Relações da matéria orgânica com a hidrofobicidade do solo
Resumo
A hidrofobicidade do solo pode ser conceitualmente definida como a repelência do solo à água e está associada ao recobrimento das partículas do solo por substâncias orgânicas hidrofóbicas, que interagem de forma complexa com os poros e partículas minerais, dificultando o molhamento do solo. Os objetivos deste trabalho foram: (i) determinar a composição bioquímica da vegetação, das frações físicas e químicas da matéria orgânica e suas relações com a ocorrência e grau de hidrofobicidade; (ii) analisar os efeitos dos compostos hidrofóbicos em diferentes intensidades na sortividade e na curva de retenção de água; (iii) avaliar e monitorar os efeitos da variação da temperatura e do conteúdo de água na variação do grau de hidrofobicidade do solo ao longo de um ciclo de secagem. Foram coletadas amostras de solo de diferentes classes de solos existentes no Estado do Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Nas camadas de 0 5, 5 10 e 10 15 cm foram coletadas amostras indeformadas (blocos), para a avaliação da sortividade e amostras com estrutura preservada, com cilindros metálicos (47 cm³), para a determinação da curva de retenção de água, densidade do solo, porosidade total, macroporosidade e microporosidade. Nessas camadas também foram coletadas amostras deformadas para a caracterização química e física dos solos. No entanto, parte das amostras utilizadas na determinação da curva de retenção de água foram previamente submetidas a uma extração química sequencial com acetona e uma solução de isopropanol:amônia para remoção dos compostos hidrofóbicos. A análise do carbono constou da determinação do carbono orgânico total e da determinação das frações físicas (>53μm e <53μm) e químicas (Ácidos Fúlvicos, Ácidos Húmicos e Humina). A sortividade da água e do etanol foram determinadas com um micro-infiltrômetro de tensão. A hidrofobicidade foi avaliada comparando valores de sortividade da água e do etanol. O ângulo de contato água-solo foi calculado a partir do índice de hidrofobicidade. O efeito da temperatura foi mensurado em cilindros de PVC (785 cm³) construídos com amostras desagregadas dos diferentes solos. As amostras foram umedecidas e secas sob diferentes temperaturas (20, 45 e 70°C), sendo a hidrofobicidade determinada simultaneamente pelo método do tempo de penetração da gota de água. A hidrofobicidade apresentou uma íntima relação com o teor de carbono orgânico do solo, principalmente com os compostos orgânicos acumulados na fração física <53 μm e na fração química da Humina, indicando que os compostos hidrofóbicos provavelmente apresentam elevada recalcitrância e estão fortemente associados às frações silte e argila, formando complexos organo-minerais estáveis, ao mesmo tempo em que recobrem total ou parcialmente a superfície de agregados ou partículas minerais. A existência desses compostos hidrófobos causa alterações na sortividade e no ângulo de contato água-solo, afetando diretamente a capilaridade e a curva de retenção do solo, reduzindo o volume de água retido nos menores potenciais. O aquecimento do solo à temperaturas inferiores a 45 °C não causa modificações na intensidade da hidrofobicidade, que é alterada somente quando a temperatura do solo excede a 70 °C ou quando a umidade do solo é acintosamente reduzida.