O funcionamento semântico-enunciativo da língua espanhola nas tiras do Tapejara: uma representação da linguagem gauchesca
Abstract
O presente trabalho tem como proposta de análise estudar o funcionamento semântico-enunciativo de palavras e expressões da língua espanhola ao entrarem em contato com a língua portuguesa, expressando de que modo esse funcionamento se significa no dizer, produzindo sentidos e caracterizando uma heterogeneidade da língua portuguesa pela existência, então, de uma linguagem gauchesca. Diante disso, o estudo considerou o funcionamento semântico-enunciativo de palavras e expressões da língua espanhola relacionadas ao modo de enunciar do sujeito gaúcho, retiradas das tiras analisadas, e que evidenciam uma produção e efeitos de sentido da linguagem que significam histórica e socialmente esse sujeito gaúcho. Para tanto, foi organizado um corpus a partir das tiras que compõem o livro Tapejara: o último guasca, onde se analisaram enunciados escritos que apresentam marcas linguísticas da língua espanhola na linguagem gauchesca. Realizou-se uma abordagem semântico-enunciativa desses enunciados, de modo a demonstrar como se estabelecem os efeitos de sentido que aí se constituem. Assim, sob o viés dos estudos enunciativos e discursivos, pautados na Semântica do Acontecimento de Eduardo Guimarães e na Análise de Discurso de Michel Pêcheux, buscou-se refletir sobre como essas palavras e expressões interferem na produção desses efeitos de sentido nas relações entre língua e sujeito, considerando que tais efeitos podem ser observados nas tiras, enquanto objeto de análise. A observação dessa representação visou analisar o espaço de produção e os efeitos de sentido produzidos pelas tiras enquanto constituição de um discurso sobre o gaúcho que ocorre pela incorporação de palavras da língua espanhola na linguagem gauchesca, representada na materialidade linguística das tiras. Trabalhamos, assim, uma manifestação linguística que se dá num espaço enunciativo próprio, a região fronteiriça do Rio Grande do Sul com o Uruguai e a Argentina, e que serve de exemplo da heterogeneidade linguística da língua portuguesa. A observação de determinadas manifestações linguísticas e, neste caso, de uma especificamente representativa da identidade rio-grandense nos revela uma perspectiva de mundo de um indivíduo que vive, circula e enuncia entre línguas, tornado-se representativo de um espaço social e de um contexto sócio-histórico capaz de produzir um discurso característico e diferenciado do restante do território brasileiro. Por tratar-se de um discurso que se evidencia tanto na materialidade linguística como se significa no plano da enunciação, procura-se interpretar os sentidos que emergem desses enunciados que representam os dizeres de um sujeito social que reproduz na língua a sua identidade. Desse modo, partindo desses enunciados é possível apontar elementos que nos permitem dizer que essa língua do gaúcho é ressignificada no gaúcho como tipo social e produz, através das tiras, um discurso sobre o gaúcho que afirma toda uma identidade regional. A ênfase nas peculiaridades linguísticas do português do Rio Grande do Sul, entre elas o contato entre português e espanhol, contribui na constituição dessa linguagem gauchesca. Esse discurso, suas características, peculiaridades e o sujeito que se significa através dele é, portanto, a questão que movimenta este trabalho na busca de apresentar aspectos constitutivos da linguagem do gaúcho.