“Porque não é o escrever em si, é ver como é que está escrito”: discursos sobre letramentos acadêmicos em inglês em uma comunidade de prática de química
Resumo
Embora tenha uma longa história de produção de conhecimento na área de Letramentos Acadêmicos
(LA) no Brasil, Ferreira e Stella (2018, p. 17) apontam que a produção de pesquisas em universidades
brasileiras sobre o ensino e aprendizagem de escrita para fins acadêmicos ainda é uma ação
negligenciada. Considerando o aumento na cobrança para publicações e internacionalização e a
necessidade de fundamentar práticas pedagógicas para a produção textual em resultados de pesquisa
em cada um dos diferentes contextos disciplinares (MOTTA-ROTH, 2013, p. 12), este estudo visa
explorar as práticas de letramento acadêmico (LA) em inglês e sua aprendizagem em um programa de
pós-graduação bem-conceituado que apresenta alta produtividade de publicação internacional em inglês,
o Programa de Pós-graduação em Química da UFSM (PPGQ). Para esse objetivo, propomos as
seguintes perguntas de pesquisa: 1) Quais práticas de LA em inglês são mais valorizadas pelos
professores, tanto para sua própria produção como para a produção de seus estudantes, e por quê? 2)
Como os professores desenvolveram seus LA em inglês e quais aspectos apresentam maior grau de
dificuldade para eles? 3) Quais dinâmicas de coautoria e/ou abordagens pedagógicas utilizam para o
desenvolvimento dos LA de seus estudantes e em quais aspectos de escrita os estudantes apresentam
maior grau de dificuldade? O quadro teórico adotado é interdisciplinar ao combinar a Sociorretórica
(BAZERMAN, 2007; BAWARSHI; REIFF, 2013), os LA (LEA; STREET 1998, IVANIC 1998) e a Análise
Crítica do Discurso (ACD) (FAIRCLOUGH, 2003). Também são tomadas como referências os conceitos
de Comunidades de Prática (CdP) e Participação Periférica Legítima (PPL) (LAVE; WENGER, 1991;
WENGER, 1998). Usando dados gerados num questionário semiestruturado e entrevistas qualitativas,
analisamos criticamente os discursos dos professores, explorando se a aprendizagem de habilidades,
competências e condições discursivas envolvidas nos LA em inglês é mediada pela PPL em uma
comunidade estruturada para dar acesso crescente a novos membros e formá-los para participar de
forma plena na comunidade. Argumentamos que a CdP estudada demonstra graus variáveis de PPL dos
estudantes. Professores que relatam um maior grau de PPL junto a uma rede colaborativa para escrita e
revisão entre seus alunos também relatam menos dificuldades no desenvolvimento dos LA de seus
alunos. Por outro lado, mesmo quando exista maior grau de PPL, constatamos a necessidade de
abordagens pedagógicas capazes de subsidiar a PPL existente. O discurso dos professores revela uma
tensão dialética em que, por um lado, a escrita científica é caracterizada como fácil e, por outro lado, a
escrita de artigos é retratada como difícil e os professores reportam que seus alunos apresentam muitas
dificuldades. Argumentamos que essa tensão está ligada, na maior parte dos relatos, a uma abordagem
pedagógica alinhada com a noção de os LA serem habilidades cognitivas adquiridas por meio de
conhecimento tácito e não pelo ensino explícito dentro de uma perspectiva de LA como práticas sociais.
Nesse sentido, recomendamos a criação de redes colaborativas na CdP e a introdução de uma
abordagem pedagógica transformativa e colaborativa que permita que o aluno se identifique como autor
dentro da comunidade, compreendendo os LA como ações sociais e desenvolvendo um olhar crítico em
relação aos textos e sistemas de gênero que os constituem.
Coleções
Os arquivos de licença a seguir estão associados a este item: