O trabalho de mulheres assentadas: descortinando desigualdades
Abstract
Diante do contexto de busca de reconhecimento das mulheres como trabalhadoras rurais, este estudo procurou entender as relações de gênero a partir dos significados expressados pelas agricultoras sobre o trabalho. O passo inicial da pesquisa se deu a partir de uma ligação já existente com o Assentamento Conquista da Liberdade, Piratini RS. Um fator importante para escolha deste Assentamento como universo da pesquisa foi à presença de dois modelos de organização do trabalho, (1) individual e (2) coletivo. No modelo individual as terras são utilizadas individualmente por cada família através do modelo de produção agrícola de agricultura familiar, já no segundo grupo as famílias utilizam um sistema de produção coletiva da terra a partir de uma cooperativa. Como o objetivo de obtenção de conhecimentos detalhados, foi realizado um estudo de caso, em que se buscou recuperar as experiências das mulheres e analisar a percepção delas sobre o trabalho através da observação e do relato oral de oito agricultoras. Neste sentido, foi possível conhecer a dura realidade que estas mulheres estão inseridas, tendo seu trabalho inferiorizado ao mesmo tempo em que homens ocupam os espaços de poder e decisão. O assentamento estudado é um espaço de múltiplas relações sociais, em que a vida em comunidade é construída a partir de vários aspectos, seja através da interação que o trabalho provoca entre as famílias e até mesmo a partir de elementos como a religiosidade e festas em comunidade, sendo que todos estes espaços são arquitetados a partir de uma profunda divisão nos papéis sociais de gênero. O processo de luta pela terra possuiu um papel educativo para as famílias, sobretudo para as mulheres, no que se refere ao reconhecimento de seu papel na agricultura familiar, porém é oportuno destacar que estas mulheres ainda não reconhecem como trabalho todas as atividades que desempenham principalmente aquelas realizadas na esfera doméstica e percebem ser ajudantes de seus esposos em outras atividades. Desta forma, a representação do homem como chefe da família é constantemente construída e evidenciada. Foi possível perceber que os dois modelos de organização do trabalho contribuem para sustentar desigualdades entre os homens e as mulheres, que se apresentam a partir de uma naturalização da divisão do trabalho. Esta divisão do trabalho impossibilita a participação feminina nos espaços de liderança, estabelecendo aos homens o poder das decisões, além de produzir sobrecarga e a desvalorização do trabalho da mulher. Vale destacar que os espaços de debate, reflexão e formação no assentamento, atualmente, são raros, visto que no passado era uma prática bastante estimulada pelo movimento e incorporada pelos assentados e pelas assentadas. Por fim, cabe destacar que as mulheres nos mostraram como vivenciam relações de trabalho desiguais, criando sonhos de relações de gênero igualitárias. Em linhas gerais, elas descortinaram desigualdades ao mesmo tempo em que evidenciaram: temer jamais!