidenciada através dos sintomas de preferência à psicoestimulantes, ansiedade e danos oxidativos no cérebro.