Poder, soberania e big techs: tensões entre o público e o privado no Projeto de Lei nº 2.630/2020 (PL das fake news)
Resumo
O Estado, enquanto concepção clássica, é entidade política soberana que detém o monopólio
do poder coercitivo em um determinado território. Para assim qualificar-se, consolida o Direito,
retratado enquanto ordem coercitiva e instrumento de manutenção da ordem pública. De outra
banda, o fenômeno global de aceleração de integração econômico-social, intensificado pela
revolução informática, fez emergir novos atores na governança global, para além dos típicos de
Estado, que subvertem a própria noção de soberania dos Estados-Nação, quando acumulam
poder econômico, social e político capaz de moldar a prática institucional e os processos de
tomada de decisão, a reivindicar espaços de autonomia e intervenção cada vez maiores. Bem
assim, o contexto tecnológico hoje experienciado atravessa a incoação de plataformas
monopolistas, que, ao dirigir a arquitetura digital e ao dispor da coleta, armazenamento e
manipulação de dados, exercem intenso poder de controle sobre o corpo social, capitaneando a
própria arena pública e os direitos de liberdade e personalidade dos usuários dos ambientes
virtuais que hospedam, manifestando uma potencialidade de normatização tanto quanto a lei.
Inserido nesse contexto, recentes conflitos políticos e comunicacionais, acirrados pelas disputas
eleitorais, põem em corrente discussão a utilização das plataformas online para fins hiper
partidários a partir da propagação de factóides, cujo debate foi elevado ao âmbito parlamentar
pelo Projeto de Lei nº 2.630/2020, designado comumente como PL das Fake News. Contra a
redação conferida à proposta parlamentar, contudo, que aumenta o ônus das plataformas, as Big
Techs empreenderam ampla campanha de oposição, utilizando-se, para tanto, do poder de
império que dispõem sobre o ciberespaço, mediante o impulsionamento de editoriais - sem a
devida inserção de tarjas de conteúdo político - e redução de alcance de materiais favoráveis ao
texto, na tentativa de promover a manutenção de privilégios através da manipulação da
percepção pública. Diante disso, indaga-se: em que medida as Big Techs impactam e se
sobrepõem ao monopólio normativo do Estado brasileiro, especialmente no episódio em
destaque da campanha contrária ao Projeto de Lei nº 2.630/2020? A presente pesquisa busca, a
partir de tal questionamento, empreender análise quanto ao tensionamento havido entre
empresas de tecnologia e a soberania do Estado brasileiro no episódio da campanha digital
impulsionada pelas plataformas digitais contra o Projeto de Lei nº 2.630/2020, a atravessar
discussão quanto à relativização da autoridade do Estado face à ascensão do poderio das Big
Techs. O trabalho, em primeiro momento, explora a fragmentação da autoridade estatal diante
da ascensão das Big Techs, enquanto em segundo plano, analisa as respostas do direito brasileiro
aos conflitos digitais, incluindo o projeto de lei das Fake News. Utilizar-se-á, para tanto, o
método de abordagem dedutivo e os métodos de procedimento histórico, funcionalista e
monográfico, para o fim de estabelecer uma linha cronológica, esquadrinhar o modelo de
negócios operacionalizado pelas Big Techs e analisar o projeto legislativo. Vislumbra-se, de
antemão, a eclosão de novos centros de poder autônomo, manifestados em contextos nacionais
e internacionais, a perturbar o papel proeminente do Estado na formulação e aplicação do
Direito, resultando em uma disputa pelo monopólio normativo.
Coleções
- TCC Direito [401]
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