Efeitos do diagnóstico precoce da surdez nos processos de escolarização de alunos surdos
Resumo
A proposta investigativa desenvolvida nesta Tese busca compreender como o diagnóstico precoce da surdez tem operado na articulação de técnicas regulatórias que geram efeitos na constituição do sujeito surdo e em seus processos de escolarização. Interrogar a prática do diagnóstico da surdez em um curso de doutorado em Educação faz sentido pela busca de elementos que auxiliem no entendimento de importantes mudanças que vêm sendo percebidas nos cenários e sujeitos na Educação de Surdos. Foram analisados, primeiramente, documentos legais, programas e projetos organizadores de políticas públicas do presente que tivessem como objeto questões linguísticas, pedagógicas ou clínicas voltadas às pessoas surdas em processo de escolarização. Em uma segunda etapa, foram selecionadas cinco crianças surdas diagnosticadas precocemente, matriculadas durante o ano de 2016 em escolas regulares ou de surdos. Por meio de observações das crianças nos contextos escolares e entrevistas com familiares, professores e profissionais da área da saúde, buscou-se compreender os efeitos dos mecanismos colocados em operação pelas políticas analisadas até então. Pela pertinência da perspectiva filosófica de Michel Foucault, considerando o viés dos Estudos Foucaultianos em Educação, as ferramentas analíticas da norma e da biopolítica foram eleitas para operacionalizar as análises. O desenvolvimento do estudo permitiu perceber como as políticas públicas do presente investem positivamente na vida, na língua e nos processos de escolarização de surdos. No âmbito da vida, são colocadas em funcionamento técnicas de quantificação, avaliação, intervenção e otimização que exercem poder tanto no nível do corpo, sobre o indivíduo, quanto no nível da coletividade, sobre a parcela da população com surdez. Por sua vez, as línguas figuram na centralidade de ações voltadas às pessoas surdas e, com isso, acabam se tornando estratégicas na função de prescrever formas de ser surdo. Por fim, no âmbito da escolarização, são operacionalizados processos de regulação de todas as ordens através da instituição escolar, dado seu potencial de formação de condutas ajustadas ao meio. Voltando-se o olhar para o diagnóstico da surdez no âmbito das políticas de reabilitação auditiva, destaca-se a ingerência do diagnóstico como uma política sobre a vida. Pela incorporação do saber médico por todos os campos da sociedade, diversos agentes e espaços sociais protagonizam a produção de diagnósticos. A partir de discussões sobre o funcionamento de programas de saúde auditiva e das análises da cadeia de enunciados sobre as cinco crianças surdas pesquisadas, discutiu-se como o diagnóstico ultrapassa o conjunto de exames e evidências que determinam a surdez para constituir-se como uma prática biopolítica. Seu campo de ingerência alarga-se pela vida do sujeito, colocando-o em permanente estado de regulação ao produzir indeterminadas condições anormais menores que geram correlativamente demandas de investimento. Diante das evidências do estudo, conclui-se defendendo a seguinte tese: o diagnóstico precoce da surdez regula a constituição dos sujeitos surdos e seus processos de escolarização na medida em que funciona como uma prática biopolítica de ingerência alargada pela vida, produzindo permanentemente condições anormais diagnosticáveis sob as quais se aplicam ações de intervenção.
Coleções
Os arquivos de licença a seguir estão associados a este item: