Mimese e realidade em O ano da morte de Ricardo Reis
Abstract
O objeto deste estudo é o livro O ano da morte de Ricardo Reis, de autoria do escritor português José Saramago, cuja obra articula os imprecisos limites que há entre o discurso histórico e a criação literária, procurando um sentido para a
representação da realidade, que se fortalece em um diálogo interdiscursivo e intertextual pautado sobre a verdade da história e a verdade da ficção . A mimese, consecutivamente, constrói-se como uma atividade representativa que não reflete o universo, mas o irrealiza a partir da tematização ficcional. Ao envolver as manifestações artísticas do homem, designa o exercício criador, correspondendo a uma maneira de representação do mundo. Procurou-se investigar e interpretar o funcionamento da mimese na obra em questão, observando as relações entre o
universo fictício e a realidade histórica e social portuguesa, mais especificamente de Lisboa, no ano de 1936. Foi possível perceber que o personagem Ricardo Reis é dessacralizado da aura poética que pairava sobre o heterônimo pessoano, ao
confrontar-se diretamente com as intempéries de um mundo hostilizado pelos regimes autoritários que antecederam a Segunda Guerra Mundial. No plano diegético, os processos de pré-configuração, configuração e refiguração espaçotemporal,
indicam que a realidade do passado se presentifica na narrativa, envolvendo o personagem Ricardo Reis pelos labirintos sugeridos a partir da figura de Lisboa, do livro The god of the labyrinth e das notícias veiculadas pela imprensa. Nessa perspectiva, a ficção de O ano da morte de Ricardo Reis vislumbra-se numa atitude de interlocução com a realidade histórica , não se limitando a uma mera
representação de fatos do passado português.