Envolvimento do receptor de potencial transitório anquirina 1 na analgesia induzida pela fração acetato de etila de Tabernaemontana catharinensis em camundongos
Resumo
A dor é uma condição que limita a produtividade e diminui a qualidade de vida dos pacientes por ela acometidos. Embora exista um arsenal de analgésicos efetivos, há uma grande preocupação relacionada com sua segurança e efeitos adversos, tornando seu uso clínico problemático e fazendo com que muitas pessoas optem por tratamentos baseados na medicina alternativa. Tabernaemontana catharinensis é uma árvore popularmente conhecida como cobrina. A diversidade de ações biológicas encontradas na fração acetato de etila das folhas de T. catharinensis (Eta) foram atribuídas a presença de compostos majoritários, entre eles o polifenol ácido gálico, conhecido por sua ação antagonista do receptor de potencial transitório anquirina 1 (TRPA1, do inglês transient receptor potential ankyrin 1). Até o momento, existem estudos pré-clínicos suportando a atividade antinociceptiva periférica desta fração. Entretanto, necessita-se elucidar seu mecanismo de ação, e um provável alvo da fração Eta poderia ser o canal iônico TRPA1. O TRPA1 é essencial para a detecção e transmissão de estímulos dolorosos. Este canal é ativado por substâncias irritantes de origem natural e por substâncias oxidantes endógenas. Além disso, sua ativação está relacionada ao desenvolvimento e manutenção de diversas condições dolorosas. Neste contexto, nós verificamos o envolvimento do TRPA1 no efeito antinociceptivo e anti-inflamatório da fração Eta em camundongos Swiss machos (30-35 g). A fim de elucidar o mecanismo de ação da Eta foram realizados ensaios de influxo de cálcio (Ca2+) e de união específica (deslocamento do radioligante [3H]-resiniferatoxina). Os efeitos do tratamento oral de Eta (0.01-100 mg/kg) ou veículo (10 ml/kg) foram avaliados por meio de parâmetros nociceptivos (nocicepção espontânea, alodínia mecânica e ao frio) e inflamatórios (medida de edema) seguido da administração intraplantar dos agonistas TRPA1 peróxido de hidrogênio (H2O2), cinamaldeído ou isotiocianato de alila em camundongos. Além disso, os efeitos de Eta foram avaliados sobre um modelo de dor inflamatória crônica induzido pelo adjuvante completo de Freund (CFA, do inglês complete Freund's adjuvant), sobre um modelo de dor pós-operatória e sobre a neuropatia periférica aguda e crônica induzida por paclitaxel. Parâmetros oxidativos como a capacidade de oxidação tecidual e níveis de H2O2 foram avaliados em amostras teciduais de camundongos submetidos ao modelo de dor inflamatória crônica induzido por CFA. Eta inibiu o influxo de Ca2+ induzido por um agonista TRPA1 [Imáx = 72,4±1,5%; CI50 = 0,023(0,004–0,135)μg/ml], mas não por um agonista vaniloide 1 (TRPV1), assim como não deslocou o radioligante [3H]-resiniferatoxina. Eta (0.1-100 mg/kg) inibiu a nocicepção espontânea (DI50 = 0,043(0,002-0,723)mg/kg), alodínia mecânica (DI50 = 7,417(1,426-38,570)mg/kg) e ao frio, assim como o desenvolvimento de edema causado pela injeção de diferentes agonistas TRPA1. Além disso, Eta (100 mg/kg) preveniu e reverteu a dor inflamatória crônica induzida por CFA (Imáx = 55,8±13,7%, Imáx = 80,4±5,1%, respectivamente) e a dor pós-operatória (Imáx = 88,0±11,6%, Imáx = 51,3±14,9%, respectivamente), sendo também efetiva em reverter a neuropatia periférica aguda (Imáx = 94,4±12,4%) e crônica (Imáx = 86,8±8,6%) induzida pelo paclitaxel. Estes efeitos parecem ocorrer via canal TRPA1, e independentemente do TRPV1 ou de mecanismos oxidativos. Nossos resultados demonstram que Eta exerce sua atividade antinociceptiva e anti-inflamatória por meio da inibição do canal TRPA1, possibilitando o uso desta preparação como um agente terapêutico potencial para tratar dores patológicas.
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